13 Janeiro 2012
"O Brasil é um país que se formou recebendo imigrantes que vieram fugindo da pobreza de guerras, em busca de uma vida melhor. Foi assim que se constituiu como uma nação culturalmente diversificada, uma das maiores riquezas de nosso tecido econômico e social. Para confirmar sua vocação, precisa, como no passado, abrir as suas portas", escreve Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 13-01-2012.
"Vemos, agora, que o governo abriu uma pequena fresta: os cerca de 4.000 haitianos que entraram no Brasil por vias ilegais, em rotas cheias de perigos, poderão ficar", constata e pergunta: "Mas por que não acolhemos mais?"
Eis o artigo.
Há dois anos, um fortíssimo terremoto atingia o Haiti, o país mais pobre das Américas, lançando seus mais de 9 milhões de habitantes, cuja maioria já vivia em condição de miséria, em uma catástrofe gigantesca. A capital, Porto Príncipe, foi completamente destruída. Foram cerca de 200 mil mortos em razão do tremor de terra. E o número de desabrigados subiu à casa de milhões.
No calor dos terríveis acontecimentos, a comunidade internacional se mobilizou para ajudar. O mundo se compadeceu do país caribenho, enquanto a ONU contabilizava os enormes prejuízos e classificava a tragédia como uma das maiores da história, prevendo uma difícil recuperação.
O Brasil, que está presente no país desde 2004 com um grande contingente militar para participar das forças de paz da ONU, viu-se definitivamente ligado ao Haiti.
O terremoto provocou a morte da médica e missionária católica Zilda Arns, a grande responsável pelo trabalho bem-sucedido da Pastoral da Criança. Ela se encontrava no país para levar a experiência brasileira no combate à mortalidade infantil. E as tropas brasileiras, que também sofreram baixas, logo se manifestaram para socorrer os haitianos. O governo brasileiro anunciou a doação de milhões de dólares.
Naqueles dias, o economista Irineu Evangelista Carvalho Filho, ph.D. pelo MIT, escreveu sugerindo que, diante de tal crise humanitária, o governo brasileiro acolhesse ao menos 100 mil haitianos. Observou que seria uma gota no oceano da nossa população. Propôs um grande programa de acolhimento, que daria exemplo ao mundo.
O Brasil é um país que se formou recebendo imigrantes que vieram fugindo da pobreza de guerras, em busca de uma vida melhor. Foi assim que se constituiu como uma nação culturalmente diversificada, uma das maiores riquezas de nosso tecido econômico e social. Para confirmar sua vocação, precisa, como no passado, abrir as suas portas.
Os imigrantes haitianos, aliás, se enquadram em um tipo de refugiado que tende a se tornar cada vez mais comum: o que foge de catástrofes da natureza. Eles, de um grande terremoto que potencializou a miséria. E muitos outros, de enchentes e secas, em meio às mudanças climáticas, que também têm nos atingido e transformado milhares de brasileiros em refugiados dentro do próprio país.
Vemos, agora, que o governo abriu uma pequena fresta: os cerca de 4.000 haitianos que entraram no Brasil por vias ilegais, em rotas cheias de perigos, poderão ficar. Mas por que não acolhemos mais?
Quem se propõe a ajudar, como o Brasil fez lá, há que se dispor e se preparar para ajudar também em casa. Nesse novo papel de potência emergente, deve inaugurar um novo tipo de liderança, fraterna e solidária, que o mundo tanto precisa.
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