18 Agosto 2014
Em Seul, Francisco beatifica 124 coreanos que, há dois séculos, foram mortos por causa da sua fé. Empenharam-se para ajudar os pobres e "o seu exemplo tem muito a dizer a nós, que vivemos em uma sociedade onde, ao lado de imensas riquezas, cresce de modo silencioso a mais abjeta pobreza".
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no sítio Vatican Insider, 16-08-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Os leigos foram os primeiros apóstolos da Coreia!" Há um calor sufocante, enquanto centenas de milhares de fiéis (800 mil, segundo a estimativa do padre Lombardi, um milhão segundo os organizadores), ouvem em absoluto silêncio as palavras de Francisco, que, na grande praça da Porta de Gwanghwamun, em Seul, acaba de beatificar 124 mártires coreanos. A ocasião para que o papa, no seu terceiro dia de viagem na Coreia, reiterasse a importância dos leigos na missão da Igreja.
Na longa espera do papa, os fiéis rezaram o terço e cantaram. Francisco circulou por toda a praça para cumprimentar o máximo de pessoas possível e, ao longo do percurso, parou na frente de um grupo de parentes das vítimas do naufrágio da balsa Sewol e falou com um dos sobreviventes.
A missa, celebrada com os paramentos vermelhos, cor que simboliza o martírio, começou com o rito da beatificação. Paul Yun Ji-Chung e os 123 companheiros mártires são a primeira geração de católicos coreanos. Paul foi martirizado com o seu primo por violar os rituais confucianos, organizando funerais católicos pela sua mãe.
No grupo de companheiros, todos leigos, há apenas um sacerdote, James Ju Mun-mo, chinês, o primeiro padre a entrar na Coreia, o primeiro a celebrar a missa nessa terra. Ele era conhecido pelo seu compromisso missionário e, depois de seis anos desde a sua chegada, os católicos eram 10 mil. Depois da sua decapitação, a sua cabeça foi exposta ao escárnio público. Um grande e prolongado aplauso saudou a projeção da imagem do 124 novos bem-aventurados nos dois telões ao lado do altar.
"Cristo é vitorioso, e a sua vitória é nossa. Hoje, celebramos essa vitória em Paul Yun Ji-Chung e nos seus 123 companheiros", disse Francisco na homilia. "Todos viveram e morreram por Cristo e agora reinam com Ele na alegria e nas glórias (...) na morte e na ressurreição do seu Filho, Deus nos deu a maior vitória de todas."
Bergoglio destacou a importância da sua vocação leiga em virtude do batismo. "Na misteriosa providência de Deus, a fé cristã não chegou às costas da Coreia através dos missionários; entrou nela através dos corações e das mentes do próprio povo coreano. Ela foi estimulada pela curiosidade intelectual, pela busca da verdade religiosa. Através de um encontro inicial com o Evangelho, os primeiros cristãos abriram as suas mentes para Jesus. Queriam conhecer mais sobre esse Cristo que sofreu, morreu e ressuscitou dos mortos...".
"Os leigos foram os primeiros apóstolos da Coreia", disse o papa, acrescentando algumas palavras ao texto preparado. "Essa história nos diz muito sobre a importância, a dignidade e a beleza da vocação dos leigos". Francisco lembrou aos padres e aos consagrados que Jesus não pede para "nos tirar do mundo", mas os envia para que sejam "fermento de santidade e de verdade. Os mártires nos indicam o caminho."
Depois, o papa disse que os novos bem-aventurados "sabiam o preço de serem discípulos, estavam dispostos a grandes sacrifícios e a se deixar despojar daquilo que os pudesse afastar de Cristo: os bens da terra, o prestígio, a honra, porque sabiam que só Cristo era o seu verdadeiro tesouro...".
Hoje, "muitas vezes – acrescentou – experimentamos que a nossa fé é posta à prova pelo mundo, e de muitíssimos modos nos é pedido para abrirmos mão de compromissos com a fé, para diluir as exigências radicais do Evangelho e a nos conformar com o espírito do tempo. No entanto, os mártires nos lembram para colocar Cristo acima de tudo e par a ver todo o resto neste mundo em relação a Ele e ao seu reino eterno. Eles nos provocam a nos perguntarmos se há algo pelo qual estaríamos dispostos a morrer".
Por fim, o Papa Bergoglio voltou a destacar o compromisso com os pobres. "O exemplo dos mártires nos ensina a importância da caridade na vida de fé. Foi a pureza do seu testemunho a Cristo, manifestada na aceitação da igual dignidade de todos os batizados, que os levou a uma forma de vida fraterna que desafiava as rígidas estruturas sociais do seu tempo."
Eles, explicou, se recusaram a dividir "o duplo mandamento do amor a Deus e do amor ao próximo", mostrando "grande solicitude pelas necessidades dos irmãos". "O seu exemplo – concluiu Francisco – tem muito a dizer para nós, que vivemos em sociedades onde, ao lado de imensas riquezas, cresce de modo silencioso a mais abjeta pobreza; onde raramente é ouvido o grito dos pobres e onde Cristo continua a chamar, nos pede para amá-lo e servi-lo, estendendo a mão aos nossos irmãos e irmãs necessitados."
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Um milhão para o papa. Os mártires leigos, ''primeiros apóstolos da Coreia'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU