29 Junho 2013
Antes de melhorar pode piorar. No meio do caminho não é desprezível a possibilidade de uma desaceleração mais acentuada da atividade e inflação mais alta do que o projetado. Há quem se arrisque a prever até mesmo uma contração do PIB no último trimestre do ano. Não vai ser trivial, daqui por diante, segurar o pleno emprego nem o salário real. Câmbio e juros são as variáveis-chave para determinar os rumos do crescimento e da inflação.
O comentário é de Cláudia Safatle, publicado no jornal Valor, 28-06-2013.
Ontem, no Relatório Trimestral de Inflação, o BC reduziu de 3,1% para 2,7% o desempenho do PIB para este ano e elevou a inflação, no cenário de referência, para 6%. Para 2014, ano de campanha eleitoral e de Copa do Mundo, a estimativa da instituição é de uma pequena aceleração do crescimento - 3% no primeiro trimestre - e inflação de 5,4% no ano. Isso, considerando a taxa de câmbio em R$ 2,10 e a Selic de 8% ao ano, parâmetros que parecem já envelhecidos. Com a mesma taxa de câmbio e juros em 8,75% ao ano, conforme cenário de mercado, a inflação cairia para 5,8% este ano.
Os indicadores da atividade em junho vão sofrer os efeitos da ocupação das ruas pelos movimentos populares de protesto. Há informações de que houve, nas primeiras três semanas, uma retração na venda de automóveis, setor que dá o ritmo à produção industrial. A venda de eletroeletrônicos estaria com queda da ordem de 25% do meio do mês para cá.
A confiança dos consumidores, segundo a FGV, teve queda de 0,4% em junho. Até o dia 10, antes dos protestos se espalharem por todo o país, o indicador da situação atual da economia local (que compõe o Índice de Confiança do Consumidor, ICC) crescia 3,2%. Do dia 10 ao dia 19, houve queda de 9,3%. Esses são dados que podem ser rapidamente revertidos com o fim dos movimentos. O crescimento do consumo das famílias, no entanto, perde fôlego, e o endividamento, elevado, tende a ser afetado pelo aumento dos juros.
Analistas de mercado começam a vislumbrar uma taxa de crescimento muito baixa no segundo semestre, mais próxima de zero, com a possibilidade até de retração no fim do ano. Nessa hipótese, as empresas, que estão há dois anos esperando a retomada do crescimento e mantiveram seu quadro de pessoal por causa do alto custo das demissões, começariam a dispensar. Não se espera nada muito dramático, mas a taxa média de desemprego seria, nesse exercício, maior do que os 5,5% do ano passado.
Outra parte da história refere-se aos investimentos. O relatório do BC enfatiza que as concessões para projetos de infraestrutura, os leilões de petróleo do campo de Libra, da camada do pré-sal, e a gradual recuperação da confiança de empresários "sugerem intensificação dos investimentos neste e nos próximos semestres". Mais investimentos ampliam a oferta de bens e serviços, podendo atender de forma não inflacionária ao crescimento da demanda.
Há, de fato, grande expectativa do governo com as concessões. É importante salientar, no entanto, que elas sofreram um golpe com o recente congelamento de tarifas, em decorrência dos protestos contra o reajuste das passagens de transportes urbanos. O temor levou governadores a sugerir adiamento no reajuste de tarifas de energia elétrica. Isso, na prática, se traduz em um rompimento de contrato com as empresas permissionárias e transmite insegurança para as companhias que queiram se habilitar à exploração de serviços públicos no pais.
A economia brasileira está, portanto, sujeita a vários riscos, como os citados acima, que emergem numa hora em que os Estados Unidos anunciam intenção de reduzir os estímulos monetários que irrigam o mercado internacional - produzindo valorização do dólar - e a China desacelera de forma pronunciada. O diretor do BC, Carlos Hamilton Araújo, comentou, ontem, que a reação do mercado de juros às declarações do presidente do Federal Reserve (Fed), Ben Bernanke, sobre a diminuição dos estímulos, fez com a taxa de juros futura aumentasse demais. "De fato os prêmios foram longe demais, tanto que houve um recuo", disse.
O apoio da política fiscal pode ser um atenuante para o orçamento de juros do Copom. A presidente Dilma Rousseff, segundo assessores próximos, está empenhada e determinou ao Ministério da Fazenda o cumprimento estrito do superávit primário de 2,3% do PIB este ano. A área econômica garante que cumprirá à risca essa meta, sem truques contábeis, mas não está claro como isso será feito. Quando se pergunta a especialistas do governo que despesas poderiam ser cortadas, não há resposta. Perde-se, com isso, um ganho nas expectativas.
Por outro lado, o BC eleva os juros para conter a inflação - mais resistente do que parecia -e espera que o IPCA de 12 meses ceda no segundo semestre.
A visão do governo é diferente do quadro traçado acima. A área econômica acredita que a atividade continuará reagindo, que o aumento da taxa de juros vai reduzir a inflação ainda este ano para algo abaixo dos 5,84% registrados no ano passado e não haverá queda do emprego. Não haveria nada de mais grave para prejudicar a reeleição da presidente Dilma Rousseff.
A estratégia, no governo, é conduzir a economia sem grandes turbulências até as eleições de 2014. E os eventuais ajustes fiscal e monetário, para endireitar o que empenou nos anos recentes, ficariam para quem assumir a Presidência da República em 2015. Há risco também nessa estratégia. Os problemas podem se precipitar, como temem vários analistas do setor privado, alguns economistas do setor público e petistas próximos ao ex-presidente Lula.
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Riscos econômicos e pós-eleitorais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU