16 Fevereiro 2012
A investigação da Gendarmeria: descobertos os escritórios de onde vazaram as cartas secretas. Sanções à vista para os responsáveis.
A reportagem é de Marco Ansaldo, publicada no jornal La Repubblica, 15-02-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A primeira letra, em que Dom Viganò pedia para ficar em seu posto para combater a "corrupção e a prevaricação" saiu da II Seção da Secretaria de Estado do Vaticano. Escritório responsável pelas Relações com os Estados Estrangeiros.
A segunda, ao contrário, o memorando "muito confidencial" sobre o IOR [o chamado Banco do Vaticano], na realidade, uma nota de discussão sobre os pedidos provenientes da magistratura italiana, foi extraída dos arquivos da I Seção. Escritório para os Assuntos Gerais Internos.
Também foi apurado quem teria divulgado a terceira carta, que partira de um amigo alemão do cardeal Castrillón, e que foi enviada por Sua Eminência ao secretário de Estado, Tarcisio Bertone, relatando a viagem do colega purpurado Romeo à China. E cujos conteúdos sobre um fantasmagórico atentado contra Ratzinger já é motivo de deboche nas Salas Secretas.
O cerco se apertou no Vaticano em torno de quem passou as cartas para a imprensa. Primeiro, foram controlados os originais dos documentos e depois se remontou a quem os tratou. Nestes dias, o comandante Domenico Giani, diretor dos Serviços de Segurança e do corpo da Gendarmeria Vaticana, está no México e em Cuba para as inspeções em vista da viagem do papa no fim de março. Mas seus homens vasculharam as cartas, puseram os olhos sobre os suspeitos e, finalmente, identificaram os eclesiásticos responsáveis por ter divulgado dos documentos.
Assim aconteceu no ano passado, quando se descobriu que uma carta de um misterioso "corvo" endereçada ao cardeal Bertone foi enviada por um idoso monsenhor da Campania. "Não é uma operação muito difícil – explica uma fonte interna –, porque não há muitas pessoas que têm acesso a esse tipo de arquivos. Agora, eu não gostaria de estar na sua pele".
Sanções administrativas, denúncias penais (pela revelação de segredos oficiais e difamação) e a possibilidade de que alguém, de repente, desapareça e seja transferido para outro lugar pelas duas seções centrais da Secretaria de Estado, localizadas na 1ª e na 2ª Loggia do Palácio Apostólico, protegido pelos Guardas Suíços. Esse é o cenário que está sendo preparado.
A caça aos "furões" do Vatileaks, o caso que nasceu com a divulgação das cartas vaticanas na imprensa, está em pleno desenvolvimento. Por trás dos Muros Leoninos, os venenos continuam florescendo, enquanto se prevê uma semana densa de reuniões importantes, entre política e espiritualidade. Nesta quinta-feira, para o aniversário dos Pactos Lateranenses, os cardeais se reunirão na Embaixada da Itália junto à Santa Sé, pela primeira vez, com os ministros do governo Monti. No sábado, será realizado o consistório, a reunião do Sacro Colégio, com a criação, por parte de Bento XVI, de 22 novos cardeais.
Mas o cheiro dos venenos ainda pairava no ar na noite desta quarta-feira, no Conselho dos Cardeais, reunidos sobre o estado das finanças: Bertone, Vallini, Bertello, Calcagno, Versaldi. À margem da mesa convocada para analisar a saúde financeira da Santa Sé, vozes críticas contra as últimas quedas de imagem da Igreja diante da opinião pública.
Uma trama insistente afirma que, por trás do motim de monsenhores que divulgam as cartas secretas, não há apenas uma questão de carreirismo interno ou de disputas anti-Bertone. Mas sim que está consumindo, anos depois, a sutil vingança do ex-secretário de Estado, Angelo Sodano. Bertone, que uma vez assumiu o seu lugar como braço direito do papa, teria mandado para longe alguns homens de confiança do cardeal-decano. E agora que ele está para chegar ao fim dos 78 anos (idade em que Sodano renunciou do seu cargo), a operação teria começado.
Venenos que custam a diluir, e, ao contrário, até se espalham ainda mais. Como no caso do contra-ataque do porta-voz da Sala de Imprensa da Santa Sé, padre Federico Lombardi. Autor de uma nota impecável em vários aspectos ("o governo norte-americano teve o Wikileaks, o Vaticano tem agora os seus leaks, os seus vazamentos de documentos que tendem a criar confusão"). Mas de tons insolitamente duros, bem captados por alguns observadores, que ficaram perplexos quando o porta-voz do papa disse que a "leitura em chave de lutas de poder internas depende em grande parte da rudeza moral de quem a provoca e de quem a faz".
Porém, a circulação de documentos secretos expôs com clareza (veja-se o contraste Castrillón-Romeo) como, justamente entre os purpurados, circulam venenos e atuam lobbies. Com o olhar de alguns dirigido para um futuro conclave. "Este manso pastor [Bento XVI] – advertia nesta quarta-feira o editorial do L'Osservatore Romano – não recua diante dos lobos", enquanto, "noite adentro, o inimigo semeia cizânia no campo". Uma batalha que ainda deve ser observada, e escrita, entre o pastor e os lobos.
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Vazamento de notícias do Vaticano: identificada a origem - Instituto Humanitas Unisinos - IHU