24 Fevereiro 2012
O "não" da Igreja às deportações de migrantes sempre uniu a hierarquia eclesiástica e as associações civis. Não é de se admirar, portanto, que agora os jesuítas e a comunidade de Santo Egídio se alegram com a sentença de Estrasburgo.
A nota é de Giacomo Galeazzi, publicada em seu blog, Oltretevere, 23-02-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Não podemos deixar de expressar uma profunda satisfação pelo reconhecimento da ilegitimidade de uma prática condenada por unanimidade pelas principais ONGs italianas e europeias, e que já custou muitas vidas humanas". O padre Giovanni La Manna, presidente do Centro Astalli, patrocinado pela Companhia de Jesus no âmbito do seu Secretariado para os Refugiados, comenta dessa forma a condenação europeia às deportações.
"Esperamos – afirma o jesuíta – que essa sentença finalmente ponha fim a uma gestão dos controles das fronteiras que pisoteia sistematicamente o direito de asilo e que induz o governo italiano a um maior senso de responsabilidade também na estipulação dos novos acordos com a Líbia".
Na mesma linha, a comunidade de Santo Egídio: "Com a sentença proferida sobre o caso Hirsi e outros contra a Itália, o juiz de Estrasburgo condenou a prática das deportações por mar, repetidamente realizados por meios navais italianos, sem dar aos migrantes, devolvidos contra a sua vontade para a costa líbia, a oportunidade de pedir asilo ou outra forma de proteção internacional", destaca a "ONU do Trastevere".
Uma decisão histórica, que também pode contribuir para reduzir o número das vítimas no Mediterrâneo: pelo menos 1.500 só em 2011. Os fatos aos quais a sentença se refere estão ligados à conhecida decisão italiana de reacompanhar a Trípoli, em barcos italianos, cerca de 200 somalis e eritreus (incluindo crianças e mulheres grávidas), contra a sua vontade, sem que fossem antes identificados, ouvidos nem informados preventivamente sobre o seu destino.
Desse modo, os migrantes interceptados em águas internacionais no dia 6 de maio de 2009, a 35 milhas ao sul de Lampedusa, não tiveram nenhuma possibilidade de apresentar um pedido de proteção internacional na Itália. Muitos dos deportados, depois, sofreram maus tratos e violências em seu retorno à Líbia. Outros morreram tentando chegar novamente à costa italiana sucessivamente, segundo depoimentos de companheiros de viagem, familiares e amigos que por sorte chegaram à Itália e que a Comunidade de Santo Egídio encontrou e acolheu.
Entre aqueles que se salvaram, há também aqueles que, depois de terem sido rejeitados, novamente arriscaram a vida pelo mar, conseguindo finalmente chegar à Itália e obtendo o status de refugiado. A Comunidade de Santo Egídio tinha sugerido fortemente ao governo italiano que não se implementasse uma política de rejeição indiscriminada, que ia contra os padrões europeus que vetam, segundo o princípio de non-refoulement, a expulsão e o repatriamento a um país onde há o risco de ser submetido a torturas ou a outros tratamentos desumanos ou degradantes; a expulsão coletiva de estrangeiros sancionada no artigo 4º do Protocolo nº 4 da Convenção Europeia dos Direitos do Humanos (CEDH) antes de serem identificados e levados às autoridades líbias (que não tinham aderido às convenções internacionais a respeito, como se sabe); a expulsão de pessoas sem que estas tenham a possibilidade, antes, de solicitar a proteção na Itália.
Inúmeros recursos foram acolhidos, e muitos dos deportados, depois de uma segunda viagem, viram seu pedido de asilo acolhido por intervenção da Acnur. Depois, muitos fugiram para a Tunísia após o início do conflito na Líbia, outros foram objeto de represálias por parte das milícias fieis ao regime e por parte dos insurgentes. Outros tiveram que se esconder no deserto sem água nem comida.
Um dos recorrentes – lembra a União Forense para a Proteção dos Direitos Humanos –, E.B., conseguiu chegar posteriormente à Itália e foi mantido durante meses na CARA [Centro de Acolhida dos Requerentes de Asilo, na sigla em italiano] de Crotone à espera de uma decisão sobre o pedido de asilo. No dia 21 de junho de 2011, foi-lhe reconhecido o status de refugiado pelas autoridades italianas depois de uma primeira recusa.
"Não estamos felizes com a condenação que afeta o nosso país, mesmo que fosse previsível e mesmo que a Comunidade de Santo Egídio houvesse convidado o governo italiano a reconsiderar o procedimento", explicam na multinacional católica da solidariedade. "A decisão do Tribunal Europeu favorece definitivamente, esperamos, uma política sábia e respeitosa aos direitos humanos perante as grandes migrações mundiais. É uma oportunidade, de forma simples e transparente, para relançar uma iniciativa europeia, concordada, para enfrentar o problema das migrações para a Europa".
"Estamos contentes com essa sentença, sobretudo porque ela ajuda a construir efetivamente uma Europa social, uma Europa em cujo centro esteja a proteção dos direitos humanos, especialmente dos mais fracos". Foi assim que o Mons. Giancarlo Perego, diretor da Fundação Migrantes da CEI [Conferência dos Bispos da Itália], comentou à Rádio do Vaticano a sentença do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos de Estrasburgo, que condenou a Itália pelas rejeições de imigrantes para a Líbia. "É a oportunidade – acrescentou – para lembrar que essas rejeições geraram centenas de mortes nestes dois anos e, portanto, é uma oportunidade a mais para lembrar o drama da morte relacionada também com as rejeições e as expulsões".
"Ainda no tempo em que, em 2009, haviam acontecido essas e outras rejeições – lembra Dom Perego –, juntamente com outras organizações, havíamos solicitado esse tipo de intervenção, condenando também naquela ocasião o que estava acontecendo e que, depois, afetou mais de mil pessoas. Portanto, saudamos essa sentença como uma oportunidade e um instrumento a mais para reafirmar o que eu já afirmava a Convenção Europeia dos Direitos Humanos sobre a questão da proteção internacional".
Para o diretor da Migrantes, a sentença é um importante lembrete para a política italiana e para a União Europeia em geral. "Ela também vai no sentido de construir efetivamente – sublinha – um mar Mediterrâneo como um mar comum em cujo centro esteja a proteção dos direitos, antes das fronteiras, e, assim, com essa atenção, também construir, em momentos de emergência que ainda são de grande atualidade, formas e canais humanitários para proteger os refugiados que provêm não só do Norte da África, mas também do Chifre da África e da África Central".
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Estrasburgo: uma decisão em prol dos migrantes. O apoio dos jesuítas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU