Por: Caroline | 25 Setembro 2014
“Se os senhores Bush e Blair não tivessem embarcado na aventura iraquiana, alguém pensaria que os Estados Unidos estariam ajudando Assad a destruir seus inimigos hoje?” é o que questiona Robert Fisk, jornalista, em artigo publicado por Página/12, 24-09-2014. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
No momento em que os Estados Unidos ampliaram a sua guerra contra o Estado Islâmico (EI) na Síria, o presidente Bashar al Assad ganhou um apoio militar e político maior do que qualquer outro líder árabe poderia se vangloriar. Com as bombas e mísseis que explodem no leste e norte da Síria, Assad agora pode contar com os Estados Unidos; Rússia; China; Irã; a milícia do Hezbollah; a Jordânia e uma séria de países ricos do Golfo; para manter vivo seu regime. Se alguma vez o velho provérbio árabe – “o inimigo de meu inimigo é meu amigo” – conteve alguma sabedoria, Assad comprovou que estava correto.
Em sua casa em Damasco, o líder sírio pôde refletir sobre o fato de que a nação mais poderosa da Terra – que no ano passado quis bombardear seu país até o esquecimento – está agora atacando aos seus inimigos mais ferozes. Sunitas sauditas, cujas doações de “caridade” financiaram o “Estado islâmico” também sunita, agora veem que seu governo supostamente ajuda aos Estados Unidos a destruí-lo. Assim como o Irã xiita e seus protegidos do Hezbollah combatem aos algozes sunitas e cortadores de pescoços em sua região, bombas e misses estadunidenses caem para destruir os inimigos frente a eles.
Desde que Churchill se aliou com Stalin em 1941, um antigo amigo da Alemanha nazista, nenhum presidente pôde ter encontrado um antagonista tão terrível transformado rapidamente em um irmão de armas. Porém – e esse é um grande “porém” – o regime sírio baasista não é tão estúpido a ponto de levar a palavra “amigo” a sério. Tão pouco nós devemos fazê-lo. Obama é a última pessoa com a qual Assad queria se associar – como não quer se lembrar de Vladimir Putin – e o regime sírio irá observar com a mais profunda preocupação o quanto o uso promíscuo da força aérea dos Estados Unidos se estende inexoravelmente e inclui mais e mais objetivos fora de seu objeto declarado.
A margem das baixas civis na província de Idlib, os alvos dos Estados Unidos sobre a Al Qaida vinculada a Jabhat al Nusra, sugerem que o Pentágono tenha, ainda mais, o EI na mira. Por exemplo, quão pronto se está antes de que um míssil exploda em um depósito de armadas do regime sírio – por “erro”, obviamente - ou em outras instalações do governo? Como os Estados Unidos decidiu financiar e treinar a "oposição moderada" para lutar contra o EI e o regime sírio, por que não bombardearia ambos os inimigos? E como os sírios, que apoiam o que resta desses “moderados”, reagiriam às bombas estadunidenses em Idlib, que mataram aos seus companheiros civis no lugar de forças de Assad – bombas que, de fato, parecem ter sido tão letais como as munições lançadas sobre eles por aviões de Assad –?
Em relação aos árabes do Golfo, não há, até agora, evidencias de que fisicamente tenham bombardeado qualquer alvo na Síria. Apenas a Jordânia afirmou ter atacado o EI; o restante dos aliados do rei Abdullah na árabe “coalizão dos dispostos” – que logo esqueceu-se de que esta era a expressão de George W. Bush para aquelas nações que apoiaram a invasão do Iraque em 2003 - parece ter limitado sua cooperação a proporcionar pistas de aterrissagem, a dar combustíveis aos aviões e a talvez patrulhar as tranquilas águas do Golfo. Em suas audiências no Capitolio na semana passada, os congressistas o assediaram com perguntas ao secretário de Estado John Kerry sobre quantos aviões árabes estariam bombardeando o EI.
Os árabes do Golfo, ao final, estiveram aqui antes. Recordam claramente as afirmações exageradas do êxito militar aéreo – de bombas inteligentes que não assassinam civis, dos mísseis de cruzeiro que destruíram refúgios e dos campos de treinamento e dos “centros de comando e controle” em 1991 e 2003 –. Tudo resultou em um arriscado menu de guerra. Todavia, agora os estadunidenses estão requentando esses antigos sanduiches para o conflito do EI.
Estavam estes islamitas “guerreiros” realmente sentados – bebendo chá, talvez – em “campos de treinamento” para que os estadunidenses pudessem mata-los? O EI vangloria-se por ter um “centro de comando e controle” – um bunker de computadores e cintilantes indicadores de objetivos – em lugar de um punhado de telefones móveis? Contudo, disseram que havia sido destruído, nada menos que um “centro de controle e comando”. E, como tantas vezes em meio à emoção de uma nova escalada do conflito, os “especialistas” e os decréptos ex-embaixadores em nossas telas devem folhear um dos livros de história antes de explicar “nossas” ações. O “Estado islâmico” foi criado a partir da Al Qaida no Iraque, que absorveu a resistência anti-estadunidense para a ocupação. Se os senhores Bush e Blair não tivessem embarcado na aventura iraquiana, alguém pensaria que os Estados Unidos estariam ajudando a Assad a destruir seus inimigos hoje?
“Ironia” não está à altura das palavras do “enviado de paz” no Oriente Médio, que se transformou esta semana em um enviado de guerra oferecendo a perspectiva de mais tropas ocidentais no mundo mulçumano. Supõe-se assim que o regime sírio deve rir ou chorar?
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O inimigo do meu inimigo é meu amigo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU