Mensagem do Seminário Pan-Amazônico
Nós religiosos e religiosas, "na escuta a Deus onde a vida clama”, estivemos reunidos em Manaus, Brasil, nos dias 07 a 09 de outubro, para o Seminário da Vida Religiosa Consagrada, promovido pela CLAR (Confederação Latino Americana e Caribenha de Religiosos/as). Éramos religiosas e religiosos da Pan Amazônia: colombiana, equatoriana, boliviana, peruana, venezuelana e Amazônia brasileira. Tendo como tema: Amazônia: importância, desafios e missão e o lema: A Pan- Amazônia geme em dores de parto (cf.Rm 8,22), o seminário tratou ainda da Intercongregacionalidade e a Interinstitucionalidade como temáticas transversais.
Além da VRC, participou do seminário o cardeal Dom Cláudio Hummes, Presidente da Comissão Episcopal para a Amazônia, da CNBB. Estiveram também presentes Ir. Paulo Petry, Presidente da CLAR e Ir. Marian Ambrósio, presidente da CRB Nacional, bem como representantes de outras instituições que atuam na Amazônia.
Iniciamos o seminário vivenciando fortemente nossa fé no Deus da Vida e sofremos os impactos causados na Pan Amazônia pelos que adoram os ídolos geradores de morte. Assim como as águas que compõem uma bela sinfonia de gotas, chuvas e orvalhos, que seguem seu percurso de igarapés, corredeiras e rios, vencem barreiras e se entregam ao fascínio do oceano, assim a VRC necessita encontrar-se, munir-se de novas sensibilidades, compor a sua sinfonia, fazer o seu percurso histórico, vencer obstáculos e entregar-se ao fascínio do Absoluto de Deus que nos quer geradora de vida.
SENTIMOS a terra sagrada deste chão, que fluía na sensível experiência de pisar, com pés descalços, na terra regada pela preciosa água da vida. As fibras de nosso ser se comoviam pela ritmada cantoria dos pássaros e nossa pele se estremecia na brisa leve, sob as sombras protetoras das árvores frutíferas. A contemplação do homem e da mulher, na singularidade de cada um e na pluralidade que a Criação nos proporcionava, nos comovia e nos levava ao abraço da acolhida sagrada.
Sentimos também a ausência de tantas e tantos que se somariam neste sonho comum de contemplar a "Amazônia em sua importância, em seus desafios e em sua missão”.
OUVIMOS, em diversos idiomas e sons, o Deus que a nós se revela de formas tão variadas. O cantar dos pássaros, o ruído das águas, os sons das florestas, tudo reconhece seu criador. A Criação é o grande lugar teológico da Amazônia. Ouvimos sua Palavra escrita, proclamada pela vida entregue, pelo serviço gratuito e pela partilha de saberes.
Ouvimos também o clamor da vida ameaçada, da floresta tombada, da moto-serra em melodia fúnebre. Ouvimos a Pan Amazônia gemendo em dores de parto.
VIMOS uma Vida Religiosa e uma Igreja movida por grande paixão pela causa do Reino de Deus e pela defesa da vida. Vimos o sonho por novas relações entre os seres humanos e com toda a criação a partir do coração que opta pela Vida e que aprende a proclamar o essencial dentro da complexidade que a conjuntura atual apresenta.
Vimos também a mercantilização da vida, da fé, das relações. Vimos sangue derramado, rios poluídos, lágrimas desesperadas, indígenas e ribeirinhos absolutamente desrespeitados.
TESTEMUNHAMOS a beleza de vidas doadas, de opção por serviços nos lugares geográficos e sociais dos empobrecidos, assumindo o destino dos excluídos e construindo juntos o sonho comum de uma outra Amazônia possível. Testemunhamos também a presença viva e atuante do Espírito de Deus que fecunda nossas vidas e nossa missão e que se fez sensível em nossas intuições e proposições.
Testemunhamos forças e fragilidades de nossa VRC. Há belas experiências missionárias comunitárias, movidas por uma paixão pelo Reino da vida. São experiências pequenas, significativas, mas faltam-nos mudanças institucionais e culturais, maior incidência nas urgências do Reino proclamado por Jesus, maior repercussão em nossas Congregações e Instituições.
INDIGNAMO-NOS muito com a ganância e a cobiça que assola nossa Mãe Terra. Estremece-nos o ruído ensurdecedor das moto serras, das escavadeiras nas mineradoras, das perfuradoras nas petroleiras e o avanço do agronegócio. Assustam-nos os planos governamentais, a invasão do capital estrangeiro, a implantação dos grandes projetos, a construção das inúmeras barragens, tais como Belo Monte - "grande monstro”, mega-projetos que desarmonizam a sintonia do "charango” e dos demais instrumentos musicais e que matam a musicalidade de todos os seres vivos do planeta.
Indignamo-nos, outrossim, com nossa pouca ousadia profética, com nossas esperanças fragilizadas, com nossas ações fragmentadas.
SOLIDARIZAMO-NOS com tantos rostos desfigurados pela fome, pela desesperança, pela injustiça. São rostos de homens e mulheres indígenas que acreditam na terra, na água, na vida, que sonham com "Bem Viver”, em harmonia com seu meio ambiente. Rostos também de ribeirinhos, agricultores, marginalizados urbanos, ameaçados de exclusão radical.
Solidarizamos também com missionárias e missionários perseguidos, incompreendidos, martirizados. Unimo-nos em solidariedade cúmplice com todas as lideranças que não se deixam seduzir pelas sedutoras propostas do deus da morte.
OUSAMOS afirmar que ser missionários na Amazônia é ser hoje missionários do mundo, pois a Amazônia deixou de ser "fundo de quintal” para se tornar "praça central do mundo”. A cobiça mundial sobre a Amazônia nos obriga a tomar consciência de nossa imensa responsabilidade como missionários e missionárias neste chão. É hora de não deixar cair a profecia, de fortalecer a esperança, de articular ações, de deixar-nos conduzir por novos paradigmas. A intercongregacionalidade e interinstitucionalidade nos convocam a uma outra interpretação da realidade. O paradigma ecológico nos fará mergulhar em nova experiência do sagrado, resgatando o olhar sacramental sobre a realidade que nos cerca.
LEVAMOS... nossas cuias leves e ligeiras, itinerantes e despojadas, carregadas de sonhos e de esperanças, comprometidas com a luta sócio ambiental.
Levamos a convicção de que "quanto mais difícil os tempos, mais deve ser forte a esperança” (Pedro Casaldáliga)
Levamos também desafios de superar fronteiras geográficas e simbólicas, de gerar um novo pensar teológico-espiritual, de tecer uma leitura bíblico-profética contextualizada, de promover uma liturgia viva e inculturada.
Além de nossas cuias, levamos paneiros e redes, tecidas de sonhos e de desejos, ocupando brechas que abrem novos rios de vida abundante para todos e todas.
Participantes do Seminário da Pan-Amazônia.
Manaus – Brasil, 7 a 9 de outubro de 2011