Por: Caroline | 27 Novembro 2013
“Como teria reagido a suposta imprensa livre e independente do continente, se as falhas, fraudes e crimes ocorridos em Honduras tivessem ocorrido na Bolívia, Equador ou Venezuela? A gritaria dos desavergonhados imperialistas e seus aliados teria sido estrondosa. Todavia, agora nestes meios impera um silêncio cúmplice porque em Honduras vale tudo. Por quê? Porque assim como Israel é peça chave para garantir o equilíbrio geopolítico do Oriente Médio, Honduras o é para a América Central, por ser o país onde se concentra o grosso do poder de fogo estadunidense na região”. Essa é a análise do cientista político e sociólogo Atilio A. Boron, em artigo publicado por Página/12, 26-11-2013. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
Fonte: http://goo.gl/HWiZTH |
Nas últimas horas de ontem, o Tribunal Superior Eleitoral de Honduras consagrava como vitorioso o candidato da continuidade do golpe, Juan Orlando Hernández. Desde o início, o processo eleitoral foi marcado por falhas irremediáveis que deixam um pesado manto de suspeita sobre seu resultado. A indisfarçável intervenção da “embaixada” nos assuntos internos de Honduras já deveria ser razão suficiente para suspender as eleições, redesenhar as instituições políticas – entre elas o próprio TSE, controlado por aqueles que endossaram o golpe de 2009 – e fazer uma nova convocação eleitoral para reunir as condições mínimas necessárias para uma eleição, não apenas durante a campanha (que já é em si um problema em Honduras, com seus recordes de jornalistas e militantes opositores assassinados), mas também durante a contagem final dos votos. Semanas antes das eleições, porta-vozes do governo haviam declarado que o TSE recolheria os números fornecidos pela embaixada dos Estados Unidos antes de revelar os resultados definitivos! De forma resumida: o ganhador seria proclamado pela “embaixada” e o governo do continuísmo golpista de Porfirio Lobo admitiria ter convertido Honduras em um protetorado estadunidense.
Esta vergonhosa confissão diz muito sobre a história deste sofrido país, ocupado por Washington e transformado, na década de oitenta, em uma gigantesca retaguarda para serviços de apoio logístico às agressões praticadas contra a revolução sandinista pelos “contrarrevolucionários” nicaraguenses. O arquiteto deste projeto contrarrevolucionário foi John Negroponte, uma das figuras mais sinistras das Américas e designado por Ronald Reagan para ser embaixador em Honduras, função na qual contou com a colaboração de outro reconhecido terrorista internacional, Otto Reich. Em sua gestão, o exército hondurenho foi reorganizado de cabo a rabo, munido com armamentos sofisticados, com equipamentos e tecnologia militar de última geração, e convertendo a base militar Soto Cano, em Palmerola, numa das mais estratégicas, entre tantas, que o Estados Unidos possuem na América Central e no Caribe. Quando o presidente Mel Zelaya (foto) buscou democratizar o sistema político e concretizou sua entrada na ALBA, foi violentamente destituído com um “golpe institucional”, um dos quais é marca da propensão tão viciado do regime de Obama.
Um dos analistas presentes em Honduras, Katu Arkonada, confirma a existência de múltiplas “irregularidades”, para não dizer golpes contra a vontade popular. Há pelo menos 20% de atas das mesas receptoras de votos, em regiões onde o partido Livre conta com grande respaldo popular, que foram arbitrariamente submetidas a uma auditoria e não foram computadas; em comunidades remotas se observou o “voto cadeado” e a compra de credenciais eleitorais; milhares de mesas obtiveram zero votos, o que significa que nem os próprios candidatos haviam votado em si mesmos. Só resta adivinhar quantos votos de Xiomara Castro foram removidos das urnas. O partido Livre ganhou nas ruas, mas não organizou uma rede de fiscais para garantir a transparência das eleições. Confiou em sua maioria ampla, certificada por todas as pesquisas e na improvável “imparcialidade” do TSE e do governo, frente uma eleição na qual o imperialismo e a oligarquia hondurenha não poderiam perder, porque Washington jamais aceitaria um resultado contrário aos seus interesses na região.
O primeiro passo da estratégia norte-americana para impedir um contratempo político foi a campanha de difamações contra Xiomara e seu partido. O segundo foi a organização fraudulenta das eleições e contagem de votos. O terceiro, caso os dois anteriores não frustrassem a vitória do partido Livre: impugnação do processo eleitoral e manipulação do Congresso para impedir que assumisse e, caso o fizesse, provocar sua destituição “legal” como a que ocorreu com seu esposo. Até agora, a direita se manteve apelando à fraude, revelando números que não correspondem à realidade e que os meios de comunicação hegemônicos dão como satisfatórias. O partido Livre terá que recuperar nas ruas o que lhe roubaram nas urnas.
Como teria reagido a suposta imprensa livre e independente do continente, se as falhas, fraudes e crimes ocorridos em Honduras tivessem ocorrido na Bolívia, Equador ou Venezuela? A gritaria dos desavergonhados imperialistas e seus aliados teria sido estrondosa. Todavia, agora nestes meios impera um silêncio cúmplice porque em Honduras vale tudo. Por quê? Porque assim como Israel é peça chave para garantir o equilíbrio geopolítico do Oriente Médio, Honduras o é para a América Central, por ser o país onde se concentra o grosso do poder de fogo estadunidense na região. E assim como Washington não permaneceria nem um minuto de braços cruzados frente a uma eventual vitória da uma esquerda anti-imperialista em Israel, envolveu-se descaradamente no processo político interno de Honduras para garantir um resultado de acordo com seus interesses estratégicos na região. Menos mal que, há poucos dias, na OEA, John Kerry deu por superada a Doutrina Monroe!
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Honduras. “A embaixada” diz quem ganhou - Instituto Humanitas Unisinos - IHU