Recém empossado diretor de um instituto internacional que tem como objetivo buscar soluções para a saúde pública dos 12 países da
Unasul (União de Nações Sul-Americanas), o ex-ministro
José Gomes Temporão, 59, vê um processo de "americanização" do setor no Brasil.
Para ele, a falta de uma fonte estável de recursos faz com que as famílias e as empresas assumam cada vez mais um papel que deveria ser do Estado.
Atualmente, ele comanda o
Isags (Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde), que recebeu investimentos federais de cerca de R$ 1 mi.
A entrevista é de
Denise Menchen e publicada pelo jornal
Folha de S. Paulo, 09-08-2011.
Eis a entrevista.
Por que criar o Isags?
A saúde vem se tornando cada vez mais importante em termos globais. Cerca de 30% de toda a cooperação que o Brasil faz com outros países é em questões de saúde. No
Isags colocamos a saúde como prioridade na agenda política do continente. Queremos que funcione como catalisador de iniciativas.
No ano passado, a OMS divulgou que doenças tropicais, como a dengue, atingem um bilhão de pessoas no mundo, mas são negligenciadas pela indústria farmacêutica. Como enfrentar isso?
O
Isags e a
Unasul vão fazer um trabalho político para avançar nessa área. Não apenas no caso das doenças ditas negligenciadas, mas também no das doenças que, no momento, são as que mais matam em nossos países. Vamos entrar na gestão de tecnologias. Um exemplo: há uma necessidade de colocar equipamentos de radioterapia no continente. Por que não fazer uma compra continental reduzindo custos?
A saúde é sempre uma das áreas mais mal avaliadas. Por que é tão difícil elevar a qualidade do SUS?
São múltiplos os aspectos. Um é a especificidade da saúde, que não pode esperar. Uma pessoa, em situação de sofrimento, precisa ser acolhida, e nem sempre isso é possível. O segundo aspecto é financeiro. O sistema de saúde brasileiro sofre de um problema crônico que já dura 15 anos, que é o subfinanciamento, que nos empurra gradualmente para uma espécie de americanização do sistema de saúde e leva à degradação dos serviços.
Por quê?
O Brasil gasta aproximadamente 8% do PIB em saúde. Quando se olha a divisão entre gasto público e privado, o público é apenas 38% do total. Quem está financiando a saúde no Brasil são as famílias, principalmente, e as empresas. O gasto per capita das famílias de classe média que têm planos é pelo menos duas vezes e meia maior do que o do SUS.
O que acha da decisão do governo paulista de destinar até 25% das vagas em hospitais públicos para quem tem plano?
Sou totalmente contra. Essa medida traz o risco de criar uma dupla porta. Não sou contra as pessoas que têm planos usarem esse serviço. Desde que o SUS seja ressarcido pelo plano.
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"Saúde vive processo de americanização", constata ex-ministro da Saúde - Instituto Humanitas Unisinos - IHU