16 Fevereiro 2013
Há quem minimize. E quem prefigure riscos para a Igreja. O que é certo é que a coexistência de dois papas, o a ser eleito e o seu antecessor, pela primeira vez na história recente, ainda vivo, Joseph Ratzinger, coloca algumas interrogações de direito.
A reportagem é de Virginia Piccolillo, publicada no jornal Corriere della Sera, 14-02-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O padre Ottavio De Bertolis, canonista da Pontifícia Universidade Gregoriana, simplifica. "A partir do dia 28 de fevereiro, Joseph Ratzinger não é mais papa. Ponto final. Portanto, não haverá dois papas, mas um". Quais serão os seus direitos e deveres? "O direito canônico se cala sobre isso. A partir da práxis, é difícil tirar alguma coisa, porque ela é antiga demais. Seria preciso um teólogo. Uma coisa é certa: ele continuará sendo bispo. Porque a ordenação é para sempre: o sacerdote permanece como tal mesmo que 'deixe de ser padre'. Mas eu suponho que, renunciando a ser pontífice, Ratzinger também vai perder o poder de governo da Igreja universal, poder estendido também às coisas de fé".
E a infalibilidade?
"A infalibilidade é o papa, como tal, que tem e é exercida só raramente quando se define a matéria de fé, não quando se prega ou se escreve uma encíclica".
Será possível continuar chamando-o de Sua Santidade o papa emérito?
"Sua Santidade é uma expressão de uso humano, não está escrita em parte alguma. A própria palavra papa significa papai. A práxis deverá ser construída". E se ele quiser voltar a intervir? "Não pode. Não é mais papa".
Gaetano Lo Castro, professor de Direito Canônico e Direito Eclesiástico da Universidade La Sapienza, concorda: "É como se estivesse morto. O papa que renuncia não tem mais nenhuma função na Igreja".
Ele tinha o direito de "descer da cruz"?
"É claro. Isso está previsto na norma escrita por Celestino V e incorporada também no Código de Direito Canônico e na Constituição Apostólica do próprio Papa Wojtyla. No artigo 77, diz-se que tudo o que precede e segue à eleição do pontífice deve ser observado integralmente, mesmo que a vacância da Sé tivesse que ocorrer por 'renúncia do Sumo Pontífice'".
E com relação ao depois?
"Não há nada, porque não é mais papa. Ele não pode intervir nem na diocese, nem como papa".
Paradoxalmente, são os leigos que temem mais a situação. Piero Bellini, acadêmico dos Lincei e professor emérito de história do direito canônico, aponta: a questão posta pelo Papa Wojtyla ("Não se desce da Cruz") tem um fundamento. A renúncia está prevista do ponto de vista jurídico, o que nem sempre corresponde ao direito ético.
"É um pouco como para os antigos reis que o eram até a morte. Além disso, o papa está ligado por um vínculo sagrado. Se a Igreja é o Corpo místico de Cristo, a sua cabeça participa dessa mística. E se o papa tem uma vicaria celeste, isto é, um poder que lhe vem de Deus, então esse poder não cessa".
E, ao contrário de um funcionário ou de um administrador de empresa – argumenta – ele tem o dever de continuar exercendo a própria tarefa sobre a qual deve responder a Deus: "Eu sou um contemporâneo do Papa Ratzinger e sei bem que um idoso tem capacidades reduzidas, mas o fato de o Papa Wojtyla ter morrido na linha de fogo deu prestígio à Igreja. Agora, a certeza da sacralidade do papado, confortada pela passagem dos séculos, foi posta em discussão. E pode haver quem discorde. Tudo vai depender da prudência de Ratzinger que deve ser sábio a ponto de evitar atritos. Porque a carga cismática que se põe, em germe, é um risco enorme. Não é um bom sinal que ele permaneça no Vaticano. É um pouco como ter o velho pai em casa com o qual o filho maior de idade tem que se confrontar. Como leigo enraivecido, digo, porém, que não se pode retroceder. Não compartilho com 99% de suas ideias, mas é um grande pensador, e tirar-lhe o título de Sua Santidade seria um insulto".
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Dois pontífices podem conviver? As dúvidas dos juristas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU