"Opressão à mulher contribui para estagnação econômica", assevera
Naomi Wolf, crítica social e ativista social, em artigo publicado no jornal
O Estado de S. Paulo, 01-10-2011.
Eis o artigo.
Uma recente matéria de capa da revista
Newsweek, sobre o relatório global "Progresso das mulheres no mundo", evoca imagens de dois planetas diferentes: os melhores lugares do mundo para ser uma mulher e o pior.
Nos
EUA, as mulheres estão vencendo os homens em termos de formação universitária. A
Turquia passou a rastrear homens que cometem abusos domésticos e
Dinamarca e
Austrália são governados por primeiras-ministras.
Agora, olhemos para o outro planeta: no
Chade, o pior de todos, as mulheres não têm quase nenhum "direito legal" e meninas de 10 anos estão legalmente casadas. Muitas mulheres no
Mali - o quinto da lista - são traumatizadas pela mutilação genital feminina. Na
República Democrática do Congo, 1.100 mulheres são estupradas diariamente.
Os dados na lista da
Newsweek mostram que precisamos formular esse tema em termos mais abrangentes, mais robustos. Quando países pobres optam por oprimir suas próprias mulheres, até certo ponto escolhem dar continuidade à sua própria pobreza. A opressão da mulher é uma questão moral; mas também pode ser vista como uma opção pela comodidade "cultural", às custas de um progresso socioeconômico no longo prazo.
Não é politicamente correto atribuir uma parte do sofrimento dos países muito pobres às suas próprias decisões. Mas é condescendente nos recusarmos a responsabilizar muitos deles pelos seus próprios problemas. Obviamente, o legado do colonialismo é o principal fator da sua pobreza. Mas como podemos responsabilizar esse legado e ao mesmo tempo fechar os olhos para um tipo de colonialismo contra as mulheres nas instituições públicas e nos lares desses mesmos países?
Quando os países mais pobres - muitos deles na África e com maiorias muçulmanas - optam por sustentar e até projetar novas políticas que oprimem as mulheres, temos de estar dispostos a dizer que, até certo ponto, estão escolhendo a desgraça econômica que se segue a essa decisão.
O silêncio do mundo desenvolvido sugere que os maus-tratos às mulheres negras e pardas nas mãos de homens negros é considerado um dado, em vez de julgar a todas as pessoas da mesma forma.
Avanços
As "surpresas" na lista da
Newsweek confirmam que educar as mulheres beneficia a prosperidade econômica. Muitos países com histórias de colonialismo e outras formas de tirania, bem como países que carecem de abundância em recursos naturais, optaram por educar as mulheres e conceder a elas direitos legais.
Alguns continuam a enfrentar dificuldades econômicas, mas nenhum sofre da mais abjeta pobreza: é o caso na China, na Índia, na Malásia, na Indonésia, no Brasil, na Coreia do Sul e na Turquia e outros emergentes.
A baixa posição social ocupada pelas mulheres no "
Planeta Pior" não pode ser atribuída à paralisia cultural: muitos dos países "surpreendentes" - Romênia, Portugal, Filipinas e Índia - tratavam as mulheres com muito mais desigualdade há apenas 50 ou 100 anos.
Mudanças
No
Paquistão, o estupro dentro do casamento não é atualmente considerado ilegal e ocorrem anualmente 800 assassinatos cometidos em defesa da honra. Que tipo de prosperidade econômica poderia surgir no estagnado Paquistão se o domínio patriarcal fosse relaxado?
Se a mulher contar com alguma forma de alfabetização matemática, poderá abrir um negócio. Se não conviver com o medo mortal de ser estuprada e espancada no próprio lar, ela pode organizar sua comunidade para a escavação de um novo poço.
Se não estiver sujeitando a filha a ferimentos genitais traumáticos aos 3 anos e ao casamento forçado aos 10, ela poderá ir à escola.
E, quando ela se casar e tiver seus próprios filhos, eles serão beneficiados pelo convívio com dois pais que receberam ensino e têm vida profissional, o que significa o dobro de diálogos educados em casa, o dobro dos contatos, e duas vezes mais encorajamento para o sucesso. Mães que receberam educação e pressionam os filhos fazem toda a diferença.
"O mundo precisa pensar de maneira mais estratégica e criativa a respeito da libertação do potencial feminino para o crescimento", disse a secretária de Estado
Hillary Clinton à
Newsweek. "Estudos mostram que ajudar as mulheres a ter acesso ao comércio e a participar do crescimento ajuda na criação de empregos e amplia a renda do lar."
É hora de se livrar de tantos pruridos na hora de cobrar dos países mais pobres a responsabilidade por fazer algo essencial para solucionar o seu próprio drama: emancipar a sua população feminina.
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Emancipação feminina levaria nações pobres ao desenvolvimento - Instituto Humanitas Unisinos - IHU