16 Dezembro 2011
Hildegard de Bingen, mística medieval famosa pelas suas profecias, receberá o título em outubro de 2012 por desejo do Papa Ratzinger.
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no jornal La Stampa, 15-12-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Ele comparou as suas visões às dos profetas do Antigo Testamento, cita-a frequentemente e dedicou-lhes duas catequese na audiência das quartas-feiras. Indicou-a como exemplo de mulher teóloga, elogiou suas composições musicais ainda hoje executadas realizada, assim como a coragem que lhe fazia enfrentar Frederico Barba-Ruiva, a quem comunicava admoestações divinas.
Bento XVI está muito ligado à figura de Santa Hildegard de Bingen e pretende proclamá-la, em outubro de 2012, "Doutora da Igreja": um título raro e solene, atribuído a santos que, graças à sua vida e aos seus escritos, foram iluminadores para a doutrina católica.
A Igreja reconheceu até hoje 33 "doutores", trinta dos quais são homens. As mulheres da lista são apenas três: Teresa de Ávila, Catarina de Sena e Teresinha de Lisieux, as duas primeiras proclamadas por Paulo VI em 1970, a última por João Paulo II em 1997. Agora, Ratzinger quer acrescentar uma quarta ao elenco, convidando assim as mulheres a seguir o exemplo da mística renana e a contribuir com a reflexão teológica.
Hildegard, última de dez irmãos da nobre família dos Vermessheim, nasceu em 1098 em Bermersheim, na Renânia, e morreu com 81 anos em 1179. A etimologia do seu nome significa "aquela que é audaz na batalha", uma primeira profecia que se realizaria plenamente. Devotada pelos seus pais à vida religiosa desde quanto tinha oito anos, tornou-se beneditina no mosteiro de São Disibodo. Depois, tornou-se priora (magistra) da comunidade feminina e, dado o número sempre crescente de aspirantes que batiam em seu convento, decidiu se separar do complexo monástico masculino, transferindo a sua comunidade para Bingen, onde passou o resto da sua vida.
Desde jovem, ela recebera visões místicas, que eram postas por escrito por uma coirmã. Temendo que fossem apenas ilusões, pediu conselho a São Bernardo de Claraval, que a tranquilizou. E, em 1147, obteve a aprovação do Papa Eugênio III, que, enquanto presidia um sínodo em Trier, leu um texto de Hildegard. O pontífice a autorizou a escrever as suas visões e a falar em público. A sua fama se espalhou rapidamente: os seus contemporâneos atribuíram-lhe o título de "profetisa teutônica" e de "Sibila do Reno".
A mística, santa para o povo, mas jamais oficialmente canonizada, à cuja figura é dedicado o filme Vision, de Margarethe von Trotta, na sua obra mais conhecida, Scivias ("Conhece as vias"), resume em 35 visões os eventos da história da salvação, desde a criação do mundo até o fim dos tempos. "Com os traços característicos da sensibilidade feminina – disse Bento XVI sobre ela –, Hildegard desenvolve o tema do casamento místico entre Deus e a humanidade realizado na encarnação. Sobre o madeiro da cruz, realizam-se as núpcias do Filho de Deus com a Igreja, sua esposa, capacitada a doar a Deus novos filhos".
Para o Papa Ratzinger, que, ao lembrá-la, há um ano, havia encorajado as teólogas, é evidente, justamente a partir de exemplos como o de Hildegard, que a teologia pode "receber uma contribuição peculiar das mulheres, porque elas são capazes de falar de Deus e dos mistérios da fé com a sua peculiar inteligência e sensibilidade".
Não faltam nas suas visões profecias de curto prazo, como aquela sobre a afirmação da heresia cátara, mas também lampejos apocalípticos, como o do Anticristo que semeará a morte entre os povos "quando, sobre o trono de Pedro, sentar-se um papa que tomará o nome de dois apóstolos". Ou aquela em que ela faz resplandecer a possibilidade de que um muçulmano convertido ao cristianismo, tendo-se tornado cardeal, assassine o papa legítimo porque quer o seu trono e, não conseguindo obtê-lo, proclama-se antipapa.
A história de Hildegard atesta a vivacidade cultural dos mosteiros femininos da época e contribuir para desfazer certos preconceitos sobre a Idade Média. Ela era uma monja, teóloga, cosmóloga, botânica, musicista: é considerada a primeira mulher compositora da história cristã. Sabia governar, condenava as imoralidades dos sacerdotes que, com os seus pecados, faziam com que "as feridas de Cristo continuem abertas", enfrentava os próprios bispos alemães. Assim como Frederico Barba-Ruiva, a quem fez chegar uma mensagem da parte de Deus, depois que o imperador havia nomeado pela segunda vez um antipapa: "Eu posso abater a malícia dos homens que me ofendem. Ó rei, se vos é importante viver, ouvi-me, ou a minha espada vos transpassará".
A monja alemã também é a padroeira dos estudiosos de esperanto, por ter sido a autora de uma das primeiras linguagens artificiais, a língua ignota, um idioma secreto que ela utilizava para fins místicos e era composta por 23 letras. Ela mesma a descreve em um códice que também contém um glossário de 1.011 palavras na "língua ignota".
A Congregação para as Causas dos Santos, liderada pelo cardeal Angelo Amato, está concluindo o estudo dos documentos sobre Hildegard. Embora os papas sempre tenham permitido o seu culto na Alemanha – o último a se expressar nesse sentido havia sido Pio XII –, a mística renana jamais foi realmente canonizada, porque o processo que havia sido aberto meio século depois da sua morte foi interrompido.
Por isso, prevê-se que o Papa Ratzinger, que já a chamou de "santa" mais de uma vez nos seus discursos, irá canonizá-la oficialmente antes de inscrevê-la na lista exclusiva dos doutores cuja vida e cujas obras foram iluminadores para a doutrina católica.
Nota:
A edição da Revista IHU On-Line da próxima semana, que terá justamente as mulheres místicas como seu tema de capa, traz diversas entrevistas com estudiosos internacionais e nacionais sobre Hildegard de Bingen, dentre outras. A revista, nas versões HTML, PDF e "versão para folhear", estará disponível no sítio do IHU nesta segunda-feira, a partir das 16h. Já a versão impressa circulará no câmpus da Unisinos a partir das 8h de terça-feira.
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Hildegard de Bingen: futura Doutora da Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU