06 Junho 2013
Dois anos atrás, Beth Brooke, vice-presidente global da companhia de serviços profissionais Ernst & Young, e ex-funcionária do alto escalão da administração Clinton, tomou uma decisão que transformou sua carreira. Ela revelou aos colegas que é gay. Amigos próximos já sabiam, mas até 2011 ela vinha mantendo sua vida particular encoberta no trabalho.
A reportagem é de Emma Jacobs, publicada no Financial Times e reproduzida pelo jornal Valor, 05-06-2013.
Foi preciso um pedido para que ela participasse de um vídeo voltado para crianças lésbicas, gays, bissexuais e transgêneras (LGBT) suicidas para que ela tivesse coragem de se revelar. O impacto sobre sua vida profissional tem sido enorme, diz Beth. Em vez de dedicar energia para evitar conversas de cunho pessoal e ser enigmática e evasiva no escritório, ela pode ser ela mesma, de modo que está mais relaxada e, segundo ela, totalmente "engajada" no trabalho.
Ashley Steel, vice-presidente do conselho de administração da divisão britânica da KPMG, que vive uma união civil com uma mulher e só foi se revelar quando estava no conselho, entende a experiência de Brooke: "É difícil ficar reprimida porque isso tira sua atenção do trabalho."
A decisão de um trabalhador de assumir sua sexualidade para os colegas é pessoal e complicada. No entanto, muitas empresas avançaram muito na última década na mudança de suas culturas corporativas para ajudar lésbicas, gays e bissexuais a se sentirem confortáveis no trabalho ao revelarem suas opções sexuais.
"The Power of 'Out' 2.0", um estudo divulgado pelo Centro para a Inovação de Talentos, um centro de estudos de gerenciamento de talentos e diversidade dos Estados Unidos, consultou 983 funcionários LGBTs nos EUA e constatou que 59% dos trabalhadores gays se revelaram no trabalho, um aumento de 7 pontos percentuais em relação ao ano anterior.
Na batalha pelo recrutamento de talentos, empresas "blue chip" e startups do Vale do Silício participam de eventos LGBT e estendem os benefícios a parceiros do mesmo sexo. Há hoje redes profissionais criadas especialmente para atender trabalhadores LGBT - por exemplo, a Gayglers do Google e a Spectrum do Barclays. A rede "Out on the Street" foi estabelecida há dois anos para encorajar a discussão dessas questões entre executivos do alto escalão em Wall Street. Este ano, ela realizou um encontro com palestrantes como Lloyd Blankfein, diretor-presidente do Goldman Sachs e Irene Dorner, executiva-chefe do HSBC Holdings nos Estados Unidos. Companhias como Amazon, Microsoft e Google vêm fazendo declarações públicas em favor da igualdade de direitos do casamento.
"As mudanças demográficas exigem diversidade nas equipes. Se você não tem gays ou negros nos conselhos, então você não entende os mercados novos ou diferentes", diz Brooke. "As relações de negócios são construídas com base na confiança. Se você olhar para indivíduos LGBTs não assumidos, verá que eles não estão alavancando suas relações nos negócios e isso os torna menos valiosos."
Nigel Nicholson, professor de comportamento organizacional da London Business School, acrescenta: "Se as empresas reconhecem que uma parcela de seus funcionários se importa com essa questão, isso faz com que estes fiquem mais motivados - o mesmo acontecerá com clientes e outros. Esse cuidado certamente faz parte de uma mudança cultural".
As transformações no local de trabalho refletem mudanças sociais e políticas mais amplas em questões como o casamento gay. Além disso, Brooke observa que a distinção entre a vida pública e a particular hoje é mais elástica do que há uma década. O Facebook e outras formas de mídia social vêm mostrando que os trabalhadores mais jovens "esperam franqueza" de administradores e colegas.
Em algumas áreas, as empresas têm sido mais progressistas que os políticos. Noventa e quatro empresas da lista "Fortune 100" possuem políticas não discriminatórias que incluem a orientação sexual, mas apenas 21 estados americanos possuem leis com os mesmos propósitos.
Mesmo assim, seria um equívoco sugerir que não há discriminação no trabalho. Segundo o estudo "Power of 'Out' 2.0", um terço das pessoas que assumiram ser gay em suas vidas particulares preferem continuar no armário no trabalho. O Williams Institute, parte da Universidade da Califórnia em Los Angeles, constatou que 58% dos trabalhadores LGBT informaram que colegas fazem comentários depreciativos sobre eles. Conforme afirma um executivo de uma companhia de petróleo que assumiu ser gay: "Algumas pessoas são receptivas e perguntam sobre seu parceiro. Outras jamais perguntam sobre sua vida e excluem você dos eventos sociais. Ser gay prejudicou minha carreira? Provavelmente sim, porque eu me retraio e as pessoas ficam menos confortáveis".
Lord Browne, ex-diretor-presidente da companhia de petróleo BP, que somente assumiu sua condição depois que sua relação com um ex-namorado foi exposta por um jornal, diz que a cultura varia de setor para setor. No ano passado, ele disse em um evento sobre redes profissionais LGBT: "Entre as muitas pessoas gays que conheço na área de private equity... menos de 1% são abertamente gays".
Todd Sears, um ex-banqueiro que começou a rede "Out on the Street", diz: "Ter boas políticas não é suficiente. Do mesmo jeito que as políticas de igualdade de gênero não resolveram o problema da escassez de mulheres no topo das companhias, é preciso haver uma mudança cultural".
Um outro aspecto importante é que, na medida em que as empresas posicionam talentos fora de seus mercados domésticos e trabalhadores buscam experiência fora num mercado globalizado, trabalhadores gays poderão se ver em países menos tolerantes. A homossexualidade ainda é ilegal em mais de 70 países.
"A maioria das empresas possui políticas contra a discriminação", diz Sears. "O desafio é quando os países possuem costumes locais conflitantes com essa linha central. As empresas precisam ser claras em relação aos seus valores."
Sarah Henchoz, sócia da firma de advocacia Allen & Overy, especializada em direito trabalhista, diz que é possível evitar o litígio. Ela cita o exemplo de um trabalhador britânico gay transferido para Cingapura e que moveu uma ação na justiça contra seu empregador britânico porque um contratado local fez comentários homofóbicos sobre o descanso de tela de seu computador. "Em última análise, uma companhia é responsável pela segurança de seus funcionários, incluindo a saúde mental. Ela pode ser responsabilizada se pressionar um funcionário a ir para um país onde há discriminação."
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Mais gays revelam opção sexual no trabalho - Instituto Humanitas Unisinos - IHU