15 Dezembro 2012
Hossam Bahgat, um dos mais conhecidos ativistas de direitos humanos do Egito, passou os últimos anos tentando convencer seus amigos de que o maior inimigo da revolução egípcia eram os militares, não os islamitas.
Sua opinião sobre os militares continua a mesma. Mas as recentes ações do presidente Mohamed Mursi confirmaram para ele os temores sobre a inclinação autoritária da Irmandade Muçulmana.
"Os islamitas mostraram que não acreditam na democracia", disse Bahgat em entrevista no seu escritório, no centro do Cairo.
A entrevista é de Marcelo Ninio e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 15-12-2012.
Eis a entrevista.
Os islamitas o surpreenderam?
Desde a queda de Mubarak há uma polarização entre islamitas e aqueles cuja prioridade era evitar a chegada dos islamitas ao poder. Eu achava que seria bom para a transição ter os islamitas no poder, porque isso os integraria ao processo político. E acreditava que havia um bloco reformista na Irmandade Muçulmana, e que governar teria um efeito moderador no grupo. Eu estava errado.
O que mais o incomodou?
É uma longa lista. Começa no ano passado, quando a Irmandade ficou do lado da junta militar e não das forças revolucionárias, incluindo em tempos de massacres nas ruas. Depois, quando conquistou a maioria no Parlamento, a Irmandade monopolizou todas as comissões. Com o decreto do dia 22 eles foram além de um erro político: foi a primeira vez que os islamitas mostraram que não acreditam na democracia. O decreto confirmou os medos dos que estavam obcecados com a ameaça islamita.
Os islamitas dizem que o decreto foi necessário porque as cortes são formadas por juízes do antigo regime.
É uma definição enganosa. Mursi tem poderes legislativos desde agosto, mas não emitiu nenhuma lei para a reforma judiciária. É verdade que a Suprema Corte tem membros apontados por Mubarak, alguns abertamente contra os islamitas, mas não se pode generalizar. O Judiciário era o nosso maior aliado contra Mubarak. Em 2006, Mursi foi preso numa manifestação justamente por defender o Judiciário.
O que acha da Constituição que irá a referendo?
É um retrocesso. O poder garantido aos militares vai muito além de qualquer outra Constituição. Há um artigo explicando as fontes da sharia amplo o suficiente para levar a um caos legal e às mais extremas interpretações em assuntos como violência contra a mulher, casamentos de menores e punições a crimes.
Nada muda para quem era marginalizado antes da revolução.
Veja também: ''As manifestações no Egito? Sinal de democracia'' Entrevista com Samir Khalil Samir, jesuíta
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'Islamitas não acreditam na democracia' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU