"A importância que boa parte dos brasileiros dá ao carro"

Mais Lidos

  • “O capitalismo do século XXI é incapaz de atender às necessidades sociais da maioria da população mundial”. Entrevista com Michael Roberts

    LER MAIS
  • Zohran Mamdani está reescrevendo as regras políticas em torno do apoio a Israel. Artigo de Kenneth Roth

    LER MAIS
  • Guiné-Bissau junta-se aos países do "cinturão de golpes militares" do Sahel e da África Ocidental

    LER MAIS

Revista ihu on-line

O veneno automático e infinito do ódio e suas atualizações no século XXI

Edição: 557

Leia mais

Um caleidoscópio chamado Rio Grande do Sul

Edição: 556

Leia mais

Entre códigos e consciência: desafios da IA

Edição: 555

Leia mais

30 Julho 2011

"A cultura automotiva deixa marcas indeléveis nas ruas de grandes cidades". O comentário é do jornalista Conrado Corsalette em artigo intitulado “Para além do Porsche” no jornal Folha de S.Paulo, 31-07-2011.

Eis o artigo.

"Se eu tivesse comprado um apartamento de R$ 500 mil, seria [considerado] normal. Só que eu continuei morando com os meus pais. E comprei o carro há quatro meses. Era um sonho meu. Acho lindo, acho bacana." Com essa declaração, o engenheiro Marcelo Malvio Alvez de Lima, 36, tentou atribuir à marca de seu veículo, um Porsche, o tamanho da repercussão do caso no qual está envolvido.

Em 9 de julho, ele acelerou além da conta numa rua do Itaim Bibi e bateu no Tucson da advogada Carolina Cintra Santos, 28. Ela morreu.

Sem entrar em mais uma discussão sobre o acidente, a declaração de Marcelo diz tudo sobre a importância que boa parte dos brasileiros dá ao carro. E essa cultura automotiva deixa marcas indeléveis nas ruas de grandes cidades.
Ao transformar o seu veículo numa extensão da casa (ou na melhor parte dela), há quem tenha perdido a noção de que a rua é um espaço público. Daí a se achar inimputável sobre quatro rodas é um pulo (ou uma acelerada a mais, mesmo após uns goles).

Para além do Porsche, a ode ao transporte individual criou uma realidade trágica na metrópole: horas perdidas no trânsito, tensão no ir e vir, ar sufocante nas estações secas - neste mês, a poluição causada principalmente pela queima de combustíveis foi a pior registrada desde 2008.

Tomar consciência de que não precisa ser assim leva tempo. Basta lembrar da mutação ocorrida na percepção geral sobre o fumo, por exemplo. Em meados do século passado, Humphrey Bogart era "lindo" e "bacana" com seu cigarro no canto da boca. Hoje, os galãs do cinemão americano passam longe da nicotina.

A compreensão de que o cigarro tem um custo social ajudou na campanha para desglamourizá-lo. Com o tempo, será possível convencer as pessoas de que ser veloz e furioso também passa longe de ser "lindo" e "bacana". Pois o custo social do uso indiscriminado do carro, apesar do valor que a indústria automotiva ainda tem para a economia, é enorme.
Aqui e ali, já surgem iniciativas de desglamourização.

Acesse, por exemplo, o site www.vadegalinha.org.br, criado a partir de dados publicados na Folha, e ria um pouco de si mesmo. Lembre-se de que, na hora do rush, a velocidade dos motorizados paulistanos não passa de 15 km/h, performance galinácea.

A campanha de respeito ao pedestre da Prefeitura de São Paulo também colabora para colocar as coisas nos eixos. No que se refere a governos, no entanto, esperam-se medidas mais radicais de melhoria real do transporte público. A meta é inverter a presente situação: há metrô de menos e carros demais. Hora de pensar no que fazer, portanto, com os 7 milhões de veículos da cidade, mais de um para cada dois moradores. Uma proporção "feia" e "tacanha".