21 Março 2014
A crise política entre a Europa e a Rússia continua piorando e sanções estão a caminho. Mas Johannes Teyssen, presidente-executivo da gigante de energia E.on não está preocupado. Ele diz que a parceria entre Moscou e Berlim promoveu a paz no continente e alerta contra perdê-la em uma aposta.
A entrevista é de Frank Dohmen e Stefan Schultz, publicada pela revista Der Spiegel e reproduzida pelo portal Uol, 18-03-2014.
Eis a entrevista.
Sr. Teyssen, a E.on investiu quase 6 bilhões de euros em usinas elétricas modernas na Rússia e se transformou na maior fornecedora estrangeira de energia no país. O senhor teme pelo futuro dos seus investimentos, diante da intensificação da crise na Ucrânia?
Não. Não há motivo para preocupação.
Explique, por favor.
Se ganhássemos nosso dinheiro com especulação, então poderia estar preocupado. Mas nós fornecemos algo que é benéfico ao povo. Nós construímos aquele que é provavelmente o complexo de geração de energia mais moderno dali, que emprega 5 mil russos e fornece eletricidade e calor para milhares de clientes.
A crise ainda pode piorar. Sanções são iminentes e suas usinas elétricas poderiam ser estatizadas. A Associação das Câmaras de Comércio e Indústria Alemãs alertou sobre possíveis expropriações.
Nossa empresa atua na Rússia há 40 anos. É um período que abrange a Guerra Fria tanto quanto as invasões ao Afeganistão tanto pelo Ocidente quanto pelo Leste; em outras palavras, épocas muito mais tensas que agora. Nossas relações de negócios permaneceram consistentemente positivas ao longo de todos esses anos. Há pouco motivo para nos queixarmos. Eu presumo que todo mundo agirá de modo responsável na situação atual, assim como os laços permanecerão estáveis.
O senhor não vê problemas potenciais resultantes da ocupação ilegal pela Rússia da Crimeia e os esforços para separar a região da Ucrânia? O Ocidente não pode simplesmente aceitar a situação.
É claro que há uma crise política. E torço por um relaxamento das tensões o mais breve possível. Mas não vejo nenhuma limitação aos nossos negócios. Vistos, alfândega, importações e exportações –tudo está funcionando de modo completamente normal.
O valor da moeda russa, o rublo, também caiu significativamente.
Isso não é bom para nossos lucros, é claro. Mas não é motivo para uma retirada. Se quisermos vender tudo amanhã, então a taxa de câmbio ruim seria um problema, mas não é decisiva para nosso sucesso a longo prazo.
A desvalorização do rublo não é uma consequência direta das políticas do presidente russo, Vladimir Putin?
Moedas de outros países também sofreram desvalorização significativa nos últimos meses, países como Noruega, Canadá e China. O governo russo que cerca Putin prometeu condições estáveis para o capital privado e os investidores. E até o momento cumpriu essa promessa.
O que lhe dá tanta certeza que as coisas permanecerão assim? Pense nas expropriações contra a multinacional de energia Yukos e seu ex-proprietário, Mikhail Khodorkovski. A empresa era privada e tinha investidores ocidentais, mas foi transformada em uma gigante de energia sob o controle do Parlamento russo, a Duma.
Eu não estou familiarizado com os detalhes exatos do caso. Nós nunca experimentamos interferência inadmissível.
O senhor ao menos entende que esse comportamento provoca preocupação no Ocidente, de que Putin pode tirar proveito da dependência da Europa e usar o gás natural e o petróleo como uma arma estratégica?
Não. Eu não entendo assim. E estou cansado dessa eterna conversa boba sobre nossa dependência. Também seria possível descrever um casamento como uma dependência se uma das partes estivesse rancorosa. Mas também poderia ser visto como uma parceria. A Europa e a Rússia desenvolveram uma parceria em energia ao longo de quatro décadas e, ao longo de todo esse período, não houve um único dia em que o gás natural foi usado como arma estratégica contra o Ocidente. Além disso, ambos os lados lucram igualmente com essa parceria. Mesmo agora, o gás natural está fluindo normalmente por todos os gasodutos. Esses são fatos.
Se nos permite: a União Europeia alerta quase mensalmente contra a dependência excessiva de gás natural e petróleo russos. De fato, por esse mesmo motivo, a UE queria gastar bilhões de euros na construção de seu próprio gasoduto.
Essa é uma questão totalmente separada. Eu acho que é um comportamento estrategicamente correto para a Europa buscar diversificar suas fontes e rotas, porque suas fontes próprias de matéria-prima são limitadas. Mas o gás natural russo fornece uma base confiável para nossa oferta de energia. Nós precisamos continuar tirando proveito disso.
A vida cotidiana mudou em questão de dias em Kiev, na Ucrânia, devido as manifestações com confrontos entre manifestantes e forças do governo do presidente deposto Viktor Yanukovich. Veja como o Instagram registrou a mudança no comportamento dos ucranianos que antes postavam selfies ou fotos do prato do almoço e passaram a fotografar os protestos.
O senhor está, é claro, apenas dizendo isso para proteção de seus acordos de fornecimento com a Gazprom e suas usinas na Rússia.
Não, eu estou dizendo por ser uma convicção profunda. Eu não quero intervir em questões de política externa. Mas eu acredito que temos buscado políticas bastante responsáveis em relação ao Leste nos últimos anos. O estabelecimento de boa fé e integração econômica levou a 6 mil empresas alemãs estarem ativas na Rússia. Igualmente, empresas russas também estão aqui, controlando corporações e gasodutos de gás natural. Nosso continente se tornou mais pacífico em consequência da parceria. Nós não devemos perder isso em uma aposta frívola.
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Crise na Ucrânia não é ruim para os negócios, diz executivo de energia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU