31 Agosto 2013
Fundado em 2004 por um grupo de petistas insatisfeitos com os rumos do governo Luiz Inácio Lula da Silva, o PSOL não escapou do impacto dos protestos que tomaram conta do País em junho. Diante da rejeição de grande parte dos manifestantes a todos os partidos políticos, os militantes da sigla recolheram as bandeiras, mas não saíram das ruas. No Rio, os políticos com mandato participam discretamente das mobilizações nas ruas e os jovens do partido passaram a ser os protagonistas, mas na condição de integrantes de movimentos sociais e estudantis.
A reportagem é de Luciana Nunes Leal e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 31-08-2013.
Em paralelo, o partido se organiza para o 4.º Congresso Nacional, em novembro, e nove teses estão em discussão. Todas avaliam o impacto das mobilizações no País, no cenário político e no partido. "Os gastos faraônicos em estádios, os investimentos públicos com saúde e educação são lutas em que a gente estava há muito tempo, mas não repercutiam como agora", avalia Chico Alencar (RJ), um dos três deputados federais da sigla. "Tivemos a sabedoria de não querer embandeirar os movimentos. A gente compreendeu que a rejeição política não livrava ninguém."
No partido, segundo o deputado, há três formas de encarar os protestos. "Há os que acham que o gigante acordou e vai mudar a face do País, outros acreditam que vai dormir de novo, porque os protestos são inorgânicos e extremamente diversificados. E há os que dizem que o gigante se mexeu, voltou a dormir, mas um sono leve, com possibilidade de acordar a qualquer momento", afirma Alencar, que se inclui no terceiro grupo. "Alguns mitos foram derrubados, como o de que a classe C vai ao paraíso."
No alvo
Algumas teses apresentadas para o congresso do PSOL defendem uma radicalização mais à esquerda. Quatro atacam diretamente Randolfe Rodrigues (AP), único senador da sigla, por ter se reunido com a presidente Dilma Rousseff, contrariando decisão da Executiva nacional, após a onda de protestos. Randolfe também é criticado por aceitar, em Macapá, o apoio do DEM a Clécio Luís, um dos dois prefeitos do PSOL - o outro é de Itaocara (RJ).
"O PSOL já está à esquerda. Mais à esquerda é o precipício", ironiza Randolfe. "A aliança política no campo democrático e popular não deve ser excludente. Quanto ao encontro com a presidente, sou senador, seria um equívoco enorme perder a oportunidade de falar da pauta de mobilização das ruas."
Randolfe critica a tese difundida por "grande parte do petismo, que tenta rotular as mobilizações como de direita, beirando o fascismo". "O que acontece no Rio, por exemplo, é fantástico, progressista. A cobrança para encontrar o pedreiro Amarildo, desaparecido na Rocinha, pressionou os governantes, a opinião pública e a mídia."
Com as manifestações pela saída do governador Sérgio Cabral (PMDB) e contra a CPI dos Ônibus na Câmara Municipal, o Rio tem concentrado o maior número de protestos das últimas semanas. Autor do pedido de investigação, Eliomar Coelho, um dos quatro vereadores do PSOL na cidade, recusou-se a participar dos trabalhos depois que a presidência e a relatoria da comissão foram entregues a aliados do prefeito Eduardo Paes (PMDB). "Não poderia participar de uma CPI sem legitimidade", diz. Na Assembleia Legislativa, cabe ao deputado Marcelo Freixo a oposição mais contundente a Cabral.
Militantes da sigla vão aos atos, mas sem bandeiras
Integrantes da Juventude do PSOL, Kenzo Soares e Tadeu Lemos, de 22 anos e estudantes da UFRJ, e a geógrafa Natalie Drumond, de 26, têm feito o possível para participar e ajudar a organizar os protestos quase diários no Rio, mas dizem que não atuam em nome do partido.
"Não levamos bandeiras. Há uma avaliação no PSOL de que é importante fortalecer os movimentos sociais. As lutas dos movimentos e do partido são parecidas, como a tarifa zero para o transporte público. A gente se desdobra para estar em todas as manifestações", diz Kenzo, estudante de Jornalismo.
Aluno de História e integrante do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFRJ, Tadeu também procura desvincular os protestos do partido. "Não vou com bandeira do PSOL porque sou do movimento estudantil e de outros coletivos. A gente não pode usar os movimentos sociais apenas como canal de transmissão dos partidos", afirma. "Se o PSOL olhar para as ruas só com visão eleitoral, vai fazer o que todos os partidos fazem. A maior tarefa do partido é não se preocupar tanto com eleição e ouvir as pessoas nas ruas."
Natalie faz parte do movimento Juntos!, que reúne, segundo ela, entre 2 mil e 3 mil militantes, com e sem partido, em vários Estados. "Coletivos e partidos são fóruns diferentes, embora tenham muitos pontos em comum. O Juntos! tenta se preservar como movimento autônomo", diz Natalie.
Além da ausência das bandeiras partidárias, outra característica dos protestos no Rio é a presença de grupos como o Black Bloc, que vão com os rostos cobertos às manifestações e muita vezes participam de quebra-quebras nas ruas. "O PSOL não tem posição fechada em relação ao Black Bloc, a não ser não aceitar a repressão às manifestações. Acredito que eles surgiram em reação à repressão policial. Nossa orientação é que as manifestações são pacíficas, mas não compartilhamos da lógica de criminalizar o Black Bloc", diz Kenzo.
Segundo Natalie, os grupos mais radicais não participam da organização dos protestos e costumam se encontrar apenas na hora da manifestação. "Eles não admitem que são uma organização, mas uma tática. E a repressão policial é muito mais violenta. Mas acho que essa tática pode, sim, atrapalhar, porque pode impedir que muitos persistam nas ruas."
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Protestos obrigam PSOL a 'discutir a relação' com as ruas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU