Por: Jonas | 28 Junho 2013
O Papa quer ter as contas claras no Instituto para as Obras de Religião (IOR), quer estar informado pessoalmente sobre tudo que se relaciona com suas atividades e receber pessoalmente uma cópia dos documentos sobre os temas problemáticos. Sente a urgência de se ocupar seriamente dos problemas do “banco vaticano”, para “permitir que os princípios do Evangelho também permeiem as atividades de natureza econômica e financeira”. Com um “quirógrafo”, Francisco criou uma comissão especial, com amplos poderes, que deverá realizar uma profunda investigação sobre a “posição jurídica” e sobre as atividades do IOR.
Fonte: http://goo.gl/0uASP |
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no sítio Vatican Insider, 26-06-2013. A tradução é do Cepat.
Trata-se de uma decisão inovadora e muito direta, que segue fielmente a linha da transparência colocada em marcha por Bento XVI. Efetivamente, a comissão representa um instrumento diretamente ligado ao Papa. Não apenas os organismos e todo o pessoal do IOR, mas toda a Cúria Romana deve colaborar com o Papa, sem poder alegar nenhum tipo de “sigilo profissional”. Todos os que acreditam que tem algo a dizer ou que possuem uma informação importante deverão comunicá-la explicitamente.
A comissão é composta por cinco membros, mas, no caso necessário, poderá receber o apoio de colaboradores externos. Estes são seus nomes: o cardeal Raffaele Farina presidirá a comissão; os membros são o cardeal Jean-Louis Tauran e a professora Mary Ann Glendon, o coordenador será o arcebispo Juan Ignacio Arrieta, ao passo que o secretário e o assessor para a Secretaria de Estado será Peter Bryan Wells.
A decisão do novo Papa é importante, pois indica que não sucumbiu diante da estratégia midiática tranquilizadora do novo presidente do IOR, o alemão Ernst von Freyberg, que tem concedido numerosas entrevistas à imprensa internacional. Francisco também não se deixou influenciar pelas “lições” de teologia sobre o que é “essencial” para a liberdade da Igreja, contidas numa surpreendente entrevista do diretor geral do Instituto, Paolo Cipriani. Está se dando passos para se aproximar da transparência, mas ainda há muitas pendências. O “motu próprio” quase parece um convite a não prestar atenção em anúncios e a não tomar decisões sem antes consultar o Pontífice.
Principalmente, o texto do Papa, com data de 24 de junho, cita o documento anterior, no qual João Paulo II, em 1990, reconfigurou o IOR para adequar suas estruturas “às exigências dos tempos”, juntamente com o convite de Bento XVI para que “os princípios do Evangelho” permeiem “também as atividades de natureza econômica e financeira” do Vaticano. Francisco tomou esta decisão após ter consultado os cardeais, bispos e outros colaboradores, “à luz da necessidade” de reformas nas estruturas que ajudam a Santa Sé. Por este motivo, criou a comissão “referente” ao IOR, para que “reúna informação pontual a respeito da posição jurídica e sobre as diferentes atividades do Instituto”, com o objetivo de permitir, caso necessário, “uma melhor harmonização do mesmo com a missão universal da Sede Apostólica”.
A comissão conta com um coordenador e um secretário. O primeiro “tem poderes ordinário” como delegado na recopilação de “documentos, dados e informações”. O segundo o ajuda e “cuida das atas”: “O ‘sigilo profissional’ e as demais eventuais restrições”, estabelecidas pela normativa jurídica, “não inibem ou limitam o acesso da comissão” à documentação, exceto “às normas que tutelam a autonomia e a independência das autoridades que realizam atividades de vigilância”. Isto significa, por exemplo, que o trabalho da comissão não atingirá, de forma alguma, as prerrogativas da AIF, a Autoridade de Informação Financeira vaticana. De qualquer modo, todo mundo poderá falar sem medo diante da comissão papal.
Francisco estabelece que “o governo do Instituto continua operando” segundo a norma precedente, a não ser que haja alguma “disposição diferente”. No momento, não mudarão os equilíbrios do governo interno do Instituto. Antes de intervir, com eventuais reformas, Francisco quer estar completamente informado sobre tudo o que acontece à sombra do Torreão de Nicolau V (sede do IOR). A comissão “se serve da colaboração solícita dos órgãos do Instituto, além de todo o seu pessoal. Os supervisores, os membros e os oficiais dos dicastérios da Cúria Romana e outros a ela vinculados”, além do Estado da Cidade do Vaticano, também colaboram com a própria comissão.
Outros dois pontos do documento são fundamentais, pois claramente surge a vontade do Papa de estar constantemente informado sobre as atividades da comissão, “no curso de seus trabalhos”, e não apenas no final. Além disso, a própria comissão deverá entregar a Francisco “os resultados do próprio trabalho, além de todo o seu arquivo”, imediatamente após terminar suas atividades, ou seja, antes de ser dissolvida. Desta forma, os dados e os documentos relacionados com as atividades do “banco vaticano” chegarão diretamente às mãos de o papa Francisco e será ele o responsável em guardá-los.
Com este documento, que chega há menos de duas semanas da nomeação do prelado do IOR, Battista Ricca, homem de confiança do Papa. Francisco pretende dar um sinal forte e preciso: as decisões estratégicas e estruturais sobre o “banco vaticano” serão tomadas em um nível muito mais elevado do que representa a presidência e gestão do próprio Instituto. Bergoglio não pretende tomar decisões apressadas sobre as possíveis reformas do IOR. Antes de tomar qualquer decisão, nesta direção, pretende contar com toda a informação a esse respeito (e de primeira mão). E “se espera” uma “feliz e produtiva colaboração” entre a comissão e o IOR.
Um dos últimos escândalos sobre o IOR foi o caso em que esteve envolvido dom Nunzio Scarano, prelado que presta serviços na Administração do Patrimônio da Sede Apostólica (APSA) do Vaticano, e que estaria envolvido com lavagem de dinheiro. Seu advogado, Silverio Sica, explicou que a investigação nasceu de uma transação feita por dom Scarano, em sua conta no IOR, no ano de 2009, quando retirou 560 mil euros para pagar um empréstimo na Itália.
“A comissão também se serve da colaboração de outros sujeitos, de forma espontânea ou por solicitação”. São notáveis as palavras: o Papa não se limita em convidar, mas dá como certa a “colaboração solícita” de todos e cada um dos empregados do Instituto para as Obras de Religião e da Cúria. Uma colaboração que não pode ser negada e que dará a possibilidade a todos os que possuam informação sobre o IOR, ou que saibam qualquer coisa sobre o Instituto, de se dirigir à comissão para ser ouvidos.
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O IOR em foco. Um relâmpago chamado Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU