29 Junho 2011
O cardeal Angelo Scola foi nomeado na manhã desta terça-feira, dia 28, como o novo chefe da arquidiocese de Milão, a maior diocese da Itália. No texto que segue, o vaticanista norte-americano analisa quem é Scola e o que a sua nomeação a Milão pode significar. O artigo foi escrito para a edição impressa do National Catholic Reporter, do dia 24 de junho, antes, portanto, de a nomeação Scola ter sido anunciada.
A análise é de John L. Allen Jr., publicada no sítio National Catholic Reporter, 24-06-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Às vezes, um cargo é importante não apenas por aquilo que o seu ocupante faz, mas pelo que ele simboliza. Na Igreja Católica, não há melhor exemplo do que o arcebispo de Milão, na Itália, cujo titular é quase automaticamente considerado "tanto papabile", ou seja, um dos principais candidatos para se tornar o próximo papa.
No século XX, dois arcebispos de Milão chegaram ao papado, Pio XI e Paulo VI, enquanto outros dois, os cardeais Carlo Maria Martini e Dionigi Tettamanzi, passaram mais ou menos todo o seu mandato cercados pela especulação sobre suas perspectivas futuras.
Esse pano de fundo torna a atual contagem regressiva para a escolha do Papa Bento XVI de quem irá assumir depois de Tettamanzi – que é esperada para breve – uma questão de interesse de todo o mundo católico. De acordo com o veterano vaticanista Andrea Tornielli, o principal candidato é um rosto já conhecido: o cardeal Angelo Scola, de Veneza, Itália.
Se Scola, de fato, for para Milão, ele provavelmente será anunciado na mídia como uma espécie de príncipe coroado do catolicismo – o item de destaque em toda notícia ou transmissão sobre o próximo conclave a partir de agora, até quando ele de fato ocorrer.
Mesmo sem o prestígio dos candidatos a papa, os observadores da Igreja consideram Scola, 69 anos, há muito tempo como uma figura intrigante. Ele está muito teologicamente em sincronia com o atual pontificado, mas com uma personalidade mais extrovertida, uma perspectiva profundamente global e um otimismo um pouco maior com relação às perspectivas da Igreja no aqui e agora.
Nascido em 1941, em Malgrate, Itália, uma pequena cidade da região da Lombardia, Scola teve uma origem humilde – seu pai era motorista de caminhão; sua mãe, uma dona de casa. Frequentou a Universidade do Sagrado Coração de Milão no início dos anos 1960, onde se tornou amigo e discípulo de um padre italiano chamado Mons. Luigi Giussani, fundador do movimento Comunhão e Libertação.
Na época, os italianos viam o Comunhão e Libertação como uma alternativa conservadora tanto para o movimento da Ação Católica, quanto ao ethos amplamente progressista da arquidiocese de Milão com os cardeais Giovanni Battista Montini (que se tornou Paulo VI) e Giovanni Colombo.
Mais tarde, Scola estudou na prestigiosa Universidade de Friburgo, na Suíça, onde sua área de interesse foi a antropologia teológica. Sentiu-se atraído por pensadores que haviam sido parte da maioria com mentalidade reformista do Concílio Vaticano II (1962-1965), mas que mais tarde desenvolveram reservas sobre a direção da Igreja pós-conciliar. Ele foi especialmente influenciado pelo cardeal Henri de Lubac e pelo Pe. Hans Urs von Balthasar, e posteriormente publicou livros-entrevistas com ambos os teólogos.
Scola se tornou cofundador da edição italiana da Communio, a revista teológica internacional fundada como um contraponto conservador à Concilium, a revista da ala progressista do Concílio. De 1986 a 1991, Scola atuou como consultor da Congregação para a Doutrina da Fé, enquanto o então cardeal Joseph Ratzinger estava no comando. Em 1995, foi nomeado reitor da Universidade Lateranense, em Roma.
Em 1982, Scola foi nomeado para o corpo docente do Pontifício Instituto João Paulo II para Estudos sobre o Matrimônio e a Família, criado para defender a doutrina católica sobre questões como o divórcio, a reprodução artificial, a clonagem, a homossexualidade e o aborto. Durante o papado de João Paulo, figuras associadas com o instituto na Universidade Católica dos Estados Unidos, em Washington, atuaram como arquitetos da luta contra o que o falecido papa descreveu como uma "cultura da morte" no Ocidente secular.
O próprio Bento XVI é um antigo admirador tanto de Giussani, quanto do Comunhão e Libertação. Em 2005, pouco antes de sua eleição ao papado, ele se ofereceu para celebrar a missa fúnebre de Giussani. Para ilustrar a influência que esses laços têm sobre Scola, foi ele que sugeriu a Bento que considerasse a criação de um departamento vaticano dedicado à "Nova Evangelização", o que o pontífice fez prontamente. A ideia, na verdade, tinha sua origem com Giussani.
No início de maio, Scola presidiu a breve visita de Bento XVI a Veneza, onde o pontífice recordou a três patriarcas de Veneza no século XX que se tornaram papas: Pio X, João XXIII e João Paulo I (tradicionalmente, o arcebispo de Veneza leva o título de "Patriarca"). Embora Bento não tenha ligado os pontos, a conclusão parecia inconfundível: isso pode acontecer de novo.
Ponte entre culturas
Dada a sua história, Veneza sempre teve um estilo próprio como ponte entre culturas, e Scola abraçou esse legado desde que assumiu em janeiro de 2002. Sinal disso é a sua Fundação Oasis, lançada em 2004 para promover a solidariedade entre os cristãos no Oriente Médio e o diálogo com o mundo islâmico.
Em uma entrevista em 2010 com o NCR , Scola distinguiu três correntes no Islã: os moderados, que ele disse que geralmente não são representativos das "ruas" muçulmanas; os radicais, que não estão abertos ao diálogo; e o "Islã tradicional", ou seja, a grande maioria dos muçulmanos praticantes, geralmente não representados nos canais oficiais de conversação. Um dos objetivos da Oasis, disse, é se engajar com o Islã tradicional.
Ao contrário de alguns prelados europeus, Scola normalmente não se inclina a preocupações com a "apostasia silenciosa", nas palavras de João Paulo II, do Ocidente. Em vez disso, Scola tende a acreditar que o cristianismo ainda tem uma capacidade de moldar a cultura, se encontrar a coragem de fazer isso efetivamente.
Esse perfil fez de Scola um ponto de referência tanto na Igreja global, quanto no Vaticano. Em 2005, por exemplo, ele atuou como o relator, ou presidente, do Sínodo dos Bispos sobre a Eucaristia.
Na verdade, enquanto não chegar um anúncio oficial, não há garantias de que Scola vá para Milão. De acordo com a análise de Tornielli, outros prelados na disputa são o bispo Francesco Lambiasi, de Rimini, Itália (onde ocorre o grande encontro anual do Comunhão e Libertação); Mons. Aldo Giordano, representante do Vaticano para o Conselho da Europa; e o arcebispo Pietro Parolin, respeitado ex-oficial da Secretaria de Estado que agora atua como embaixador do papa na Venezuela.
No entanto, mesmo que Scola permaneça onde está, ele ainda pode ser um formidável competidor para um conclave. Sem saber qual será o resultado de Milão, a casa de apostas irlandesa Paddy Power já indica que Scola é o favorito, com uma cotação de 6-1, para ser o próximo papa.
Não importa qual seja o seu endereço para os próximos anos, portanto, o cardeal Angelo Scola é um prelado que vale a pena acompanhar.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Favorito papal, Scola pode ganhar impulso em Milão - Instituto Humanitas Unisinos - IHU