A chocante imagem do ditador líbio
Muamar Gadafi morto é possivelmente o ícone mais poderoso até agora da
Primavera Árabe, a onda de protestos populares por mais liberdade e democracia. Ela assustará os demais líderes autocráticos do Norte da África e do Oriente Médio e poderá ter um efeito profilático na região. Ainda que haja diferenças importantes entre o caso da Líbia e os demais países.
O comentário é de
Humberto Saccomandi, jornalista, publicado no jornal
Valor, 21-10-2011.
Ao contrário de
Gadafi, os ditadores da Tunísia e do Egito caíram após poucas semanas de protestos, com relativamente pouca resistência. Ainda assim, deixaram um saldo de 500 mortos. O líder líbio resistiu por mais de oito meses e levou o seu país a uma guerra civil, com enorme destruição material e possivelmente muitos milhares de mortos.
O ex-ditador egípcio
Hosni Mubarak está preso e sendo processado no Egito. O ex-ditador tunisiano
Zine El Abidine Ben Ali está exilado na Arábia Saudita, após de ter sido condenado (à revelia) a 35 anos de prisão em seu país. Mas ambos estão vivos.
Gadafi foi trucidado ontem pelo povo que ele insistia que o amava.
A foto de
Gadafi morto deve ter assustado o ditador sírio
Bashar al Assad, em Damasco. Ainda que por um instante, possivelmente lhe passou pela cabeça: "Será que eu também vou acabar assim?"
Gadafi só caiu porque as potências ocidentais (Europa e EUA) intervieram na Líbia. Os rebeldes não teriam capacidade militar para derrubá-lo. E o Ocidente só interveio na Líbia porque o país tem importantes reservas de petróleo. A intenção de proteger a população civil de um massacre, ainda que louvável, foi apenas um pretexto. A população síria está sofrendo, mas não se fala em intervir no país. A Síria quase não tem petróleo.
Assad e outros ditadores regionais podem se sentir mais tranquilos em suas cadeiras sem a ameaça de intervenção da
Otan (a aliança militar ocidental). Mas será que eles vão apostar a pele nisso?
Há outro fator importante a ser considerado.
Gadafi não tinha amigos, não tinha onde se refugiar. Nenhum país pequeno teria condições de recebê-lo, pois a pressão pela sua extradição seria insuportável. E ele não tinha aliados entre as potências regionais.
Assad pode continuar a reprimir à vontade os manifestantes que exigem a sua saída. Ele sempre terá a opção de se refugiar no Irã, seu maior aliado no Oriente Médio. O ditador do Iêmen,
Ali Abdullah Saleh, que também vem reprimindo violentamente os protestos no país, deve encontrar guarida na Arábia Saudita, se realmente for obrigado a deixar o poder.
Ainda assim, a imagem de
Gadafi morto, com marcas de espancamento e tiros, trará pesadelos a muitos ditadores na região.
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Imagem é ícone e vai assustar ditadores - Instituto Humanitas Unisinos - IHU