"Não vou catar comida do lixo". Foi com essas frases que o aposentado grego concluiu um bilhete que deixou antes de se suicidar, há dois dias, em plena praça Syntagma, às portas do Parlamento grego. A morte voltou a agitar a Grécia, levando manifestantes nas últimas duas noites para as ruas.

O incidente escancarou o desespero de milhares de pessoas diante da política de austeridade, a exato um mês antes das eleições. Mas longe de ser um fenômeno isolado, o suicídio do aposentado grego é apenas mais um numa longa lista de pessoas que deram fim às suas vidas nos últimos meses.

A reportagem é de Jamil Chade e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 06-04-2012.

Dados oficiais do governo grego apontam que os suicídios aumentaram em 40% entre 2010 e 2011. Para a ONG Klimaka, que se ocupa de dar assistência aos indigentes de Atenas, a realidade é que o número dobrou. Na Itália, a imprensa local registrou já cinco suicídios em apenas duas semanas, todos ligados a problemas econômicos.

Com 77 anos, o aposentado Dimitris Christoulas declarou na nota que o "governo de ocupação" havia aniquilado sua pensão e o deixado na pobreza. "Minha habilidade para sobreviver foi borrada", escreveu o ex-farmacêutico, comparando o atual governo ao que foi implementado pelos nazistas em 1941.

Reação

"Dado que tenho já uma idade que não me permite recorrer à força - e a fé que se um grego agarrasse uma Kaláshnikov (uma arma), eu seria o segundo em faze-lo -_, não encontro outra solução senão um fim digno e antes que eu tenha de ir aos lixões em busca de alimentos", escreveu, pedindo que a "juventude sem futuro" promova uma reação.

O episódio se transformou em um apelo de vários grupos para que o governo considere o impacto dos cortes na população, que inclui a redução de até 40% em salários e aposentadorias. Na noite de quarta-feira, a violência eclodiu nas ruas próximas ao Parlamento.

Ontem, centenas de pessoas deixaram flores no local da morte e a polícia passou a blindar as áreas próximas ao edifício do Poder Legislativo. Mas novos enfrentamentos foram registrados.

Os protestos foram convocados por redes sociais pela Internet, enquanto cidadãos de Atenas deixaram bilhetes no local do suicídio. "Isso foi um assassinato", dizia um deles.