29 Agosto 2011
O próximo ano de pontificado de Joseph Ratzinger, com quase 85 anos, será fatalmente atravessado pela linha vermelha da Nova Evangelização. A fórmula de estilo wojtyliano esteve no centro do encontro anual, recém concluído, do Schülerkreis ratzingeriano, o cenáculo de ex-alunos que anualmente se reúnem em Castel Gandolfo para refletir juntos, em um seminário a portas fechadas, sobre um tema específico e para se reencontrar, nessa ocasião, com o seu ex-professor.
A reportagem é de Gianni Valente, publicada no sítio Vatican Insider, 29-08-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O próximo Sínodo dos Bispos, programado para o outono de 2012, será dedicado ao tema da Nova Evangelização. Nos próximos meses, em vista desse importante encontro eclesial, também entrará em pleno regime o novo dicastério vaticano criado especificamente para isso – e confiado a Dom Rino Fisichella – com a tarefa de relançar a missão apostólica, sobretudo nos países ocidentais de antiga evangelização, hoje muito atingidos por um evidente desmatamento da memória cristã.
Como é seu costume, durante esse tempo, o Papa Ratzinger irá ouvir a todos com respeito e levará em conta, sem preconceitos de análise, opiniões e conselhos de origem e caráter diferentes. Mas ele também tem as suas ideias sobre esse tema específico. E precisamente os critérios-guia da sensibilidade ratzingeriana sobre esse ponto debatido podem oferecer antídotos poderosos com relação aos lugares comuns que reduzem a nova evangelização a operações de marketing, slogans para campanhas de autopromoção do produto-Igreja.
Encontra-se uma exposição completa do pensamento de Ratzinger sobre a Nova Evangelização em uma conferência que o então purpurado bávaro proferiu no dia 10 de dezembro de 2000, falando no encontro dos catequistas e dos professores de ensino religioso promovido em Roma pela Congregação para o Clero. Nessa ocasião, o futuro pontífice, para delinear a nova disposição evangelizadora que a Igreja do terceiro milênio é chamada a assumir, assumiu os movimentos da parábola evangélica da semente de mostarda, proposta por Jesus no Evangelho de Mateus, como imagem do reino de Deus ("O reino dos céus é como uma semente de mostarda, que um homem toma e semeia no seu campo. Embora ela seja a menor de todas as sementes, quando cresce, fica maior do que as outras plantas. E torna-se uma árvore, de modo que os pássaros do céu vêm e fazem o ninho em seus ramos").
De acordo com Ratzinger, quando se fala de Nova Evangelização, é preciso evitar sobretudo a "tentação da impaciência, a tentação de procurar logo o grande sucesso, de buscar os grandes números". Esse, de acordo com Ratzinger, "não é o método de Deus", para o qual "sempre vale a parábola da semente de mostarda". A nova evangelização também "não pode significar: atrair logo, com métodos novos e mais refinados, as grandes massas que se afastaram da Igreja". A história da própria Igreja ensina que "as grandes coisas sempre começam a partir do pequeno grão, e os movimentos de massa sempre são efêmeros".
Para desenvolver seus argumentos, o prefeito do ex-Santo Ofício, nessa ocasião, não hesitou em citar um autor geralmente não muito valorizado nos Palácios Vaticanos: "Na sua visão do processo da evolução", lembrou Ratzinger "Teilhard de Chardin fala do `branco das origens` (le blanc des origines): o início das novas espécies é invisível e não pode ser encontrado pela pesquisa científica. As fontes estão escondidas – muito pequenas. Com outras palavras: as grandes realidades começam em humildade. Deixemos de lado se e até que ponto Teilhard tem razão com as suas teorias evolucionistas. A lei das origens invisíveis diz uma verdade – uma verdade presente justamente no agir de Deus na história: `Não te escolhi porque és grande; ao contrário – és o menor dos povos. Te escolhi-te porque te amo...", diz Deus ao povo de Israel no Antigo Testamento e exprime assim o paradoxo fundamental da história da salvação. Certamente, Deus não conta com os grandes números. O poder exterior não é o sinal da sua presença. Grande parte das parábolas de Jesus indicam essa estrutura do agir divino e respondem assim às preocupações dos discípulos, que esperavam sucessos e sinais bem diferentes do Messias – sucessos do tipo oferecido por Satanás ao Senhor".
Nessa conferência, a fenomenal expansão do cristianismo na época apostólica também é reconduzida por Ratzinger às parábolas evangélicas da humildade e da aparente marginalidade: "Certamente, Paulo, no final da sua vida, teve a impressão de ter levado o Evangelho até os confins da terra, mas os cristãos eram pequenas comunidades dispersas pelo mundo, insignificantes segundo os critérios seculares. Na realidade, foram o germe que penetra a massa a partir de dentro e traziam consigo o futuro do mundo".
As imagens e os critérios sugeridos por Ratzinger nessa ocasião preservam o chamado à Nova Evangelização de toda retórica triunfalista e de toda neurose de "reconquista". Eles também sugerem consequências operacionais práticas no que diz respeito aos métodos mais adequados da sua realização. Não se trata de "alargar os espaços" da Igreja no mundo. Ratzinger notava, no seu discurso aos catequistas: "Não buscamos escuta para nós, não queremos aumentar o poder e a extensão das nossas instituições, mas queremos servir ao bem das pessoas e da humanidade, dando espaço Àquele que é a Vida. Essa expropriação do próprio eu, oferecendo-o a Cristo para a salvação dos homens, é a condição fundamental do verdadeiro compromisso pelo Evangelho".
Uma Igreja autorreferencial, que se refere só a si mesma, seria instrumento de confusão e de contratestemunho, porque "a marca do Anticristo é o seu falar em seu próprio nome", enquanto "o sinal do Filho é a sua comunhão com o Pai". Por isso, "todos os métodos razoáveis e moralmente aceitáveis devem ser estudados – é um dever fazer uso dessas possibilidades de comunicação. Mas as palavras e toda a arte da comunicação não podem conquistar a pessoa humana nessa profundidade, à qual o Evangelho deve chegar (...). Nós não podemos conquistar os homens. Devemos conquistá-lo a partir de Deus para Deus Todos os métodos são vazios sem o fundamento da oração".
Em outra ocasião, pregando os exercícios espirituais em 1986 para os padres do movimento Comunhão e Libertação (meditações que, depois, confluíram no volume Guardare Cristo, Ed. Jaca Book, 1989), o então cardeal Joseph Ratzinger repropôs como fonte de toda autêntica dinâmica evangelizadora a atratividade da graça, operada pelo próprio Cristo e não pelos programas dos eclesiásticos. Nessa ocasião, o então purpurado bávaro se distendeu em uma esclarecedora comparação com o que aconteceu nos primeiros séculos cristãos, observando como "a Igreja antiga, depois do fim do tempo apostólico, desenvolveu como Igreja uma atividade missionária relativamente reduzida, não tinha nenhuma estratégia própria para o anúncio da fé aos pagãos e, apesar disso, o seu tempo se tornou o período do maior sucesso missionário. A conversão do mundo antigo", destacou Ratzinger diante dos padres do CL, "não foi o resultado de uma atividade eclesial planejada, mas sim o resultado da verificação da fé, verificação que se tornou visível na vida dos cristãos e na comunidade da Igreja. O convite concreto de experiência em experiência, e nada mais, foi, humanamente falando, a força missionária da Igreja antiga. (...) Não realizamos a nova evangelização, da qual tanto necessitamos, com teorias astutamente pensadas: o insucesso catastrófico da catequese moderna é por demais evidente...".
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Ratzinger, Teilhard e a Nova Evangelização - Instituto Humanitas Unisinos - IHU