30 Mai 2014
Cândido como uma pomba, sem ser ingênuo; sincero, mas também "esperto" – como ele mesmo quis enfatizar na entrevista à revista La Civiltà Cattolica –, o Papa Francisco concluiu a viagem à Terra Santa demonstrando no encontro com os jornalistas, durante o voo de volta, um total domínio do microfone. Respondeu a tudo, jogando "títulos" para as agências e para os jornais. Não é um showman como João Paulo II. A sua estratégia – absolutamente vencedora – é a fala calma do pároco que olha nos olhos do interlocutor.
A reportagem é de Marco Politi, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 28-05-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Além disso, durante a viagem, ele demonstrou agilidade ao captar o momento certo para fazer gestos sugestivos. Não é improvisação, é a lúcida capacidade de conjugar o humano, o religioso e o político. Permanecem como ícone da sua peregrinação entre a Palestina e Israel as mãos beijadas dos sobreviventes do Holocausto e a oração de improviso diante do muro israelense, que o papa transformou no "muro das lamentações" do século XXI. Porque não é só a barreira de defesa contra o terrorismo, mas também cunha que entra na terra da Palestina ocupando campos, destruindo olivais, despedaçando vias de comunicação.
Francisco volta da viagem com um papel maior no cenário internacional e ainda mais forte no plano da Cúria, já que a escuta reservada ao pontífice não parece diminuir. Forte e livre, o papa não se esquivou das perguntas mais incômodas. Assim, foi-lhe perguntado sobre as operações do IOR de Bertone. É oficial. Palavra do papa. "Aquele negócio de 15 milhões – responde o pontífice à pergunta de um repórter – é uma coisa que está sob estudo. Isso não está claro... está sob estudo".
Pouco antes, referindo-se ao contraste entre a Igreja pobre por ele desejada e exemplos de pouca austeridade, Francisco dissera: "Como está dito no Evangelho. 'É inevitável que haja escândalos!' Somos humanos, pecadores, todos... Devemos estar atentos para reformar a Igreja todos os dias, porque somos pecadores". O novo Ministério das Finanças vaticano, a chamada Secretaria da Economia, "vai ajudar muito a evitar os escândalos e os problemas".
Gerou surpresa a sua resposta sobre a eventualidade de renunciar um dia. Tínhamos prenunciado isso. Os leitores do Il Fatto Quotidiano sabem que existe uma ampulheta no pontificado de Bergoglio. Ele mesmo agora confirma isso publicamente. "Farei o que o Senhor me disser para fazer. Rezar, buscar a vontade de Deus. Mas eu acredito que Bento XVI não é um caso único... Ele abriu uma porta, a porta dos papas eméritos. Haverá outros ou não? Só Deus sabe. Mas essa porta está aberta. Eu acredito que, se um bispo de Roma, um papa que sente que suas forças somem – porque agora se vive tanto tempo – deve se fazer as mesmas perguntas que o Papa Bento se fez". Ser papa emérito, explicou, já é uma "instituição", assim como os bispos aposentados.
Também chamou a atenção a resposta seca do Papa Bergoglio sobre a luta contra os abusos sexuais do clero. "Tolerância zero." Se um sacerdote abusa de um menino ou de uma menina, comete um "crime tão feio... é gravíssimo... como fazer uma missa negra". Em junho, o papa irá hospedar receber em Santa Marta oito menores abusados, de vários países, celebrará a missa para eles e, depois, irá ouvi-los em uma reunião especial.
Surpreendentemente, Francisco revelou que há três bispos sob investigação do Vaticano. "Um já está condenado, e se está considerando a pena a ser imposta." (Deve se tratar de Dom Jozef Wesolowski, núncio em Santo Domingo, chamado de volta no ano passado por ter sido acusado de abusos com provas circunstanciais).
Também não faltou uma abertura cautelosa sobre o tema dos sacerdotes casados. Já existem padres casados na Igreja Católica de rito grego e de rito copta, lembrou o papa. "O celibato não é um dogma de fé, é uma regra de vida que eu aprecio muito e acredito que seja um dom para a Igreja. Não sendo um dogma de fé, sempre há a porta aberta."
E a beatificação de Pio XII? Falta o milagre, foi a resposta. Pode-se dizer: os acasos da vida...
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Bergoglio desembainha a arma ''renúncia'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU