04 Mai 2013
Filósofo e integrante do Grupo de Pesquisa de Movimentos Sociais e Educação da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), Luiz Augusto Passos realiza pesquisas na área de educação ambiental e movimentos sociais. Nesta entrevista, ele apresenta algumas interpretações dos paradoxos ligados à questão do meio ambiente.
A entrevista é publicada pelo jornal Zero Hora, 04-05-2013.
Eis a entrevista.
Por que a questão ambiental só é discutida quando há denúncia, acidente ou polêmica?
O filósofo alemão Wittgenstein dizia que aquilo que está muito perto dos olhos, a gente não enxerga. E a reiteração da situação acaba por torná-la natural. A gente se acostuma e não se sente mais comprometido. A questão ambiental está prejudicada porque a cultura que nos envolve está divorciada da natureza. A modernidade dividiu as questões do pensamento daquelas do mundo material. E elas são sempre inseparáveis. São duas faces de uma mesma moeda. É necessário um esforço contínuo de aproximá-las.
O meio ambiente ora é um bem público, ora é privado. Isso cria nas pessoas uma sensação de indiferença para a questão?
Infelizmente as pessoas se relacionam com os bens públicos e de acesso a todos e inserem-nas na área da exploração econômica, como é o caso da água, e do ar. A cada dia aquilo que pertencia por direito a todas as pessoas, por pura perversidade, tem sido reservado ao cativeiro do mercado. De forma que é exato o que você pergunta: há uma cultura mercadológica que pensa todos os seres como vinculados a uma lógica de mercado. Isso significa a perda do sentido de pertença à comunidade humana, à comunidade política, e a atribuição do poder político a uma representação, que dia a dia não nos representa, mas está a serviço de grandes interesses de corporações multinacionais. De sorte que saúde hoje se rege por uma cultura da doença e da morte. É preciso se redefinir o Estado brasileiro e a relação federativa, entendendo que o fundamento do poder pertence a cada cidadão.
Na história do Brasil, há situações em que o território, o ambiente e a biodiversidade foram alvo de disputas. Essas disputas seriam as raízes do paradoxo entre a indiferença e o excesso de zelo pela natureza?
Não creio que se possa chamar de indiferença. Penso que é um sentimento reiterado de não se ter a quem recorrer no campo do Direito. Tivemos agora a polêmica no âmbito dos poderes da República, e que esclarece muito bem o conflito posto pelo filósofo Giorgio Agamben, de que para salvar o Estado de direito se articulou o Estado de exceção. Busca-se hoje tanto esvaziar o Executivo, chamar todas as decisões ao âmbito das casas do Legislativo que em sua maioria expressiva não nos representam. E polemiza-se o âmbito do Judiciário. Os gaúchos sabem, todavia, que é bem perto do fogo que tem aragem. Trata-se de enfrentar os problemas trazendo-os à luz, sem temer expor, como hoje se expõe, essas situações de destruir os esforços de consolidar o âmbito de biodiversidade, de participação dos direitos dos mais empobrecidos e portadores de diferenças culturais, sobretudo indígenas, quilombolas, população ribeirinha, sem-terra. Não haverá paz sem justiça social e ambiental. Ninguém pode se eximir de contribuir nesta luta, que é de todos.
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“Não haverá paz sem justiça ambiental”. Entrevista com Luiz Augusto Passos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU