20 Dezembro 2013
Um estudo magistral – até agora sempre contestado e, na medida do possível, obscurecido pela hierarquia vaticana e pela cúpula da Conferência Episcopal Italiana – poderia abalar o sistema histórico-teológico com base no qual a doutrina oficial vigente na Igreja Católica Romana veta que as pessoas divorciadas em segunda união (civil) se aproximem da comunhão eucarística.
A reportagem é de David Gabrielli, publicada na revista Confronti, de janeiro de 2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Portanto, poderia se abrir um cenário inédito na preparação e, por fim, no desenvolvimento das próximas duas Assembleias do Sínodo dos Bispos (uma "extraordinária" em outubro de 2014, a outra "geral" em 2015), dedicadas à família. De fato, entre os muitos subtemas do encontro, todos ligados, em sentido estrito ou amplo, a família e sexualidade, um tema particularmente emergente e incumbente é precisamente o do status eclesial das pessoas divorciadas em segunda união que hoje, no mundo, são dezenas de milhões.
Uma das motivações decisivas que papas, Cúria e bispos – estes, salvo raríssimas exceções, sempre ecoando o ponto de vista romano – aportam para reiterar o "não" à comunhão para as pessoas divorciadas em segunda união é que a Tradição (ou tradição com "t" minúsculo?) sempre confirmou o que foi proclamado por Jesus: "Que o homem não divida o que Deus uniu". Por essa razão, aqueles que, violando o pacto conjugal, que prevê fidelidade e indissolubilidade, rompem o matrimônio e se casam (no civil) com outro parceiro cometem um pecado que, inexoravelmente, os impedem de se aproximarem da Eucaristia.
Em suma, argumentam, quem despedaça o sacramento do matrimônio, abençoado pela Igreja, e celebra outro, em sede civil, e vive como uxório na nova situação comete um pecado que a Igreja não pode perdoar nunca.
Tendo presente esse pano de fundo, as teses que, depois de uma análise muito bem documentada e rigorosa, são alcançadas por Giovanni Cereti (sacerdote genovês, teólogo, ecumenista, professor em várias faculdades teológicas) põem em questão radical o próprio coração do sistema teórico oficial imposto pela hierarquia eclesiástica às consciências. Examinando o mais importante concílio ecumênico, e o primeiro da série, o de Niceia, em 325, o estudioso, de fato, ressalta que essa soleníssima assembleia, no cânone 8, impunha de modo peremptória que os cátaros – os puros, os seguidores de Novaciano – aceitassem estar em comunhão com os digami.
A interpretação usual dessa palavra grega (traduzida em latim como bigami) foi de viúvos recasados. Mas o nosso teólogo, dissecando uma ampla visão panorâmica histórica, afirma que ela significava divorciados em segunda união.
Em outros termos, Niceia proclamava que a Igreja tem, desde Cristo, o poder de absolver de todo pecado, até mesmo do adultério, além da apostasia e do homicídio. Certamente, a responsabilidade dos cônjuges é viverem com coragem e dedicação o seu amor, até à morte: esse é o ideal que a Igreja sempre deve reiterar.
Mas onde, mesmo que por culpa, esse vínculo é despedaçado, e um cônjuge se une (civilmente) em um novo matrimônio, o que a Igreja deve fazer? Dizer-lhe que, se persistir no seu estado de pecado, não há misericórdia, ou impor-lhe uma severa penitência, mas, por fim, acolhê-lo – embora vivendo na nova união – à Eucaristia?
Pode ser que a estima e a amizade que eu tenho pelo padre Giovanni (que publicou a primeira edição do seu livro em 1977, com o Centro Editorial Dehoniano, e o publicou novamente, com a mesma editora, em 1998 – mas as autoridades eclesiásticas lutaram para que o livro fosse retirado; e agora o republica pela editora Aracne) me impeçam de avaliar criticamente a sua obra. Ela, no entanto, parece-me como uma pedra angular sobre a questão da Eucaristia às pessoas divorciadas em segunda união: e ninguém, muito menos aqueles que participarão dos próximos dois Sínodos, poderia abordar a questão sem fazer as contas com essa obra de Cereti.
Uma obra que, demonstrando que a mais antiga e pura tradição da Igreja acolhia à Eucaristia as pessoas divorciadas em segunda união, destrói as motivações "novacianas" sempre proclamadas pelos papas Wojtyla e Ratzinger.
Portanto, é um sonho esperar que o Papa Francisco nomeie o padre Giovanni como especialista para a assembleia sinodal de outubro próximo?
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''Divórcio, novas núpcias e penitência na Igreja primitiva - Instituto Humanitas Unisinos - IHU