11 Junho 2012
Titular da cadeira de Economia Política da Universidade de Bologna e assessor pessoal do Papa Bento XVI em Economia Social, o italiano Stefano Zamagni foi um dos convidados do 2º Fórum ADCE para Sustentabilidade, em Porto Alegre. Nascido em Rimini, em 1943, ele colaborou com o Papa na elaboração da encíclica Caritas in veritate. Também integra a New York Academy of Sciences e preside a Agência Para o Terceiro Setor italiana.
A entrevista é de Carlos Guilherme Ferreira e publicada pelo jornal Zero Hora, 11-06-2012.
Eis a entrevista.
O que podemos esperar da Rio+20 em termos de acordos internacionais? Existe um ceticismo global quanto ao sucesso da conferência.
Não espero muito da Rio+20. Primeiro, porque a conferência não foi devidamente preparada nos últimos anos. A crise financeira transferiu – e ainda transfere – recursos e atenção das questões ambientais para crescimento e estabilidade. Segundo: ainda não há acordo sobre a verdadeira natureza das mudanças climáticas, que é um problema global. Terceiro: a abordagem adotada neste tipo de conferência – um exemplo é a barganha – é incorreta.
Uma economia em moldes verdes pode reduzir a pobreza mundial?
Ela pode certamente contribuir para uma redução mundial absoluta e relativa, mas sob uma condição: que não seja considerada à parte, como um setor para ser simplesmente adicionado ao restante da economia. Em outras palavras, para a economia verde dar certo é preciso haver mudança no modelo de crescimento. A direção para a qual irá é composta de um cesto de bens e serviços para serem produzidos e consumidos: menos bens materiais, mais não-materiais.
Podemos esperar novidades da Igreja Católica quanto ao desenvolvimento medido por indicadores sociais, como saúde e felicidade, em vez de Produto Interno Bruto (PIB)?
A Doutrina Social da Igreja sempre insistiu na complementaridade irredutível entre as três dimensões do desenvolvimento integral humano: material, sócio-relacional e espiritual. A Igreja não pretende abrir mão do desenvolvimento (medido) via PIB, mas alcançar um equilíbrio dinâmico entre PIB e indicadores como bem-estar, tais como a distribuição justa de renda, índice de felicidade, grau de participação democrática e solidariedade intergeneracional. Como Platão nos lembrou em seu Fedro: “O sulco será reto se dois cavalos arrastarem o arado na mesma velocidade”.
Como a crise econômica europeia afeta os planos verdes das grandes companhias? Elas ainda veem questões ambientais como secundárias?
Infelizmente, a União Europeia está bloqueada por uma crise de lideranças que é muito mais séria do que a financeira. Após a Segunda Guerra Mundial, a perspectiva econômica estava pior do que a atual. Mas naqueles dias havia líderes como De Gasperi, Adenauer, Schuman e outros. E hoje não há ninguém dessa estatura. Nesse sentido, o apólogo de Soeren Kierkegaard (filósofo e teólogo dinamarquês) pode ser que o que é comunicado pelo microfone do capitão não é mais a rota, e sim o que comeremos amanhã. O prato é a monetarização da economia, e sua voz obviamente não está direcionada a questões ambientais.
É correto afirmar que a crise econômica pode ser uma oportunidade de desenvolvimento para países como Brasil, Rússia, Índia e China (BRIC)?
Os países do BRIC estão claramente em uma posição para aproveitar os benefícios da crise. A longo prazo, o caminho de desenvolvimento desses países será danificado por um desaparecimento do mundo Ocidental, tanto por razões econômicas quanto culturais. Uma estratégia de alianças baseada no princípio da vulnerabilidade mútua é a saída a ser perseguida. O lógica do Contrato Social não é mais suficiente. O desafio é conquistar uma unidade que não sacrifique a diversidade e uma multiplicidade que não gere conflitos irreconciliáveis.
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“A Rio+20 não foi devidamente preparada”. Entrevista com Stefano Zamagni - Instituto Humanitas Unisinos - IHU