Por: André | 06 Mai 2014
Confidencial e convivial, este encontro em torno de um bate-papo-debate informal com Pierre Levy reuniu, no dia 15 de fevereiro de 2014, aqueles que durante muito tempo acompanham o filósofo precursor da inteligência coletiva e do virtual, que ensinava nos anos 1990 no Departamento de Hipermídia da Universidade de Paris 8. Atualmente, o Canadá lhe ofereceu uma cadeira de pesquisa sobre a inteligência coletiva em Ottawa.
Fonte: http://bit.ly/1piPy3c |
A reportagem é de Janique Laudouar e publicada no blog francês La Ménagère, 19-02-2014. A tradução é de André Langer.
O tema: “Chegará em breve o dia em que uma civilização se conceberá a si mesma como um sujeito planetário”. Desde o advento do que se chamou nos anos 90 de “super-estradas da informação”, em seguida de “novas tecnologias” e hoje de “digital”, nós compartilhamos, coletamos, pesquisamos, criamos, produzimos, estamos imersos num fluxo cada vez mais denso de dados que se tornaram incontroláveis individualmente. Numa tentativa de identificar o sentido em escala mundial, Pierre Levy está trabalhando na criação, nos últimos 20 anos, de uma linguagem IEML (Information Econony Meta-language), um “sistema de código semântico eficaz, uma tecnologia simbólica”, uma “metalinguagem”, mas sobretudo um projeto de civilização, com a ambição de orientar o futuro da comunicação digital para uma humanidade melhor. “Hoje podemos saber imediatamente a nossa própria posição geográfica e acessar automaticamente a geolocalização de qualquer objeto, assim como a maneira de chegar até ele a pé ou por meio de qualquer transporte. Da mesma forma, nós poderemos no futuro nos situar no mundo das ideias, localizar qualquer pessoa, objeto ou conjunto de dados e explorar seus bairros semânticos”.
O algoritmo a serviço da inteligência coletiva
No momento em que 50% da população mundial está conectada, é menos o acesso à internet e as ferramentas digitais que são problemáticos, mas colocar a serviço da inteligência coletiva a infinidade de dados e sua exploração, o que sabem fazer, no momento, com uma qualidade inegável, as agências de países ou de publicitários, ou de grupos inovadores como o Google ou o Facebook. O que hoje muda, diz Pierre Levy, é o endereçamento e a manipulação dos dados através das web robôs e algoritmos. Ele dá o exemplo da campanha de Barack Obama que contratou 70 pessoas da área da informática para analisar o conjunto dos eleitores suscetíveis de mudar de opinião. Uma aproximação “big data marketing”, conhecida como marketing – ver, por exemplo, o sítio emarketing –, mas inovadora na política. Nesta campanha, os algoritmos ocuparam o primeiro plano...
Fonte: http://bit.ly/1piPy3c |
O que é um algoritmo? Todos nós fazemos a experiência com o correio eletrônico: as trocas, que imaginamos privadas, contêm palavras-chaves que são rastreadas pelos “robôs”. Se escrevermos que procuramos um jardim ou um hotel no Marrocos, corremos o risco de sermos bombardeados pelas ofertas comerciais on-line sobre os mesmos temas. O Google comemorou recentemente seus 15 anos com o anúncio de um novo algoritmo (Hummingbird ou Colibri) no lugar em que há 15 anos dois estudantes de Stanford inventaram o buscador, uma “garagem” de uma casa de subúrbio, segundo a tradição americana da “inovação de garagem”. “O Google faz mais de 500 modificações por ano no seu algoritmo, ou seja, em média 1,4 modificação por dia”, diz Fréderic Gaye em seu sítio Le Réferencement Naturel. Se ele se tornou “um gigante”, o Google deve isso à sua capacidade de se reconfigurar permanentemente. O Facebook também acaba de anunciar mudanças no algoritmo de postagem de notícias do buscador. “WhatsApp, Viber, Skype, Line, WeChat ou SnapChat... os aplicativos de mensagens instantâneas pululam e atiçam os mastodontes da Net, que as compram a preço de ouro”, constata o Mns Notícias. “O Facebook investiu 14 bilhões de euros para comprar uma start-up que não tem mais do que cinco anos e 55 funcionários”, exclama Axel de Tarlé no Europe 1, falando da “batalha dos dados”, acrescentando que o que o Facebook compra é a base dos 450 milhões de usuários, o que vai lhe permitir, essa é ao menos a aposta, permanecer no topo. E em mercados emergentes como a Índia ou o Brasil, o algoritmo participa da exploração mundial dos nossos dados privados oferecendo-nos “gratuitamente” essas maravilhosas ferramentas. O Google também está envolvido no tratamento do conhecimento com o “Knowledge graph”. “Ele permite ao Google buscar as informações de que tem necessidade para postá-las diretamente no buscador”, disse o sítio do Google, que tem o cuidado de acrescentar a palavra “conhecimento” à sua coleta de dados e que investiu 7,35 bilhões de dólares em seu novo Data Center, revela Rich Miller, redator chefe do Data Center Konwledge.
Mas o pensamento de Pierre Levy está dirigido para o sentido que o futuro digital toma. Para onde nos leva esta sociedade datacêntrica? “A mudança não está concluída, e ela oferece ainda muitas possibilidades de inflexões e de iniciativas criativas”.
A linguagem IEML: rumo a um instrumento operacional?
Imagine, em nossa vida diária, uma ferramenta maravilhosa, uma fantástica bola de cristal de coordenadas cruzadas graças à IEML, que poderá ser localizada por aqueles que a utilizam no mundo inteiro: o usuário não precisará aprender essa linguagem constituída e validade ao longo dos anos, nem conhecer os algoritmos que controlam as redes sociais. Pierre Levy imagina essa ferramenta circundando a imagem do planeta, mas, porque não, também as telas transparentes, como vemos no filme de Steven Spielberg Minority Report em 2002, adaptado de um romance de Philip K. Dick, autor de ficção-científica que aborda de maneira “filosófica” o tratamento dos dados e seu impacto sobre a vida privada. Em 2014, predomina o desafio dos debates atuais sobre a identidade digital e a proteção dos dados, inclusive na Europa.
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Se não paramos de inventar instrumentos digitais que modificam os nossos usos, móveis flexíveis, impressoras 3D do “Google Glass”, pouca pesquisa parece emergir em escala significativa sobre a maneira como os nossos cérebros e as nossas ideias passam por essa mutação, enquanto o digital revolucionou as nossas vidas privadas, profissionais, nossa compreensão do mundo e da educação, procurando pela alma gêmea. Pouca pesquisa num sentido ao mesmo tempo nobre e eficaz e, sobretudo, útil para as pessoas open data, os dados públicos on-line do governo francês.
IEML. Para que serve? “Os ecossistemas de ideias serão observáveis”
A ambição é enorme, daí a dificuldade de Pierre Levy para apreender o seu projeto, agora que a “gramática” da IEML está próxima, e fazê-lo passar do “laboratório” à “ferramenta”: uma nova camada de endereçamento com o objetivo de aumentar a inteligência coletiva, a capacidade cognitiva individual, o desenvolvimento humano, a prosperidade econômica, os direitos humanos etc. Até mesmo aí onde estávamos um pouco céticos e pouco atentos nas apresentações na Universidade de Paris 8: tantos “caprichos” de pesquisadores inclusive reputados se revelam inaplicáveis. Mas nessa noite de fevereiro, Pierre Levy foi claro e convincente, apesar da complexidade do projeto. Coloca o poder da análise dos dados nas mãos de todos, e nos situa próximos de uma democracia participativa... que está longe de ser o conceito mais compartilhado na França e no mundo... o que explica os obstáculos encontrados. E o que Pierre Levy chama de “conhecimento reflexivo” é aplicável em muitos campos.
As aplicações de IEML em nossas vidas
Os museus do mundo inteiro já têm debates apaixonantes sobre o tema “patrimônio e sítios de dados”, e na França podemos citar, entre outros, a BNF, que fez um notável avanço. Tudo o que trata da gestão dos recursos humanos no serviço público carece de ferramentas. Na educação nacional na França as pessoas avançam ainda “à moda antiga”, e os perfis atípicos, os inovadores, as experimentações não são recompensados no seu justo valor, quando mesmo não são freados. E ainda existe uma rede de inovadores em todas as academias. François Jarraud, professor que se tornou jornalista, foi um pioneiro no digital ao impulsionar o Le Café Pédagogique. François Muller foi durante muito tempo responsável pela inovação no Rectorat de Paris e pratica “o digital” a serviço da educação. Ele está agora no Ministério da Educação Nacional de Paris na origem da Respire, uma rede social de intercâmbio de saberes profissionais sobre inovação para professores. Mas ambos precisaram de 15 anos para obter o reconhecimento. Que sonho e que ganhos econômicos se um instrumento cirúrgico pudesse reparar em tempo real e reuniu virtualmente as competências de um milhão de professores e cruzar os “ecossistemas de ideias”, contribuindo para a renovação da educação no século XXI! Imaginemos também o que as nossas administrações Pôle Emploi ou os fundos de aposentadoria, que estão se afogando em enormes dados, poderiam fazer com esse futuro instrumento.
As autoridades locais teriam então a escolha de não mais ter que enfrentar o organograma “oficial” dos tomadores de decisão eleitos para... que decidam tudo pelos habitantes, mas também de fazer emergir proposições cidadãs. Ao identificá-los através de um mapeamento dos ecossistemas de habitantes que iriam impulsionar a economia local (habitação, educação, cultura, turismo, agricultura, etc.), a economia de um território ganharia muito mais e seria bem mais inovadora. “A extração automática das informações pertinentes a partir de dados não estaria mais reservada a uma elite política, tecnológica e financeira: um novo meio social e uma nova onda de alfabetização colocarão este poder cognitivo nas mãos de todos”. A iniciativa coletiva, a economia social e solidária, a economia colaborativa, como escrevemos em Les politiques s’enlisent: les français s’organisent, vive l’économie collaborative!, já estão acontecendo.
E nesse mundo de conflitos individuais, familiares, sociais, mundo das ideias ou religiões que se enfrentam, em que lemos todos os dias notícias sangrentas da barbárie em todos os continentes, “na África Central regam de violência e ódio” ou a “sangrenta repressão na Ucrânia”, uma ferramenta que, graças ao big data, permitiria ao homem progredir com a ajuda do digital e elevar o nível de civilização, é uma experiência que vale a pena ser tentada sem demora.
“Conhece-te a ti mesmo” (Sócrates): o GPS das ideias e do conhecimento
Fonte: http://bit.ly/1piPy3c |
Do que Pierre Levy precisa? Segundo ele, “de 12 engenheiros” para desenvolver uma demonstração acessível para os tomadores de decisão. Para mim, sobretudo, ele necessita de um top designer (como Etienne Mineur, por exemplo), que invente um nome de marca internacional e um símbolo tão forte e louco quanto o da maçã mordida, com o qual Steve Jobs e Steve Wozniak lançaram a Aplle. Ele necessita de uma Zara Hadid ou do eterno Philippe Starck. Com este “bate-papo” de 15 de fevereiro, as ideias não demoraram para entrar em fusão. Estavam presentes nessa noite, entre outros, Michèle Dreschler, Inspetora da Educação Nacional, conselheira em tecnologias da informação e da comunicação para a educação do Reitor da Academia Orléans-Tours, uma das inspetoras mais competentes que pratica em alto nível o digital, escritores, empresários, jovens inovadores como a plataforma noosfeer.
“Conhece-te a ti mesmo e conhecerás o universo e os deuses”. Esta inscrição no templo de Delfos, na Grécia, e popularizada pelo filósofo Sócrates, é, de certa forma, o que propõe esse “GPS das ideias” de Pierre Levy: melhor nos conhecer e conhecer os outros, melhor nos reunir para pensar e agir coletivamente, um instrumento em teoria infinitamente mais nobre e pertinente para o futuro digital do que as redes sociais atuais.
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O filósofo Pierre Levy inventa o GPS da inteligência coletiva - Instituto Humanitas Unisinos - IHU