01 Novembro 2011
Dois anos depois do afastamento de Zelaya, sua mulher, Xiomara Castro, se perfila como candidata do novo agrupamento Partido Liberdade e Refundação. Xiomara denuncia que o pacto de Cartagena não está sendo respeitado.
A reportagem é de Mercedes López San Miguel e publicado pelo Página/12, 31-10-2011. Foto de Guadalupe Lombardo. A tradução é do Cepat.
Xiomara Castro é mais chamativa do que mostram as fotos nos jornais. Alta, vestida com um traje preto que combina com um xale rocho, com as unhas impecavelmente esmaltadas, a ex-primeira dama de Honduras se senta para conversar com Página/12 no pátio de um centro cultural de Buenos Aires.
A vida de Xiomara Castro tomou um novo rumo em 28 de junho de 2009, quando os militares tomaram o poder de "Mel", como se chama Manuel Zelaya. Desde então, Xiomara sabia que tinha que resistir e se apresentar junto ao povo. Foi quando tornou-se visível a Xiomara política, e dois anos depois, há aqueles que a vêem como candidata à presidência de Honduras em 2013. Ela não descarta.
Sua credencial de embaixadora da campanha mundial Mais Paz, Menos Aids, trouxe esta mulher nesses dias à Buenos Aires. A ex-primeira dama sente especial afeto pela Argentina. "A participação da presidente Cristina Fernández foi fundamental. Ela esteve ao lado do meu esposo acompanhando-o nos momentos difícieis", lembra Xiomara e se emociona. Não pode evitar voltar ao tempo, no dia que o governo de Zelaya organizava a convocatória de um plebiscito para que os hondurenhos aprovassem uma reforma constitucional que possibilitaria sua reeleição. "Os militares tiraram o presidente à bala, ele estava de pijama e o levaram para Costa Rica. No Congresso nacional apresentaram uma carta de renúncia falsificada. Rompeu-se a ordem constitucional: tanto o Poder Legislativo como o Judicial tomaram parte do golpe junto aos militares".
Antes desse dia, esta formada em Administração e Contabilidade de Empresas, que é avó, aos 52 anos imaginava outra vida. "Eu sempre pensei que terminado o governo (de Zelaya, em janeiro de 2010) voltaria para minha casa para cuidar da minha família. Era isso o que eu pensava e queria, mas tenho falado com meus filhos e disse-lhes que isso mudou". "Católica como a maioria dos hondurenhos, ainda que as igrejas evangélicas tenham aumentado os seus fiéis, Xiomara é a favor do aborto terapêutico quando está em perigo a vida do bebê ou a da mãe. Zelaya se casou faz 35 anos, quando ela tinha 17 anos. A imprensa opositora especulou que Xiomara não estava com ele no momento do golpe, lançando o boato de que estavam separados. "Naquele dia do golpe, eu estava no município de Catacamas, de onde somos originários, supervisionando o plebiscito. Fui informada por minha filha que eles estão levando da casa meu marido. Que atiraram. Fiquei de dois a três dias nas montanhas até ir para Costa Rica. Logo depois, retornou a Tegucigalpa".
Zelaya também retornou, mas teve que se refugiar na embaixada do Brasil. "No momento em que Mel ia aterrisar, havia mais de um milhão de pessoas que o foram receber no aeroporto. Os soldados começaram a disparar e morreu um jovem de poucos anos e isso fez que sentíssemos que não podíamos ficar escondidos se o povo estava expondo o seu corpo. Assim tomamos a decisão de sair às ruas. Meu esposo se refugiou na embaixada e nós o acompanhamos nesses quatro meses e meio", disse.
Então começou o trabalho da Frente Nacional de Resistência Popular para denunciar os crimes da repressão. "As violações de direitos humanos começaram desde o golpe. Imagine o quanto é difícil quando é o Estado que reprime. A perseguição é dirigida àqueles que fazem parte da resistência", disse ele sem levantar a voz nunca.
"17 jornalistas foram assassinados por abrir espaços em seus meios de comunicação ou opinar falando da realidade no país. Em Honduras há um bloqueio midiático que não permite que a realidade venha à tona. Os canais de TV que tentaram mostrar o que estava acontecendo foram cassados, como a Globo TV. Hoje, continuamos nesse mesmo esquema. Grupos paramilitares que assassinam camponeses no interior do país. Ninguém pode explicar como o governo (Porfirio) Lobo não faz nada. Temos mais de 3500 denúncias de violações dos direitos humanos. Mais de 300 pessoas foram assassinadas".
Com a chegada de Lobo ao Executivo hondurenho, Zelaya pode sair de sua condição de refugiado e viveu um tempo na República Dominicana. Seus quatro filhos, um em cada lugar, divididos. Xiomara estava com ele no exílio e em seu retorno. O presidente deposto pode retornar devido ao Acordo de Cartagena assinado por Lobo e Zelaya, com a mediação dos presidentes Hugo Chávez e Juan Manuel Santos, da Venezuela e da Colômbia, respectivamente. Xiomara disse que o acordo não é cumprido porque algumas de suas condições não são respeitadas como a perseguição de liderenças que apoiavam o governo anterior. "Enrique Flores Lanza, ex-ministro da Presidência, enfrenta acusações pelo projeto de reforma constitucional. Quatro dias após o retorno, ele apareceu no tribunal para dirimir as acusações e foi colocado sob prisão domiciliar, com a exigência de uma fiança de US $2 milhões, quantidade que nunca existiu em casos anteriores".
O movimento da resistência sentiu a necessidade de se criar um braço político. Assim nasceu o Partido Liberdade e Refundação, composto por 60 organizações sociais que reunem camponeses, professores, sindicalistas e ex-simpatizantes do Partido Liberal. Zelaya, que se encontra sem direitos políticos para a próxima disputa eleitoral porque não haverá reeleição, apresentou ontem 80 mil assinaturas ao Tribunal Superior Eleitoral que respaldam o novo partido. Xiomara Castro se vê como candidata. "Se aspiro a presidência? Não descarto essa possibilidade, mas não sou eu quem tenho que tomar a decisão. Os movimentos do Partido Livre devem escolher os seus candidatos".
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Xiomara, uma mulher para superar o golpe hondurenho - Instituto Humanitas Unisinos - IHU