13 Outubro 2014
O inglês Nicholas Bloom é um dos principais nomes do estudo da incerteza e de seus efeitos sobre a economia. Professor da Universidade de Stanford, Bloom, de 41 anos, lançou um índice de incerteza sobre política econômica em estudo publicado em 2011, escrito em parceria com Scott Baker, também de Stanford, e Steven Davis, da Universidade de Chicago. Voltado para o caso americano, o trabalho destaca o impacto negativo da questão sobre o investimento, a produção e o emprego, mostrando o salto da incerteza ocorrido a partir da chamada Grande Recessão, que durou do fim de 2007 a meados de 2009.
A reportagem é de Sergio Lamucci, publicada pelo jornal Valor, 10-10-2014.
De lá para cá, o assunto ganhou terreno, despertando cada vez mais interesse de economistas e investidores. Bloom e seus parceiros já elaboraram indicadores de incerteza para Reino Unido, França, Alemanha, Espanha, Itália, China, Índia, Canadá e Rússia. No momento, trabalham nos índices para o Japão, a Coreia do Sul e também para o Brasil. Segundo ele, um indicador brasileiro deve ser lançado nos próximos 6 a 12 meses, a pedido do Fundo Monetário Internacional (FMI). Agências de notícias em tempo real já trazem o indicador em seus terminais e os bancos Goldman Sachs, Citibank, Deutsche Bank e Wells Fargo trataram da iniciativa dos economistas em seus relatórios.
"A incerteza parece ter desempenhado um papel de destaque na Grande Recessão, e muitas pessoas dizem que os efeitos da incerteza de eventos como a guerra na Ucrânia e o referendo sobre a independência da Escócia são prejudiciais do ponto de vista econômico. O interesse dos mercados, empresários e governos sempre existiu, mas apenas recentemente os economistas passaram a prestar tanta atenção ao assunto", disse Bloom ao Valor. Ele é um dos 25 economistas com menos de 45 anos citados pela revista "Finance & Development" (F & D), do FMI, como aqueles que "estão moldando a forma como pensamos sobre a economia global".
O nome mais conhecido da lista é o francês Thomas Piketty, 43 anos, autor do best-seller sobre desigualdade "Capital no Século XXI", que dominou as discussões econômicas durante boa parte do primeiro semestre, quando a tradução do livro foi publicada nos Estados Unidos. O francês Emmanuel Saez, da Universidade da Califórnia, em Berkeley, colaborador frequente de Piketty em seus estudos sobre a desigualdade, também aparece na lista.
Bloom diz que começou a se interessar pelo estudo da incerteza na metade dos anos 2000. Sua ideia de desenvolver um indicador para medi-la ganhou impulso a partir da constatação, compartilhada por vários analistas, de que indefinições sobre política fiscal, política monetária e regulação tiveram papel importante para a lentidão da retomada depois da recessão ocorrida entre 2007 e 2009.
Universidades americanas concentram a maioria dos nomes que constituem a lista, ainda aberta a novas indicações
No estudo apresentado em 2011, Bloom, Baker e Davis lançaram o índice de incerteza sobre política econômica, uma combinação de três componentes. O primeiro quantifica a cobertura de dez jornais sobre assuntos relacionados à incerteza referente à política econômica, enquanto o segunda inclui o número de impostos que devem expirar nos próximos anos. O terceira reflete a magnitude da discrepância nas previsões dos analistas sobre o índice de preços ao consumidor e os gastos públicos.
O componente mais importante é o primeiro, segundo Bloom. O modelo identifica artigos contendo palavras como "incerteza" ou "incerto", "econômico" ou "economia" e um ou mais dos seguintes termos: "Congresso", déficit", "Federal Reserve" (o banco central americano), "legislação", "regulação" ou "Casa Branca". Hoje, são publicadas duas séries do índice, uma com as três dimensões e outra exclusivamente baseada nas notícias de jornais. Os indicadores para os outros países, incluindo o que será elaborado para o Brasil, têm apenas esse componente.
O índice para os Estados Unidos aumenta com força perto de eleições presidenciais apertadas, das guerras do Golfo, do ataque de 11 de setembro de 2001, da quebra do Lehman Brothers, em 2008, e durante o debate sobre o teto da dívida de 2011. Uma alta no indicador equivalente à registrada entre 2006 e 2011 está associada a um declínio da produção de 2,5% e de 2,3 milhões de empregos, atingindo o máximo em 18 meses. "Esses resultados não são necessariamente causais (...), mas sugerem que a magnitude dos efeitos deletérios da incerteza sobre políticas é potencialmente grande", observam os autores em seu estudo.
Ao explicar por que havia poucas pesquisas sobre o assunto até há pouco tempo, Bloom diz que medir a incerteza é muito difícil. Não existem medidas naturais, por exemplo. "E modelar a incerteza também é difícil, porque ela está na mente dos agentes econômicos", o que torna o conceito complexo demais para aquele fim. No momento, Bloom trabalha com o Fed de Atlanta para desenvolver um índice de incerteza de negócios baseado em perguntas feitas a empresas.
No fim de setembro, Bloom ganhou o prêmio do Banco de Investimento Europeu (EIB, na sigla em inglês), ao lado de John Van Reenen, da London School of Economics and Political Science. A premiação se deveu às pesquisas de Bloom em outra área de sua especialidade - inovação gerencial e tecnológica. Segundo o EIB, é o reconhecimento das pesquisas pioneiras dos dois economistas sobre "os efeitos no desempenho econômico e desigualdade, assim como o seu impacto sobre políticas públicas".
Outro nome da lista é o argentino Iván Werning, do Massachusetts Institute of Technology (MIT), Ph.D. por Chicago. Ele estuda política monetária e política macroprudencial. Também trabalha na área de tributação. Um dos estudos de Werning, 41 anos, teve papel importante na transformação do antes "falcão" Narayana Kocherlakota, presidente do Fed de Minneapolis, em um dos mais eloquentes defensores de uma política monetária ultraexpansionista nos Estados Unidos.
Em discurso de 2012, Kocherlakota citou o trabalho de Werning "Administrando Uma Armadilha de Liquidez: Política Monetária e Fiscal", afirmando que ele era "realmente importante". No estudo, Werning escreve que o "único propósito" de manter os juros próximos de zero "é estimular um boom de consumo depois da armadilha de liquidez". A promessa de segurar as taxas no chão pode incentivar gastos, sem, ao mesmo tempo, provocar inflação.
Werning diz que, em geral, os dois objetivos estão relacionados. "De fato, uma política ótima procura os dois resultados, ao prometer uma política monetária mais expansionista. No entanto, o compromisso específico de manter os juros em zero está mais proximamente relacionado ao objetivo de estimular uma atividade econômica futura mais forte do que em promover inflação futura mais alta."
E como vê a ideia de que seu estudo ajudou a influenciar a mudança de visão de Kocherlakota? "Seria interessante que minha pesquisa tivesse esse impacto, mas não posso responder por ele. Eu o conheço como um acadêmico e não estou surpreso ao ouvir que, como uma autoridade, se mantém informado dos últimos dados e trabalhos acadêmicos", responde Werning, classificado como um "economista brilhante" por Kocherlakota.
Outro trabalho interessante de Werning é o estudo "Dilema ou Trilema: Controles de Capitais e Taxas de Câmbio com Fluxos Voláteis de Capitais", escrito com o francês Emmanuel Farhi, da Universidade de Harvard, outro nome da lista do FMI. Segundo Werning, o caso brasileiro, que envolve um regime de câmbio flutuante e a adoção de controle de capitais há alguns anos, motivou o trabalho.
No estudo, Werning e Farhi concluem que "controles de capitais e uma taxa de câmbio flutuante são instrumentos importantes para responder a paradas súbitas" - sendo o câmbio flexível "talvez o mais importante dos dois".
"Mostramos que o uso de controles de capitais pode ser ótimo mesmo quando se permite que a taxa de câmbio se ajuste otimamente", diz Werning. "Isso é feito para mitigar ou evitar uma apreciação. Daí a referência a um dilema."
A avaliação sobre controle de capitais mudou muito, recentemente - há alguns anos, a prática era bastante criticada por economistas e pelo FMI. O que mudou de lá para cá? "A sabedoria sobre política econômica é um processo cumulativo, que recorre tanto à experiência quanto às teorias. Desde os anos 1990, Guillermo Calvo (da Universidade Columbia) e vários outros economistas acionaram o alarme em relação aos efeitos prejudiciais dos fluxos de capitais voláteis, baseados na experiência da Ásia e da América Latina e recentemente na Europa", afirma Werning.
"Há agora um entendimento melhor de que as economias precisam se ajustar a esses choques e à turbulência financeira de modo mais geral. Houve muita pesquisa empírica e teórica sobre essas questões. Agora sabemos que controles de capitais, embora não sejam perfeitos, podem oferecer alguns benefícios em direção à estabilização macroeconômica e financeira."
Werning observa que não se chegou a uma resposta final e definitiva sobre o assunto. Não há ainda um consenso. "Enquanto isso, acho que é muito saudável que o FMI e outros tenham uma mente mais aberta sobre a questão."
Em sua opinião, o câmbio flutuante é a melhor opção. "Comprometer-se com a fixação da taxa de câmbio, especialmente por longos períodos e independentemente das circunstâncias, tem se mostrado uma ideia muito ruim. Amarrar as próprias mãos pode ser útil temporariamente, em circunstâncias especiais, quando você é o próprio inimigo. Mas isso se torna suicida se é necessário se defender de outras forças", adverte. Segundo ele, a macroeconomia exige ferramentas mais flexíveis, e não menos.
Werning diz que tem pesquisado dois tópicos. No lado macroeconômico, trabalha com "políticas macroprudenciais de modo mais amplo, além de controle de capitais, como a regulação financeira". Além disso, estuda assuntos tributários, especialmente políticas que têm como objetivo reduzir a desigualdade, como propostas para taxação progressiva sobre a riqueza e sobre herança.
A lista tem outros grandes nomes de destaque, como o indiano Raj Chetty, da Universidade de Harvard. Chetty ganhou a Medalha John Bates Clark em 2013, premiação para economistas abaixo de 40 anos que costuma ser um bom termômetro de futuros ganhadores do Nobel de Economia. Ele é um dos responsáveis pelo Projeto de Igualdade de Oportunidades - Saez também faz parte do grupo -, que investiga a questão da geografia da mobilidade entre gerações.
A mais nova da lista é Melissa Dell. Americana de 31 anos, a economista de Harvard analisa a pobreza e a insegurança por meio das relações entre atores estatais e não estatais e o desenvolvimento econômico. Também estuda os meios pelos quais reformas, como o endurecimento dos governos na questão da violência relacionada às drogas, podem influenciar os resultados econômicos.
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