14 Março 2013
Não considero que Jorge Bergoglio tenha sido cúmplice da ditadura, mas acredito que lhe faltou coragem para acompanhar a nossa luta pelos direitos humanos nos momentos mais difíceis.
A opinião é do arquiteto argentino Adolfo Pérez Esquivel, prêmio Nobel da Paz (1980), publicado em seu sítio oficial, 14-03-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Celebramos a nomeação do primeiro papa latino-americano na história da Igreja Católica e a sua eleição do esperançador nome Francisco para levar adiante o seu período papal.
Esperamos que ele possa trabalhar pela justiça e paz, para além das pressões e dos interesses das potências mundiais. Esperamos que ele possa deixar de lado a desconfiança vaticana com relação ao protagonismo dos povos na sua libertação. Assim como que também alente as transformações sociais que vêm sendo levadas adiante na América Latina e em outras partes do mundo, de mãos dadas com governos populares que tentam superar a noite do neoliberalismo.
Esperamos que ele tenha a coragem de defender os direitos dos povos frente aos poderosos, sem repetir os graves erros, e também pecados, que a Igreja teve. Durante a última ditadura argentina, os integrantes da Igreja Católica não tiveram atitudes homogêneas. É indiscutível que houve cumplicidades de boa parte da hierarquia eclesial no genocídio perpetrado contra o povo argentino, e embora muitos com "excesso de prudência" tenham feito gestões silenciosas para libertar os perseguidos, foram poucos os pastores quem com coragem e decisão, assumiram a nossa luta pelos direitos humanos contra a ditadura militar. Não considero que Jorge Bergoglio tenha sido cúmplice da ditadura, mas acredito que lhe faltou coragem para acompanhar a nossa luta pelos direitos humanos nos momentos mais difíceis.
Estou viajando para a Itália para celebrar um novo aniversário do martírio de Dom Oscar Arnulfo Romero, um pastor conservador que, diante da repressão em El Salvador, teve o seu caminho de Damasco para o povo e deu a sua vida pela justiça e pela paz. Oxalá também que a opção pelo nome Francisco, um dos santos mais significativos da Igreja, se expresse em testemunhos de opção e defesa dos pobres frente aos poderosos e na defesa do meio ambiente.
Francisco I não herdou um trono imperial, mas sim a humilde cadeira de um pescador. Por isso, esperamos que ele não se esqueça das palavras do bispo mártir argentino, Dom Enrique Angelelli, quando dizia que "devemos manter um ouvido no Evangelho e outro no povo, para saber o que Deus nos diz".
Paz e Bem.
Adolfo Pérez Esquivel
Prêmio Nobel da Paz
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Os desafios do primeiro papa latino-americano. Artigo de Adolfo Pérez Esquivel - Instituto Humanitas Unisinos - IHU