08 Novembro 2011
"História na mão, caminho na frente. Quem perde a história, perde a memória e quem perde a memória não volta pra casa"! A afirmação de Agostinho Pretto, falecido no dia 06 de outubro de 2011, é relembrada por Conceição Aparecida de Souza, ex-liberada da PO nacional, militante da Pastoral Operária de Campinas e da coordenação do CESEP.
Conceição Aparecida, por ocasião de um mês de morte do Pe. Agostinho, testemunha um pouco de sua história e convicções.
Eis o testemunho.
Falar do padre Agostinho Pretto é recordar as histórias que ele próprio nos contava, sentados ao redor de uma mesa, na sua casa simples e acolhedora na periferia de Nova Iguaçu-RJ. Ficávamos horas e horas ouvindo e aprendendo com ele muitas lições de vida.
Lembro-me aqui do que nos contava nessas conversas sobre sua vida pessoal e pastoral e que partilho com todos vocês, ao mesmo tempo em que celebramos a memória de um mês do seu falecimento, ocorrido no dia 06 de Outubro.
Sua trajetória de vida
Padre Agostinho Pretto, nasceu em Encantado, no Rio Grande do Sul. Era o oitavo filho de 15 irmãos/ãs. Toda a sua infância foi no campo, junto dos pais e irmãos, plantando, colhendo e construindo um mundo na alegria de quem se entende e se ama.
Nessa família de italianos, que preservava os costumes religiosos, aprendeu, desde o berço materno, a ser coerente e estar á disposição dos irmãos e irmãs.
Alfabetizou-se com 13 anos, quando foi para o seminário, no Rio Grande do Sul.
Foi ordenado padre no ano de 1953 e permaneceu como padre em Porto Alegre, por um período de 10 anos. Por que Padre? Circunstância de uma família que sonhava ter alguém padre e quando decidiu que seria padre, teve muito apoio dos irmãos.
No ano de 1956, assume a coordenação da JOC – Juventude Operária Católica. Estava no começo do seu ministério e foi o trabalho com a juventude, com os trabalhadores, que o levou a dedicar-se a um setor do mundo – os desfavorecidos.
O que aprendeu com a JOC?
– Descobri os valores do mundo do trabalho e a ver os trabalhadores como sujeitos da mudança, confessava Pe. Agostinho.
No ano de 1963, chega ao Rio de Janeiro, à Diocese de Nova Iguaçú, onde permaneceu até seu falecimento.
No ano de 1975, nasce a CPO, Comissão Pastoral Operária.
A Pastoral Operária nasce de um processo de articulação e reflexão junto com um grupo de bispos, padres, leigos, do qual padre Agostinho foi o grande articulador, e não se cansou de falar que foi na pastoral operária que encontrou a universidade do povo.
Uma das suas frases mais conhecida:
"-- História na mão, caminho na frente. Quem perde a história, perde a memória e quem perde a memória não volta pra casa"!
Repetia também:
"-- Não podemos perder a história de Jesus de Nazaré, a história dos trabalhadores. Temos que curtir, saborear, adubar sempre. Memória é igual benção de Deus. Casa é a fraternidade, justiça, Reino de Deus".
Alguns momentos significativos da sua vida:
- Tarefa de assumir o mundo dos trabalhadores/as;
- Assumir atividade nacional, fora do seu espaço, do seu estado;
- Ter conhecido o mundo nordestino (comer com as mãos, usar cuias, dormir na rede...), sem maiores problemas;
- Ser Assistente Latino Americano da Ação Católica Operária;
- Conhecer a clandestinidade e a realidade da América do Sul e Central;
- Conhecer o mundo, andou pelo mundo dentro desta missão com a juventude trabalhadora;
- Viver o Concílio Vaticano II.
- Esteve em Medellin
– O Papa João XXIII era seu grande referencial;
- Foi perseguido e preso. Ele dizia que a cadeia foi o maior seminário de sua vida. Ali ouviu os gritos dos torturados e os berros dos torturados; Viu companheiros de cela buscando o suicídio. Foi ali que reafirmou o seu ministério e abraçou com mais amor a causa;
- decisão de morar na Diocese de Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro;
- Ter capacidade de viver conjunturas diferentes;
- Trabalhar como assessor nacional e assessor Latino Americano da JOC (antes e depois da prisão).
Padre Agostinho Pretto assumiu este compromisso de dedicar-se ao mundo dos trabalhadores com muita paixão e amor:
"-- Foi com os trabalhadores – dizia ele - que aprendi o método Ver/Julgar/Agir. Com os trabalhadores aprendi a escutar e a ouvir".
Com sua voz forte e firme, não cansava de repetir:
"-- Se tiver que recomeçar, começaria de novo, porque onde eu estiver, vai ter fumaça".
" -- Quando assumi essa causa dos trabalhadores, me ordenei novamente na escola dos trabalhadores", à qual dedicou sua vida inteira.
Nosso grande profeta e amigo dos trabalhadores/as
No dia 06 de Outubro, após receber a triste noticia do seu falecimento, não tive dúvidas, fui participar deste momento, junto com a comunidade, os familiares e amigos.
Ao chegar á Paróquia São José Operário- Nova Iguaçu-RJ onde ele foi pároco e celebrou até os últimos momentos, avistei na porta de entrada um telão estampando a foto sorridente do Padre Agostinho com a frase:
"CORAGEM TÔ CONTIGO E NÃO ABRO".
Na celebração de corpo presente, estiveram Dom Luciano Bergamin, Bispo de Nova Iguaçu, RJ; Dom Valdir Calheiros, Bispo Emérito de Volta Redonda, RJ; centenas de padres da diocese de Nova Iguaçu e de outras dioceses, diáconos, religiosas, seminaristas, leigos e leigas de diversas comunidades e dioceses. Estávamos ali para celebrar a vida, porque padre Agostinho dizia: "morte não se celebra, se denúncia".
Estávamos ali para proclamar a alegria da Ressurreição. Padre Agostinho dizia: "quem perde a Memória não volta pra casa".
Por nunca ter perdido a memória do povo simples e trabalhador, hoje ele volta prá Casa do Pai.
Recordo de alguns testemunhos durante a celebração:
"A força de sua voz ressoava por todos os cantos de nosso país"
"Foi fundador da Associação Nacional dos Presbíteros".
"Fica a missão de plantar, cultivar tudo o que Pe. Agostinho Pretto semeou entre nós".
"Pe. Agostinho sempre trabalhou a importância de unir fé e vida – para ter cidadania e ser um bom cidadão".
"Pe. Agostinho veio como semente e vai como uma árvore cheia de frutos".
"Aqui tem uma pessoa, que teve um trabalho com uma relação grande no Brasil inteiro. Colocou-se a serviço da classe trabalhadora, dos operários. E, quando viu que o pão diminuiu na mesa do trabalhador/a, organizou uma pastoral, que é a pastoral operária, no Brasil inteiro. A Pastoral Operária ainda existe nos dias de hoje, com os trabalhadores da esperança. Esse homem só pode estar no céu."
"Aos 86 anos de idade, com certeza padre Agostinho não conseguiu contar o número de amigos que tem. Padre Agostinho foi um mestre de vida, comemorava a vida."
"Senhor! Pode deixar teu filho descansar em paz, porque muito trabalhou. Era otimista, alegre, teve momentos difíceis e de sofrimento na cadeia, na época da repressão."
"Homem de Fé simples, singela e profunda que o levou a escolher o caminho da juventude e do trabalhador. Veio de uma família de migrantes, de garra e de fé. Gostava de sentar-se à mesa com os amigos para comer, beber, debater, discutir, articular, socializar, e todos ao redor da mesa eram sonhadores como Ele".
"Sabia cultivar a amizade, e sempre repetia: "não existe prazer que se compare àquele de rever velhos amigos."
"Ele dizia que sua grande universidade foi o mundo do trabalho e os trabalhadores. Estamos contigo para continuar sua obra."
"Padre Agostinho vai, mas deixa este grande legado! Assumir a causa dos trabalhadores e trabalhadoras."
"Não podemos pensar a história do Brasil, a partir dos anos 60 até os dias de hoje, sem a presença do padre Agostinho. Se hoje os trabalhadores tem conseguido algumas conquistas é graças á luta e perseverança de Agostinho Pretto."
Obrigada padre Agostinho.
Estamos contigo para continuar tua obra.
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Agostinho Pretto: Memória de uma vida a serviço da causa operária - Instituto Humanitas Unisinos - IHU