25 Setembro 2014
“Há momentos nos quais penso: existe um Deus?” Se a fazer estas afirmações diante do olho indiscreto das telecâmeras da BBC é o arcebispo de Canterbury, isto é, o chefe da Igreja anglicana, o clamor é assegurado. O arcebispo Justin Welby “confessou” de fato diante dos fiéis de talvez ser acometido de “dúvidas” sobre a existência de Deus.
O primaz anglicano estava na catedral de Bristol e, respondendo à pergunta de um dos presentes, a propósito das dúvidas de fé, recordou que a dúvida está presente nas próprias Escrituras: “Eu amo os Salmos e existe o salmo 88 que está cheio de dúvidas”. Depois Welby admitiu: “Outro dia estava rezando enquanto corria e acabei por dizer a Deus: “Olha, tudo isto vai muito bem, mas não seria agora que Tu fizesses algo, se existes”... Uma coisa que o arcebispo de Canterbury provavelmente não deveria dizer”, acrescentou logo depois.
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada pelo jornal La Stampa, 19-09-2014. A tradução é de Benno Dischinger.
O primaz da Igreja da Inglaterra explicou, pois, que a dúvida é uma experiência aceitável para um cristão: “A coisa extraordinária de ser cristãos é que Deus é fiel também quando nós não o somos”. Também se à primeira vista poderia parecer curioso e talvez bizarro que, a fazer esta admissão, seja um pastor e o responsável de uma Igreja, é preciso não esquecer que precisamente a experiência da dúvida, da escuridão, da noite espiritual, se encontra com frequência na vida de grandes místicos e de santos hoje canonizados e venerados.
Os teólogos também recordam a este propósito o grito de Jesus sobre a cruz, pouco antes de morrer: “Deus meu, Deus meu, porque me abandonaste?” São as palavras de um salmo, um apelo – comentava a propósito Bento XVI – dirigido a um Deus “que parece longínquo, que não responde e parece tê-lo abandonado. Uma escuridão espiritual que durou muitos anos foi aquela vivenciada pela Madre Teresa de Calcutá, a apóstola dos mais pobres entre os pobres, beatificada pelo Papa Wojtyla. Numa carta ao seu confessor, de publicação póstuma, escrevia: “Na minha alma experimento precisamente aquele terrível sofrimento da ausência de Deus, que Deus não me queira, que Deus não seja Deus, que Deus não exista verdadeiramente”. Também o santo do Gargano, quanto era circundado pelas multidões de fiéis, escrevia cartas nas quais confessava não “sentir” mais Deus. É aquela que São João da Cruz chamava “noite escura da alma”. A afirmação de Welby é muito menos dramática. Em todo caso, o primaz anglicano pode muito bem dizer que está em boa companhia.
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As dúvidas sobre Deus do arcebispo de Canterbury - Instituto Humanitas Unisinos - IHU