26 Abril 2013
Há quatro meses o gerente corporativo Gilson Lima aderiu a uma prática pouco comum nas empresas, mas que já mudou completamente sua disposição e produtividade no trabalho: o cochilo durante o expediente. Pelo menos duas vezes por semana ele sai às 12h30 do escritório, uma companhia de turismo localizada na avenida Paulista, almoça e segue para sua "siesta" de meia hora. "Sinto que consigo render muito mais depois. São poucos minutos, mas que fazem a diferença no meu dia", diz.
A reportagem é de Carolina Cortez e publicada no jornal Valor, 25-04-2013.
O cochilo se tornou fundamental para a rotina do executivo, que viaja muito a trabalho e vive sob fusos horários diferentes, o que geralmente compromete a qualidade do sono à noite. A "siesta", contudo, não tem apenas horário, mas também endereço certo para acontecer: a empresa Cochilo, localizada a poucas quadras de seu trabalho, na rua Augusta.
A ideia do negócio surgiu em 2011, quando o empresário Marcelo Jankavski chegou ao escritório de um cliente para uma reunião, mas soube que deveria esperar, pois os principais executivos estavam atrasados. No fim, aguardou quase duas horas. Durante esse tempo, começou a traçar, junto com sua sócia e esposa Alícia Jankavski, um esboço do que seria a Cochilo, aberta no ano seguinte.
O objetivo é simples: permitir que profissionais tirem uma soneca para recarregar as energias e ganhar mais produtividade no trabalho. Pode ser antes do expediente, por conta de uma noite maldormida, ou depois do almoço, para garantir mais concentração ao longo do dia. Também é possível tirar um cochilo entre uma reunião e outra, ou na chegada do aeroporto quando ainda há tempo até o próximo compromisso.
"Pesquisamos com diversos especialistas sobre qual seria o melhor formato dos leitos, que permitisse ao cliente relaxar rapidamente", diz Alicia, que também visitou com o marido cabines de sono em Londres e Nova York para buscar inspiração. O "cochilódromo" desenhado pelo casal tem quatro cabines individuais, com uma cama, iluminação azul (inspirada na cromoterapia), músicas relaxantes, máscaras de dormir e cobertas. Após um período que pode ser de 15 minutos a uma hora, a cama vibra para acordar o cliente. "A intenção não é deixar a pessoa dormir profundamente, mas permitir que ela descanse por meio de um breve cochilo", explica a empresária.
Hoje, o público que frequenta o local é bem diverso e vai de profissionais que chegam mais cedo ao escritório por conta do rodízio até estudantes que saem do trabalho para a faculdade e precisam descansar por alguns minutos. A Cochilo já firmou convênio com 16 empresas da região como a Caixa Econômica Federal e a Livraria Cultura. Segundo Alícia, a estratégia para o próximo semestre é ampliar as lojas para bairros como Itaim Bibi, Brooklin e Vila Olímpia, onde trabalham muitos executivos paulistas, e no centro, perto da BM&F Bovespa. Há também planos de levar as cabines para outras metrópoles do país.
A empresa Todo!, prestadora de serviços de TI com presença em 13 capitais brasileiras e mais de 2,4 mil funcionários, é uma das companhias que decidiram apostar na "siesta". Cerca de 400 funcionários que atuam na avenida Paulista podem usar as cabines da Cochilo para recarregar as energias. Guilherme Lopes, supervisor de marketing da companhia, afirma que a ideia surgiu quando algumas pessoas do escritório aderiram a essa prática por conta própria e passaram a se sentir mais dispostas no resto do dia. "Resolvemos abrir essa possibilidade para todos os nossos profissionais, pois atuamos em um segmento muito desgastante e estressante. É fundamental estar sempre alerta", diz.
A soneca durante o expediente é, inclusive, endossada por especialistas na ciência do sono. De acordo com o médico Maurício Bragnato, do Hospital Sírio-Libanês, com o ritmo de trabalho bastante acelerado, para os executivos é cada vez mais difícil se desligar dos problemas e descansar tranquilamente. "Dorme-se pouco e com menos qualidade. Um simples cochilo depois do almoço, de no máximo 30 minutos, ajuda a relaxar e a restaurar funções cognitivas fundamentais para a tomada de decisões do dia a dia."
O acúmulo de noites maldormidas afeta o poder de raciocínio, de concentração, o reflexo, a memória e, portanto, a produtividade - sem contar o humor. "Mais de 700 genes respondem à privação do sono, manifestando-se de diversas formas", explica Bragnato. O estresse e a ansiedade, além de doenças como apneia - distúrbio do sono caracterizado pela obstrução das vias respiratórias - são grandes causadores do problema.
Foi o que aconteceu com o empresário Antonio Bernardo de Mendonça, de 71 anos, dono da fabricante de autopeças RTO Retentores. Ele lembra que, há seis anos, seu poder de decisão e até o relacionamento com seus funcionários estavam completamente comprometidos por conta das noites maldormidas. "Não conseguia ter uma noite adequada de descanso e isso atrapalhava meu raciocínio, me deixava nervoso e estressado. Era complicado ter de pedir desculpas a todo mundo, o tempo inteiro", conta.
Em 2007, quando começou a procurar ajuda especializada, descobriu que sofria de apneia. "Algumas vezes fui ao pronto-socorro porque acordava sufocado no meio da noite", afirma. O problema foi resolvido com o uso de um aparelho compressor de ar antes de dormir. "Meu humor, minha disposição para o trabalho e minha produtividade melhoraram muito", diz.
Bragnato, do Hospital Sírio-Libanês, ressalta que a insônia é outro distúrbio que aflige cada vez mais executivos. Segundo ele, o quadro deve ser acompanhado por um médico quando as noites em claro são frequentes e duram mais de sete dias consecutivos.
Praticar a chamada "higiene do sono", no entanto, pode ajudar a melhorar o problema. São procedimentos simples, como fixar um horário para dormir e acordar, comer pouco e não consumir álcool à noite, evitar praticar esportes depois das 20h, não ingerir cafeína em excesso e garantir um ambiente tranquilo e pouco iluminado no quarto. "É preciso respeitar as necessidades do corpo para que ele tenha um bom rendimento ao longo do dia", afirma o médico.
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Cochilo pago pode ajudar a produzir mais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU