19 Outubro 2012
O desaparecimento da geração do Concílio e das duas décadas sucessivas corre o risco de deixar um vazio, se não soubermos difundir uma nova sensibilidade e suscitar um novo protagonismo de cristãos apaixonados pela reforma da Igreja.
A opinião é do teólogo leigo italiano Christian Albini, em artigo publicado no sítio Viandanti, 11-10-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Os 50 anos da abertura do Concílio Vaticano II são, inevitavelmente, um tempo de balanço. Já passamos da atualidade à história. Não uma história morta, mas que incide vivamente sobre o presente.
Os ambientes ultratradicionalistas consideram o Concílio como um erro, um desvio a ser corrigido que provocou a crise da fé, das vocações, da prática religiosa. Uma posição que ignora o fato de que vivemos em um mundo de mudanças aceleradas e que a Igreja Católica sempre mudou de formas, linguagens e viveu um progresso na compreensão da revelação dentro da história. A história da Igreja nos mostra uma relação dialética e fecunda entre continuidade e inovação. Sem o Concílio, a inevitável crise teria sido muito mais profunda e devastadora.
Outro aspecto é a plena aplicação do Vaticano II. Muitos consideram que, nas últimas duas décadas, por parte da hierarquia, prevaleceu uma ação de freio e de resistência.
A conversão é para todos
Está sendo celebrado nestas semanas o Sínodo dos Bispos sobre a nova evangelização. Carlo Maria Martini já disse há muitos anos que evangelizar significa acima de tudo evangelizar a si mesmo. A escuta da Palavra que suscita a fé e produz frutos de conversão (cf. Rm 10, 17) é algo que sempre se deve renovar. Não só em toda geração, mas também nas diversas épocas da vida de cada um. A vida cristã é um recomeçar a acreditar todo dia, já afirmavam os Padres.
O Sínodo, então, é uma grande oportunidade de conversão para os católicos, para se tornarem testemunhas mais críveis. Essa sadia autocrítica também está presente em algumas intervenções destes primeiros dias, como o do arcebispo Rino Fisichella: "Encerramo-nos em nós mesmos, mostramos uma autossuficiência que impede de nos aproximarmos como uma comunidade viva e fecunda que gera vocações, de tanto que burocratizamos a vida de fé e sacramental". O importante é que esse reconhecimento dê início a escolhas consequentes.
A exigência de conversão diz respeito a todos, e eu acredito que a autocrítica também deve ser realizada dentro daquela área católica à qual eu sinto que pertenço, que avalia positivamente o Concílio e deseja uma reforma da Igreja Católica.
O déficit do reformismo católico
No rastro de Rosmini, o Pe. Vinicio Albanesi dedicou um livro às "chagas" da Igreja atual. Não haveria também chagas do catolicismo conciliar? A falta de reformas se deve apenas à "cúria má" que permaneceu imóvel e marginalizou os "bons", ou existe também a responsabilidade que pode ser debitada aos ambientes reformadores? Por honestidade, sinto que tenho que responder que sim. Vou tentar listar aqueles que, a meu ver, foram alguns limites históricos dos reformadores, sem entrar em detalhes e sem fazer processos a ninguém, mas com a intenção de iniciar uma troca positiva, para um salto à frente.
1) Um déficit de comunhão dentro do movimento reformista em termos de fragmentação e de excesso de protagonismo de alguns líderes, razão pela qual houve tantos grupos e grupinhos encerrados em um particularismo excessivo, enquanto do lado de fora havia estímulos demais para a ruptura com os pastores. A liberdade de expressão com relação à hierarquia, a franqueza evangélica, que pode levar também à crítica e à dissidência, pode levar à perda de unidade com a Igreja universal? Nem sempre quem quis uma Igreja dialogante demonstrou-se capaz de diálogo.
2) Um déficit de espiritualidade, lá onde prevaleceu o ativismo e o compromisso de marca política, fazendo passar para o segundo plano a liturgia, a escuta da Palavra e a oração, e fazendo assim desaparecer a soldagem entre ação e contemplação.
3) Um déficit de comunicação, pelo qual nos movemos sobre um plano excessivamente intelectual e elitista. Muitas instâncias reformistas e conciliares permaneceram confinadas em alguns ambientes, mas não foram assimiladas a fundo pelo povo de Deus
A falta de renovação que fez envelhecer, ou até mesmo dissolver, tantas realidades às quais faltou uma troca geracional também se deve a esses três déficits e não só ao ostracismo de certas cúrias.
Anticorpos conciliares
No corpo do catolicismo, parece que estão se redespertando anticorpos conciliares, após um período de ofensiva daqueles que queriam fazer esquecer o Vaticano II. A vontade de Bento XVI de curar a ruptura com os seguidores de Dom Lefebvre e a sua preocupação de não perder, depois da fluidez do período pós-Concílio imediato, alguns elementos da tradição católica foram apresentadas indevidamente como passos nessa direção.
Recentemente, ao invés, o papa reafirmou o Concílio mais de uma vez, em privado (quando escreveu ao atual superior do lefebvrianos que, para serem realmente reintegrados à Igreja, deveriam verdadeiramente aceitar o Vaticano II e o magistério pós-conciliar) e em público, quando, dirigindo-se aos bispos franceses, chamou-o de "sinal de Deus".
O novo prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, cardeal Gerhard Ludwig Müller, por sua vez, nas suas primeiras intervenções, salientou que a fé católica não pode prescindir da aceitação da reforma litúrgica e que a tradição não pode ser reduzida a alguns elementos, ligados a um contexto histórico circunscrito. São intervenções não casuais.
Por uma nova temporada de reformas
Não faltam iniciativas que marcam uma retomada de interesse em torno do Concílio, começando pela assembleia Igreja de todos, Igreja dos pobres (Roma, 16 de setembro). Mas, no catolicismo, permanecem posições profundamente diferentes sobre a interpretação do Vaticano II e sobre a sua aplicação.
Pesam muito aqueles que, embora aceitando-o, quer minimizar o seu porte. É indispensável, então, que o reformismo conciliar saiba ser sujeito ativo na Igreja, indo além dos déficits do passado. O desaparecimento da geração do Concílio e das duas décadas sucessivas corre o risco de deixar um vazio, se não soubermos difundir uma nova sensibilidade e suscitar um novo protagonismo de cristãos apaixonados pela reforma da Igreja.
Uma estrada, a meu ver, poderia ser a de pequenas fraternidades de leigos e padres inseridos na cotidianidade diocesana e paroquial, sem se constituir como movimento ou associação à parte. O que os uniriam seriam momentos de partilha da oração e de escuta da Palavra de Deus, mas também espaços de debate e de reflexão sobre questões teológicas e pastorais dentro da perspectiva conciliar.
Por sua vez, essas pequenas fraternidades poderiam manter uma conexão entre si na forma leve da rede em que nos relacionamos entre pares na liberdade, sem líderes carismáticos e palavras de ordem. Seria uma alternativa significativa à modalidade dos movimentos para formar cristãos conscientes, de autoridade e maduros na fé.
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Por um reformismo conciliar ativo na Igreja. Artigo de Christian Albini - Instituto Humanitas Unisinos - IHU