17 Outubro 2012
Aqui, explicam a você, temem-se os incêndios, nada mais. Quanto ao risco ao qual o visitante estaria mais espontaneamente exposto, olham para você com um quê de compaixão: “ele simplesmente não existe”, diz Abraham “Abe” Van Luyk, um dos diretores da instalação. No entanto, ali é o ponto mais próximo dos resíduos nucleares cuja nocividade, se eles escapassem dos tonéis nos quais foram encerrados, seria imensurável. Mas não, o perigo está só na imaginação. Além disso, vejam só: nos 16 quilômetros de amplas galerias perfuradas na rocha salina, os funcionários andam em mangas de camisa.
A reportagem foi publicada no jornal Le Monde e reproduzida pelo Portal Uol, 16-10-2012.
Estamos no coração do WIPP, sigla em inglês para Usina Piloto de Isolamento de Resíduos. Situada perto da cidade de Carlsbad, no Novo México, ela constitui o único ponto em funcionamento no mundo onde são enterrados resíduos nucleares. Estes provêm somente da produção militar (pesquisa, fabricação e desmantelamento de bombas atômicas). Todos os resíduos de origem civil permanecem armazenados na superfície.
A perfuração da WIPP, a 140 quilômetros do local onde Washington realizou em julho de 1945 as primeiras explosões nucleares experimentais, teve início em 1982. O soterramento, em 1989. O primeiro contêiner foi incrustado na rocha salina no dia 26 de março de 1999. Desde então, os 4% dos resíduos mais radioativos que chegam aqui e cuja duração de nocividade ultrapassa os 300 anos, são inseridos no sal em tanques herméticos, ao longo das galerias, um a cada vinte metros. Os outros, cuja radioatividade terá regredido ao final de cem anos, são armazenados em amplas salas perfuradas na rocha.
Todos eles serão “agarrados” pelo sal, que os comprimirá naturalmente em um período que vai de trezentos até mil anos. Mas antes de cem anos, garantem, praticamente não se encontrará mais nenhum vestígio, pois eles terão sido incorporados ao veio de sal.
Em toda parte, as medidas de segurança são aparentes, o mínimo movimento suspeito de um estrato rochoso é examinado. A cada três anos, é realizada uma restauração geral dos corredores, especialmente para limpar o pó de silicatos. Em 2013, um primeiro teste visará perfurar a rocha em torno de um tanque para estudar como a pressão do sal sobre um dos primeiros tonéis armazenados se deu.
A WIPP, que responde ao Ministério Americano de Energia (DoE), emprega 1.100 pessoas, sendo 65 em Carlsbad, e se encontra situada perto de um lago salgado cujas reservas de potássio são exploradas, e de uma floresta de perfurações de petróleo e de gás incluindo poços por fratura hidráulica para obtenção do gás de xisto.
A escolha do local, diz Abe, se deve “claramente à vantagem singular das camadas de sal para enterrar os resíduos”. Essa região apache “ideal do ponto de vista geológico” também está no centro de um triângulo semidesértico perto do Texas e do México, longe de qualquer grande cidade.
Aqui, os primeiros protestos, ambientais ou políticos – houve quem previsse uma imagem degradada do Novo México como “Estado-lixeira” – parecem amplamente descartados. “Quando as pessoas entenderam que com a WIPP estávamos limpando Los Alamos [local dos primeiros testes nucleares], elas mudaram,” diz Abe. “Se não se veem mais os resíduos, o medo se dissipa”.
Levados por caminhões de todo o território, os resíduos enterrados são chamados de “transuranianos”, ou TRU, menos radioativos que os de “alta atividade”, que permanecem armazenados em quatro pontos de fabricação de bombas nucleares. Dois comboios chegam diariamente a Carlsbad, cada um com dois ou três contêineres. Uma bateria de testes precede o soterramento: em mais de vinte anos, somente dois tonéis, após a detecção de líquido, foram devolvidos ao Exército. A fase final do tratamento é inteiramente robotizada, até o envio “ao sal”.
Pode a WIPP ser a primeira de muitas? A futura gestão das centenas de milhares de toneladas de combustíveis nucleares usados no mundo é alvo de intensos debates. Em janeiro, nos Estados Unidos, uma comissão pública (chamada Blue Ribbon) propôs, pela primeira vez, “desenvolver o quanto antes um ou vários locais de armazenagem geológica”, além do WIPP.
De 30 de setembro até 3 de outubro, uma conferência internacional em Toronto foi dedicada ao tema do soterramento de resíduos radioativos em profundezas, cuja periculosidade persistirá por milhares de anos, segundo alguns. John Heaton estava lá. Esse veterano eleito para a Câmara do Novo México, que se tornou coordenador de desenvolvimento da energia em Carlsbad – enfim, o lobista da usina em Washington – enumera as “vantagens” do soterramento: sua técnica, que ele diz estar dominada; seu custo, considerado bem inferior ao do armazenamento no solo; e, por fim, a urgência. “Destruir os resíduos fora da biosfera é imensamente mais seguro que mantê-los na superfície”, ele ressalta.
Os riscos sísmicos? Van Luyk os despreza com um gesto: “Somente o erro humano é impossível de se evitar em 100%. A geologia é mais segura que a sociedade. Essa formação geológica, com 250 milhões de anos, é elástica como geleia.” Uma sondagem horizontal nos arredores que “furaria” a rocha contaminada? Nada a temer, ele explica, os prospectores de gás perfuram a uma profundidade três vezes maior...
Resta o futuro – e a memória. Como evitar o risco para as gerações futuras em períodos excepcionalmente longos? Em Toronto, os representantes do WIPP lançaram uma ideia. Uma vez fechada, a usina seria enterrada sob um “dólmen” visível de longe, cercada de 6 perímetros de informativos. A começar por 32 grandes totens com o famoso rosto d’”O Grito” de Edvard Munch.
Uma zona de exclusão de 41 quilômetros quadrados, concebida para durar 10 mil anos e dispondo de inúmeros marcadores de superfície – com mensagens gravadas em sete idiomas, entre eles o navajo – alertaria o camarada desavisado ou o prospector lunático que tivesse a ideia de perfurar esse local. O problema é que até hoje não existe nenhum símbolo universal para o risco nuclear.
No dia 1º de agosto, um casal de velhos ativistas ambientalistas conseguiu passar por todas as barreiras de segurança e andaram pelas instalações da usina de bombas atômicas de Oak Ridge, no Tennessee, que envia seus resíduos à WIPP. Desde então, nos Estados Unidos, a “consciência securitária” aumentou. “Ah”, zomba Abe Van Luyk, “esses armazenamentos de superfície decididamente não são seguros!” Mas se juntarmos os resíduos civis aos resíduos militares, “isso levará décadas”, observa John Heaton. “Certamente será necessário abrir novos pontos de enterramento”.
Enquanto isso, é o seu que está em funcionamento: então, ele briga corajosamente em Washington por sua ampliação. Um compartimento já foi providenciado na WIPP para receber futuros resíduos de alta atividade, os mais radioativos.
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EUA enterram no subsolo do Novo México resíduos radioativos do Exército - Instituto Humanitas Unisinos - IHU