19 Julho 2012
"Um dos maiores erros do Vaticano tem sido o de tentar evitar o debate teológico sério, ameaçando e, em alguns casos, aplicando sanções contra aqueles que questionam a linha oficial. Se isso sinaliza que o arcebispo Müller acredita que a resposta certa a um mau argumento é um argumento melhor, em vez de disciplinar aqueles que o apresentaram, então essa é uma boa notícia", afirma o editorial da revista católica britânica The Tablet, 07-07-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
O Papa Bento XVI nomeou um homem muito parecido consigo mesmo para a posição-chave do Vaticano que ele ocupou de 1981 a 2005, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. O arcebispo Gerhard Ludwig Müller, bispo de Regensburg, na Baviera, desde 2002, é um prolífico teólogo e exemplar da ortodoxia conservadora. Embora existam similaridades com o seu estreito amigo, o papa, também existem diferenças significativas.
Ele também é um grande amigo, por exemplo, de um dos principais teólogos da libertação, o peruano dominicano Gustavo Gutiérrez. Em 2004, eles publicaram um livro juntos sobre o assunto, An der Seite der Armen: Theologie der Befreiung ("Ao lado dos pobres: Teologia da Libertação"). Como cardeal, o Papa Bento XVI havia presidido pessoalmente o severo repúdio do Vaticano à Teologia da Libertação, para o desânimo do professor Gutiérrez. Uma revisita aos temas de uma forma mais positiva seria oportuna – e um ato de justiça pelos milhões de oprimidos, para os quais a teologia da libertação oferecia uma centelha de esperança.
O arcebispo Müller também não compartilha o compromisso do papa atual com a reconciliação com os lefebvrianos. Ele repetidamente tem atacado as ordenações dos novos padres. De fato, a Fraternidade São Pio X já condenou a sua nomeação, alegando que ele supostamente possui pontos de vista não ortodoxos sobre a virgindade perpétua da Virgem Maria. Claramente, não há nada de amor perdido entre os dois.
Com o ex-prefeito, o cardeal norte-americano William Levada, a Congregação para a Doutrina da Fé, às vezes, parece ter perdido o seu caminho, desempenhando sem imaginação um papel disciplinar puramente reativo com relação aos padres que se desviaram da estreita linha doutrinal que a Congregação prefere. Isso teve um efeito paralisante sobre o trabalho dos teólogos, assim como os deixou incertos quanto a que questões eles ainda estavam autorizados a discutir sem comprometer as suas carreiras e as suas reputações.
O arcebispo Müller está claramente preparado para pensar por si mesmo e deve deixar que o seu próprio exemplo seja seguido. Talvez, ele foi mal interpretado por ter escrito um artigo teológico contra a ordenação de mulheres, pois, embora o tenha identificado como conservador, isso também mostrou que ele pensa que o argumento teológico sobre a questão era legítimo.
Um dos maiores erros do Vaticano tem sido o de tentar evitar o debate teológico sério, ameaçando e, em alguns casos, aplicando sanções contra aqueles que questionam a linha oficial. Se isso sinaliza que o arcebispo Müller acredita que a resposta certa a um mau argumento é um argumento melhor, em vez de disciplinar aqueles que o apresentaram, então essa é uma boa notícia.
A Congregação para a Doutrina da Fé é notória entre os teólogos, particularmente aqueles que são ordenados ou que ocupam cargos em instituições acadêmicas católicas, porque ela manifestamente não segue os princípios da justiça natural quando investiga as denúncias. Se deve haver confiança de que as suas decisões são as corretas, a justiça deve ser feita e ser vista sendo feita.
Muitos desses processos acabam em recriminações e escândalos, com os condenados reclamando que foram mal interpretados ou deturpados e que não lhes foi permitido responder ou apelar. Uma revisão completa dos processos da Congregação para a Doutrina da Fe está atrasada, e se isso significa que o novo prefeito tem que assumir uma linha diferente dos seus antecessores isso pode ser, de fato, o que é exigido pelo bem da Igreja.
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