Era para ser um diálogo entre ciência e budismo o debate "
Estados de Consciência - Encontro entre o Saber Tradicional e o Científico".
Mas a principal atividade do dalai-lama no segundo dia de sua visita ao Brasil, ontem, acabou reforçando a impressão de que religião e ciência seguem longe de se entender.
A reportagem é de
Laura Capriglione e publicada pelo jornal
Folha de S. Paulo, 17-09-2011.
O que se viu foi o "
Oceano de Sabedoria" (tradução da expressão tibetana dalai-lama) defendendo a autonomia do pensamento religioso em relação ao científico, depois de duas "aulas" sobre o funcionamento do cérebro, ministradas pelos neuropesquisadores
Caroline Schnakers, da Universidade de Liège (Bélgica), e
Adrian Owen, da Universidade de Cambridge.
Como bons cientistas, os dois falaram sobre a consciência, localizando-a no cérebro. O pesquisador tibetano
Geshe Lobsang Tenzin Negi, da Universidade Emory, nos EUA, foi o primeiro a notar: consciência para a ciência ocidental é a afirmação do "eu". Para a tradição budista, trata-se de uma condição universal, desentranhada da materialidade cerebral.
SEPARAÇÃO
"Devemos saber separar as coisas da ciência das coisas da religião", endossou o líder tibetano à plateia de 2.500 médicos, psicólogos, enfermeiros, terapeutas e cuidadores que lotaram o Golden Hall do World Trade Center, zona sul de São Paulo.
Segundo o dalai-lama, a expansão do conhecimento científico sobre a mente não é garantia alguma de redução do sofrimento humano. "Às vezes, até provoca mais. A descoberta do mecanismo da fissão nuclear não gerou mais sofrimento? Sem a compaixão [conceito central no budismo], o conhecimento é incapaz de aumentar a felicidade", disse.
Em entrevista coletiva realizada na hora do almoço, o dalai-lama defendeu a diversidade religiosa. Segundo ele, todas as religiões possuem um fundo comum, baseado na compaixão, no perdão, no amor e na autodisciplina.
"É necessário que existam diferentes abordagens religiosas, porque, se houvesse uma só - por mais maravilhosa que fosse -, não daria conta da diversidade de motivações que levam as pessoas a buscar [o sagrado]".
CRISTÃOS E BUDISTAS
Brincando, relatou como um amigo protestante insiste em chamá-lo de "bom cristão", por sua defesa de princípios caros ao cristianismo.
"Eu sempre respondo que ele é que é um bom budista", disse ele.
E aproveitou para fazer a propaganda do livro que está lançando, ainda sem tradução no Brasil: "
Toward a True Kinship of Faiths: How the World"s Religions Can Come Together" (rumo a um verdadeiro parentesco das crenças: como as religiões do mundo podem se unir).
Na saída, o líder religioso - sem mais - puxou para si e abraçou a jornalista
Zilda Brandão, 64. Emocionada, chorando muito, disse: "É o dia mais feliz da minha vida".
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Dalai-lama defende autonomia da religião - Instituto Humanitas Unisinos - IHU