27 Julho 2012
A Bíblia não fala em uma só voz sobre quase nenhum tema sexual, embora os princípios gerais do amor, da justiça e da "abundância da vida" continuem se destacando. Para além disso, é uma questão toda em aberto.
A análise é da teóloga feminista norte-americana Mary E. Hunt, codiretora da Women's Alliance for Theology, Ethics and Ritual (WATER), de Silver Spring, Maryland, nos EUA. O artigo foi publicado no sítio do jornal National Catholic Reporter, 18-07-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Os biblistas agressivos, que se apoiam no texto para os seus argumentos, têm uma tarefa difícil. Sobre o casamento e o divórcio, por exemplo, Marcos e Lucas não oferecem nenhuma recomendação sobre quem deve casar, enquanto Mateus diz que nem todos podem ser um "eunuco pelo reino dos céus". Eles concordam que o segundo casamento é adultério, mas Mateus se destaca pelo seu apoio ao divórcio se a esposa for sexualmente imoral. E assim por diante, com uma passagem contradizendo a outra, do Gênesis até o fim. Quem sabia disso?
Jennifer Wright Knust, uma pastora batistas norte-americana e professora de religião da Boston University, conta tudo em seu trabalho escrito com base em estudos bíblicos contemporâneos. É uma ampla varredura pelo texto com foco nas questões mais centrais sobre os corpos e sobre o que fazemos com eles. Ela argumenta que a Bíblia não fala em uma só voz sobre quase nenhum tema sexual, embora os princípios gerais do amor, da justiça e da "abundância da vida" continuem se destacando. Para além disso, é uma questão toda em aberto.
Ela "convida os leitores a encontrar a plena complexidade do testemunho bíblico, levando em conta tanto a diversidade quanto a peculiaridade da Bíblia". Se você não gosta da abordagem às vezes severa de Paulo, jogue suas mãos para o céu pelo Cântico dos Cânticos por algumas deliciosas diretivas sobre como dar prazer a um parceiro. Ora, esse é um livro bíblico que vale a pena ser lido se você for maior de 18 anos!
A Bíblia desponta como um volume bastante confuso que precisa de um editor. Mas eu duvido que a direita religiosa, a cuja retórica esse livro parece tencionado a ser um corretivo, irá comprar esse argumento.
Realmente, há algo para todos. Que diversão há quando você quer apresentar um argumento a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo ou contra o sexismo? Muita, como se poderá ver, se você perceber que ninguém pode argumentar pelo lado oposto da moeda. Mas a Bíblia é um campo disputado, cada linha de cada página, em disputas que se desdobram na cabine eleitoral e no quarto.
As contradições bíblicas dão lugar a esquisitos companheiros de cama. Tomemos a imagem nupcial de Deus se casando com a "sua" esposa, Israel, no Cântico dos Cânticos. Núpcias em toda parte: a noiva e o noivo, a Igreja e Jesus, Israel e Deus. Knust escreve que a "interpretação alegórica desliza ainda mais pela ladeira escorregadia dos papéis de gênero dos Cânticos, perturbando a noção de que deseja quem".
Imaginemos Moisés, Abraão e companhia alinhados como as futuras esposas de Deus. A fluidez de gênero contemporânea vem à tona borbulhando já que homens se casam com um Deus masculino, ou talvez já que o casamento homossexual seja realmente uma ideia muito antiga. Faça a sua escolha. A Igreja Católica Romana baseia sua proibição à ordenação de mulheres ao sacerdócio sobre a mesma imagem nupcial, um fundamento muito instável.
Knust conclui com um capítulo sobre tudo o que você queria saber sobre o prepúcio sagrado de Jesus, conjectura sobre a história menstrual de Maria e outros assuntos tão delicados quanto esses.
Seu argumento, embora sutil, parece ser o quão longe nós chegamos de uma época em que a biologia governava até um tempo em que os símbolos são tudo. De acordo.
Eu senti falta de intuições bíblicas feministas e pós-coloniais mais explícitas. Eu me perguntava por que, se realmente há temas consistentes de amor e de justiça na Bíblia, eles não receberam uma atenção maior. Mas eu apreciei essa visão geral desse complicado livro que continua sendo lido e usado em todo o mundo, para melhor ou para pior, na riqueza ou na pobreza.
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Sexo? A Bíblia tem algo para todos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU