Por: Jonas | 13 Mai 2014
Tendo como motivação a celebração do 40º aniversário do assassinato do sacerdote Carlos Mugica, ontem, realizou-se uma grandiosa procissão até a capela Cristo Operário, em Retiro, com a participação de dirigentes sociais, políticos e organismos de direitos humanos. Nesse marco, a Equipe de Sacerdotes para as Vilas de Emergência de Buenos Aires divulgou uma declaração afirmando que o padre, assassinado no dia 11 de maio de 1974, foi “mártir da causa dos pobres e símbolo da luta pela justiça social”. Os padres aproveitaram a ocasião para apresentar uma série de prioridades que devem ser atendidas nas vilas, atualmente, para enfatizar que “o único rival a ser vencido é a exclusão social”.
Fonte: http://goo.gl/rTfMPj |
A reportagem é de Washington Uranga, publicada por Página/12, 12-05-2014. A tradução é do Cepat.
Do ato de recordação, também participou o cardeal Mario Poli, arcebispo de Buenos Aires. Acompanhado por alguns de seus bispos auxiliares, Poli disse que “o homicídio do padre Mugica foi um verdadeiro martírio” e ressaltou que foi um “verdadeiro mártir por causa dos pobres”. Para o arcebispo portenho, “assim revelam os quadrinhos, já que quando entramos nas casas, nas vilas, nos altarezinhos, ao lado da Virgem de Luján, de São José, de Santo Expedito, sempre há um quadrinho do Padre Mugica”, destacando que “é a melhor recordação, as que existem nas casas” porque “aí, sim, reza-se para ele, querem-no e é recordado com carinho”.
O documento dos padres vileiros é assinado por 24 sacerdotes, entre eles Guillermo Torre, Lorenzo De Vedia, Gustavo Carrana, Franco Punturo, Sebastián Sury, Pedro Andrés Tocalini. Todos eles trabalham nas vilas da capital. E contou, também, com a adesão de José María Di Paola, atualmente na Vila Carcova (San Martín).
Para os padres, “não tiraram a vida de Mugica”, porque “seu martírio, mais do que uma surpresa, foi consequência de um modo de viver: uma vida doada aos seus irmãos mais pobres”. Daí, a compreensão de que “o melhor caminho para entender o padre Carlos seja amar aos pobres, ter amizade com eles”. Eles também dizem que “o martírio do padre Carlos se tornou um símbolo para todos nós”, porque “junto à devoção crente que temos, soma-se a luz que sua figura lança em todos os que lutam e trabalham por um mundo mais justo e humano. Mugica surge quase espontaneamente como símbolo, aconteceu. Tornou-se um ícone da luta pela justiça social”.
Após notabilizar a “maior consciência” que existe na sociedade hoje, a respeito da realidade das vilas, os padres advertem, no entanto, que “ainda há grande desconhecimento e, consequentemente, alguns preconceitos permanecem”. Não obstante isso, reconhecem que, diferente do que ocorria nos tempos de Mugica, hoje não só há mais interesse pelo que se vive nas vilas, mas, sim, “começa a surgir maior presença territorial do Estado – tanto da Cidade como da Nação -, mesmo que esta presença seja ainda insuficiente e não totalmente articulada”. E como advertência se destaca que “sempre está latente a tentação de confundir esta presença do Estado (que é um direito de todos) com o acionar voluntário de uma ONG, ou de reduzi-la a um espaço partidarista”.
No texto, há uma forte crítica diretamente dirigida aos jornalistas e aos meios de comunicação. “Na atualidade, os meios de comunicação falam das vilas, mas muitas vezes à distância, com um tratamento das notícias que estigmatiza (...). Sem mais, associa-se as pessoas que sofrem a pobreza com o crime. Contudo, não deveríamos esquecer que os vizinhos e vizinhas das vilas possuem uma vivência mais profunda da insegurança”, dizem os padres. E acrescentam que a “insegurança também significa não saber em que local se irá viver, dentro de algumas semanas, ou quando se conseguirá um trabalho estável, ou onde conseguir o medicamento que se necessita e não se pode comprar, ou para qual escola os filhos irão, ou o medo de que os filhos adolescentes possam entrar na droga, porque é uma oferta muito fácil, ou a dependência de um refeitório comunitário para que as crianças comam, etc.”.
Há também uma palavra para introduzir o debate sobre a “urbanização das vilas”, destacando que o conceito de “integração urbana” supera o anterior porque propõe uma “cultura do encontro”, considerando que as vilas podem contribuir “muito ao todo da cidade”. Para isso, propõem, entre outras coisas, alguns exemplos como “a vivência de uma fé que gera história”, “o laço de solidariedade que assume situações de dor e de desejos de se viver melhor”, “a capacidade de festa, mesmo em meio às dificuldades” e “a laboriosidade e o trabalho”. Sustentam que para integrar é necessário “um diálogo entre a cultura urbana e a cultura popular que se dá na vila. Diálogo que por ser cultural é, por sua vez, político e social”.
Seguindo o exemplo de Mugica, os sacerdotes reúnem o pedido popular para que “ajudemos a cuidar da máxima riqueza (do povo) que são seus filhos”. É um chamado que “não se pode desconsiderar, sobretudo se tomamos consciência de que quase a metade dos habitantes das vilas são crianças e adolescentes, já que 43% têm menos de 17 anos”, dizem os padres. Para alcançar este propósito, garantem que é necessário levar em conta que “o único rival a ser vencido é a grave exclusão social que hipoteca o futuro das crianças e adolescentes das vilas, deixando-as reféns dos filhos das trevas”.
“Ouvindo diariamente os vizinhos e vizinhas das vilas”, os padres concebem algumas prioridades que passam pela moradia (“muitas famílias vivem em situação de emergência habitacional”), educação (“dar educação para todos”), saúde (que se invista nos hospitais e centros de saúde próximos a nossos bairros”) e trabalho (“não apenas se trata de garantir a comida, mas também é preciso dar trabalho”). Com um convite também ao “mundo empresarial”, que “deve aparecer com muito mais força, apostando nos vizinhos e vizinhas de nossos bairros”.
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Carlos Mugica, “um mártir da causa dos pobres” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU