Por: Cesar Sanson | 03 Junho 2013
Apesar dos avanços no combate ao trabalho infantil — caiu de 19,6% das crianças e jovens de 5 a 17 anos, em 1992, para 8,3%, em 2011 —, especialistas estimam que entre 1,56 milhão e 1,97 milhão de crianças e adolescentes trabalhem em atividades perigosas e insalubres no Brasil, pouco mais da metade dos 3,7 milhões de menores trabalhadores, registrados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad/2011), do IBGE.
A reportagem é de Cássia Almeida e Letícia Lins e publicada pelo portal do jornal O Globo, 02-06-2013.
Segundo o ministro Lélio Bentes, do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e coordenador da Comissão para Erradicação do Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho, no mundo, a proporção das piores formas de trabalho entre os trabalhadores juvenis é de 53,5%. A estimativa mais conservadora, de 1,5 milhão, une trabalho infantil doméstico ao trabalho agropecuário para estimar as crianças e os jovens nessa situação.
O país tem até 2015 para erradicar esse tipo de trabalho, pela meta fixada no Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador. Meta que não será alcançada, dizem especialistas da Justiça, do Ministério Público e de organizações não governamentais, além da própria Organização Internacional do Trabalho (OIT), que também chama a atenção para o fracasso mundial, meses antes da III Conferência Global de Erradicação do Trabalho Infantil, que acontece no Brasil em outubro. São crianças que trabalham na produção de fumo, algodão, sisal, cana-de-açúcar, na aplicação de agrotóxicos, no corte de madeira, casas de farinha, carvoarias e lixões ou são aliciadas pelo tráfico de drogas ou exploradas sexualmente.
— Não vamos conseguir alcançar a meta. São atividades concentradas no setor informal, na agricultura familiar, no trabalho infantil doméstico. São necessárias novas estratégias. O Bolsa Família tem sido um instrumento eficaz , mas que, sozinho, não está dando conta — diz Bentes.
Ministério está otimista
O Ministério de Desenvolvimento Social ainda crê que a meta será atingida. Paula Montagner, secretária adjunta de Avaliação e Gestão da Informação do ministério, afirma que o governo vem tomando medidas para coibir essa prática. Ela cita o aumento das escolas em horário integral e o programa Brasil Carinhoso como armas para combater esse tipo de trabalho. Para ela, é difícil dimensionar esse universo de trabalhadores, já que mesmo incluídos em atividades de risco, a criança e o jovem podem estar em trabalhos não diretamente ligados à atividade proibida.
Paula diz há mais de sete mil centros de referência de assistência social como portas de entrada para atacar, junto com as famílias, o problema.
Pelos números do Censo de 2010, é possível ter uma ideia de quantas crianças e adolescentes estão nessas atividades. No processo produtivo de fumo, algodão, cana-de-açúcar e frutas, foram encontrados 35.044 de dez a 17 anos. Na cultura de mandioca, há 70 mil crianças, mas o trabalho mais arriscado é nas casas de farinha, como as do interior de Pernambuco. Glória do Goitá fica no limite com o Agreste. É possível flagrar crianças em três de quatro estabelecimentos visitados, onde meninos — na maioria — trabalham expostos ao pó, ao barulho dos motores, ao calor dos fornos e ao cheiro forte da manipueira, substância de alto teor alcoólico liberada no processamento da mandioca. Nenhum deles foi visto pela equipe do GLOBO com qualquer equipamento de proteção.
De acordo com pesquisa do Centro Dom Hélder Câmara de Estudos e Ação Social (Chendec), a agricultura ocupa o quarto lugar no ranking das 29 atividades que usam crianças como trabalhadores no estado, só perdendo para as feiras, o comércio e o emprego doméstico. Nas casas de farinha, se veem até crianças a partir de três anos manipulando facas, para descascar mandioca. X., de 3 anos e Y, de 6, usavam facas com a destreza de adultos.
— Eles são meus filhos, estão brincando e não vou dar entrevista — reclamou o proprietário, Romero Cabral.
A ONG Repórter Brasil fez um longo relatório sobre as piores formas de trabalho infantil. A lista tem 89 tipos de trabalho, descritos em decreto presidencial de 2008. O relatório mostra ainda trabalho infantil em abatedouros e em cemitérios, também incluídos nas piores formas de trabalho. Para o coordenador da ONG, Leonardo Sakamato, o Brasil não vai conseguir erradicar as piores formas de trabalho infantil e tirar a totalidade de crianças e jovens de 5 a 17 anos do trabalho até 2020:
—Houve desaceleração na redução do trabalho infantil, o Censo de 2010 constatou até alta de 1,5% no trabalho de dez a 13 anos, a faixa mais vulnerável.
Maria Claudia Mello Falcão, coordenadora do Programa Internacional de Eliminação do Trabalho Infantil da OIT, diz que não se pode replicar a média mundial para o Brasil. Cada país tem peculiaridades.
— Hoje isso é o grande problema. Não saber exatamente quantos são no Brasil.
A meta mundial é chegar a 2016 sem essas crianças trabalhando, mas o prazo não deve ser alcançado, inclusive por países da Europa devido à crise, segundo Cláudia.
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Meta de eliminar trabalho infantil não será cumprida: 1,9 milhão se encontram nessa condição - Instituto Humanitas Unisinos - IHU