01 Dezembro 2013
Morreu neste sábado, 30, dom Waldyr Calheiros, bispo emérito da diocese de Barra do Piraí-Volta Redonda (RJ). Com 90 anos, estava internado desde o início do mês com infecção pulmonar.
Ele dirigiu aquela diocese durante 34 anos, entre 1966 e 1999. Destacou-se sobretudo pela sua intransigente defesa dos direitos humanos e dos princípios Teologia da Libertação. Na avaliação dele, a Igreja Católica não deveria fazer uma “opção preferencial” pelos pobres, mas sim uma “opção exclusiva”.
A reportagem é de Roldão Arruda, jornalista, publicada no seu blog, 01-12-2013, sob o título "Morre dom Waldyr, o bispo socialista".
Dom Waldyr considerava o modelo capitalista incapaz de resolver os graves problemas de desigualdades sociais na América Latina e em outras partes do mundo. “O capitalismo foi incapaz de criar uma proposta para uma sociedade mais justa, humana e fraterna”, disse durante uma coletiva de imprensa, em 1978. “É um modelo falido. Depois de tantos anos não conseguiu vencer a fome, a miséria e a marginalização. Seu objetivo centrado no lucro o condena à incapacidade de resolver o problema social.”
O grande desafio para a esquerda, segundo o bispo, era encontrar uma “alternativa verdadeira” ao capitalismo. Os modelos socialistas conhecidos, como os da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e seus países satélites, também teriam fracassado, na avaliação dele: “Foram feitos para uma minoria privilegiada, marginalizando a maioria que não participa em nada”.
Na ditadura militar, suas constante denúncias de torturas e outras violações de direitos humanos lhe acarretaram perseguições. Em 1967, a sede da diocese foi invadida por militares à procura de material subversivo. “Cercaram minha casa com metralhadoras, como se eu fosse um ladrão ou criminoso”, relatou depois sobre o episódio.
Na mesma ocasião, quatro jovens ligados à diocese, militantes da organização de esquerda Ação Popular foram presos. Não foi a última vez. Em 1971, a ditadura levou para prisão um padre e um grupo de jovens ligados à Juventude Operária Católica.
Quando soube que, durante os interrogatórios, os jovens estavam sendo acusados de trabalhar com ele, dom Waldyr se apresentou ao Exército e pediu para ser preso. “Não era lógico que ficasse de fora a pessoa considerada responsável por tudo”, disse. Segundo seu relato, entrou no quartel às 8 horas da manhã e saiu às 9 horas da noite, em companhia dos presos.
Em 1968, ele rebateu da seguinte maneira as acusações de que a Igreja Católica estaria abrigando comunistas: “O que é mais doloroso em tudo isto é que qualquer posição que se venha a reivindicar em favor dos menos favorecidos é tachada de comunista.”
No ano seguinte, ele e 16 padres de sua diocese foram indicados num inquérito policial militar do Exército, sob acusação de atividades subversivas. O inquérito acabou arquivado.
O bispo defendeu publicamente a formação do Partido dos Trabalhadores (PT), no início da década de 1980. Mais tarde, em 1988, foi um dos personagens centrais na histórica greve da Companhia Siderúrgica Nacional.
O Exército invadiu a fábrica e três operários foram mortos. O bispo tomou posição ao lado dos grevistas, que reivindicavam melhores salários. Abrigou líderes do movimento e intermediou as primeiras mesas de negociação entre eles e o Exército.
Advertência
Naquele mesmo ano, dom Waldyr recebeu uma carta da Congregação para os Bispos com advertências relacionadas à sua pregação. O documento fazia parte do esforço do papa João Paulo II para conter o avanço da Teologia da Libertação na América Latina. O mentor da ação era o então prefeito da Congregação para Doutrina da Fé, o cardeal alemão Joseph Ratzinger.
Dom Waldyr era alagoano, natural de Muricy (AL). Foi ordenado padre em 1948 e bispo, em 1964. Seu corpo será enterrado na segunda-feira, em Volta Redonda, onde ganhou o apelido de “bispo de sangue”, por causa de suas lutas.
Na nota sobre seu falecimento, a Conferência Nacional dos Bispos (CNBB), disse: “Em oração, agradecemos o dom da vida e ministério deste nosso irmão que tanto se dedicou à Igreja no Brasil.”
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“Cercaram minha casa com metralhadoras, como se eu fosse um ladrão ou criminoso” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU