25 Abril 2011
Em uma edição especial de um programa da TV pública italiana, transmitido na Sexta-Feira Santa, Bento XVI respondeu a sete perguntas selecionadas entre milhares de pessoas de todo o mundo. O diálogo foi transcrito pelo jornal Corriere della Sera, 23-04-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis as perguntas e respostas.
1. A Sexta-feira Santa é o dia em que Jesus demonstra do modo mais radical o Seu amor, isto é, morrendo na Cruz como inocente. A primeira pergunta vem de uma menina japonesa de sete anos: "Chamo-me Elena, tenho muito medo porque a casa em que eu me sentia segura tremeu tanto, tanto, e muitos dos meus amigos morreram. Pergunto: por que devo ter tanto medo? Por que as crianças devem ter tanta tristeza?".
Cara Elena, te saúdo de coração. A mim também surgem as mesmas perguntas: por que é assim? Por que vocês devem sofrer tanto, enquanto outros vivem comodamente? E não temos as respostas, mas sabemos que Jesus sofreu como vocês, inocente. Que o Deus verdadeiro que se mostra em Jesus está do seu lado. Isto me parece muito importante, mesmo que não tenhamos respostas, mesmo que permaneça a tristeza: Deus está do seu lado, e estejam certos de que isso lhes ajudará. Um dia, poderemos também entender por que foi assim.
Neste momento, me parece importante que saibam: "Deus me ama", mesmo que pareça que Ele não me conhece. Não, Ele me ama, está do meu lado. E vocês devem estar certos de que, no mundo, no universo, muitos são como vocês, pensam em vocês, fazem qualquer coisa que podem por vocês, para lhes ajudar. E estar conscientes de que, um dia, eu entenderei que esse sofrimento não era vazio, não era em vão, mas que, por trás dele, há um projeto bom, um projeto de amor. Não é um acaso. Estejas certa, nós estamos contigo, com todas as crianças japonesas que sofrem. Queremos lhes ajudar com a oração, com os nossos atos. E estejam certos de que Deus lhes ajuda. E, nesse sentido, rezamos junto com vocês para que lhes venha a luz o quanto antes".
2. Uma mãe italiana sob a cruz de um filho. Chama-se Maria Teresa e pergunta: "Santidade, a alma deste meu filho, Francesco, em estado vegetativo desde o dia da Páscoa de 2009, abandonou o seu corpo, visto que ele não está mais consciente ou ainda está perto dele?".
Certamente, a alma ainda está presente no corpo. A situação, talvez, é como a de um violão cujas cordas estão despedaçadas, e assim não podem mais ser tocadas. Assim também o instrumento do corpo é frágil, é vulnerável, e a alma não pode mais tocar, por assim dizer, mas permanece presente. Eu também estou certo de que essa alma escondida sente em profundidade o seu amor, mesmo que não entenda os detalhes, as palavras etc., mas sente a presença de um amor.
E por isso essa sua presença, caros pais, cara mãe, ao lado dele, horas e horas todos os dias, é um verdadeiro ato de amor de grande valor, porque essa presença entra na profundidade dessa alma escondida, e o vosso ato também é, portanto, um testemunho de fé em Deus, de fé no homem, de fé, digamos, de empenho pela vida, de respeito pela vida humana, também nas situações mais tristes. Portanto, encorajo-lhes a continuar, sabendo que vocês fazem um grande serviço à humanidade com esse sinal de confiança, com esse sinal de respeito pela vida, com esse amor por um corpo dilacerado, um alma sofredora.
3. "Nós, jovens cristãos de Bagdá, fomos perseguidos como Jesus. De que modo podemos ajudar a nossa comunidade cristã a reconsiderar o desejo de emigrar para outros países, convencendo-a de que partir não é única solução?"
Gostaria sobretudo de saudar de coração todos os cristãos do Iraque, nossos irmãos, e devo dizer que rezo todos os dias pelos cristãos no Iraque. São os nossos irmãos sofredores, como também em outras terras do mundo, e, portanto, estão particularmente próximos do nosso coração, e nós devemos fazer, o quanto possamos, o possível para que possam permanecer, para que possam resistir à tentação de emigrar, que é muito compreensível nas condições nas quais vivem.
Eu diria que é importante que nós estejamos próximos de vocês, caros irmãos do Iraque, que nós queremos lhes ajudar, também quando vocês vêm, receber-lhes realmente como irmãos. E, naturalmente, as instituições, todos aqueles que realmente têm uma possibilidade de fazer algo por vocês no Iraque, devem fazê-lo. A Santa Sé está em permanente contato com as diversas comunidades, não só com as comunidades católicas, com as outras comunidades cristãs, mas também com os irmãos muçulmanos, sejam xiitas, sejam sunitas. E querem fazer um trabalho de reconciliação, de compreensão, também com o governo, ajudá-lo nesse caminho difícil de recompor uma sociedade dilacerada.
Porque este é o problema: que a sociedade está profundamente dividida, dilacerada, que não há mais esta consciência: "Nós somos, nas diversidades, um povo com uma história comum, em que cada um tem o seu lugar". E devem reconstitui essa consciência de que, na diversidade, vocês têm uma história em comum, uma comum determinação. E nós queremos, em diálogo, justamente com os diversos grupos, ajudar o processo de reconstrução e lhes encorajar, caros irmãos cristãos do Iraque, a ter confiança, a ter paciência, a ter confiança em Deus, a colaborar nesse processo difícil. Estejam certos da nossa oração.
4. Uma muçulmana chamada Bintú, da Costa do Marfim, país em guerra há anos, pergunta: "Santo Padre, aqui na Costa do Marfim, sempre vivemos em harmonia entre cristãos e muçulmanos. As famílias são frequentemente constituídas por membros de ambas as religiões. Agora tudo mudou: a política está semeando divisões. Quantos inocentes perderam a vida! Jesus é um homem de paz. O que o senhor aconselharia ao nosso país?".
Tenho recebido cartas dilacerantes da Costa do Marfim, em que vejo toda a tristeza, a profundidade do sofrimento, e fico triste de que possamos fazer tão pouco. Podemos fazer uma coisa, sempre: estar em oração com vocês e, enquanto forem possíveis, faremos obras de caridade e principalmente queremos ajudar, segundo as nossas possibilidades, os contatos políticos, humanos. Encarreguei o cardeal Turkson, que é presidente do nosso Conselho da Justiça e da Paz, a ir para a Costa do Marfim e a procurar mediar, falar com os diversos grupos, com as diversas pessoas, para encorajar um novo início.
E sobretudo queremos fazer ouvir a voz de Jesus, que a senhora também acredita como profeta. Ele sempre era o homem da paz. Esperava-se que, quando Deus viesse para a terra, seria um homem de grande força, destruiria os poderes adversos, que seria um homem de uma violência forte como instrumento de paz. Não é nada disso: ele veio fraco, veio só com a força do amor, totalmente sem violência até chegar à cruz. E isso nos mostra o verdadeiro rosto de Deus, que a violência jamais vem de Deus, jamais ajuda a dar as coisas boas, mas é um meio destrutivo e não é o caminho para sair das dificuldades. Portanto, é uma voz forte contra todo tipo de violência.
E convido fortemente a todas as partes a renunciar à violência, a buscar os caminhos da paz. Vocês não podem servir à recomposição do seu povo com meios de violência, mesmo que pensem ter razão. O único caminho é renunciar à violência, recomeçar com o diálogo, com tentativas de encontrar a paz juntos, com uma nova atenção um pelo outro, com a nova disponibilidade de se abrir mutuamente. E esta, cara senhora, é a verdadeira mensagem de Jesus: busquem a paz com os meios da paz e abandonem a violência. Nós rezamos por vocês, para que todos os componentes da sua sociedade ouçam essa voz de Jesus e que assim retorne a paz e a comunhão.
5. "O que faz Jesus no lapso de tempo entre a morte e a Ressurreição? E, visto que na profissão do Credo diz-se que Jesus, após a morte, desceu aos Infernos, podemos pensar que isso também irá nos acontecer depois da morte, antes de subir ao Céu?"
Acima de tudo, essa descida da alma de Jesus não deve ser imaginada como uma viagem geográfica, local, de um continente ao outro. É uma viagem da alma. Devemos ter presente que a alma de Jesus toca sempre o Pai, está sempre em contato com o Pai, mas, ao mesmo tempo, essa alma humana estende-se até os últimos confins do ser humano. Nesse sentido, vai às profundezas, vai aos perdidos, vai a todos que não atingiram a meta da sua vida, e transcende assim os continentes do passado. Essa palavra da descida do Senhor aos Infernos quer dizer sobretudo que o passado foi alcançado por Jesus, que a eficácia da Redenção não começa no ano zero ou 30, mas vai também ao passado, abraça o passado, a todos os homens de todos os tempos.
Os Padres [da Igreja] dizem, com uma imagem muito bonita, que Jesus toma pela mão Adão e Eva, isto é, a humanidade, e a guia para adiante, a guia para o alto. E cria assim o acesso a Deus, porque o homem, por si só, não pode chegar até às alturas de Deus. Ele mesmo, sendo homem, tomando o homem pela mão, abre o acesso. Abre o quê? A realidade que nós chamamos de Céu. Portanto, essa descida aos Infernos, isto é, às profundidades do ser humano, às profundidades do passado da humanidade, é uma parte essencial da missão de Jesus, da sua missão de Redentor, e não se aplica a nós. A nossa vida é diferente, já fomos redimidos pelo Senhor e apresentamo-nos diante da face do Juiz, depois da nossa morte, sob o olhar de Jesus, e este olhar, de um lado, será purificador: penso que todos nós, em maior ou menor medida, teremos necessidade de purificação. O olhar de Jesus nos purifica e depois nos torna capazes de viver com Deus, de viver com os santos, de viver sobretudo em comunhão com os nossos entes queridos que nos precederam.
6. "Quando as mulheres chegam ao sepulcro, não reconhecem o Mestre. Isso também acontece com os Apóstolos: Jesus tem que mostrar as feridas, partir o pão para ser reconhecido, justamente, pelos gestos. É um corpo verdadeiro, de carne, mas também um corpo glorioso. O que significa o fato de o seu corpo ressuscitado não ter as mesmas características que o primeiro? O que significa, exatamente, corpo glorioso? E a Ressurreição será assim para nós?"
Naturalmente não podemos definir o corpo glorioso, porque ele está além das nossas experiências. Podemos apenas registrar os sinais que Jesus nos deu para entender pelo menos um pouco em que direção devemos procurar essa realidade. Primeiro sinal: o túmulo está vazio. Isto é, Jesus não abandonou o seu corpo à corrupção. Mostrou-nos também que a matéria está destinada à eternidade, que realmente ressuscitou, que não permanece como uma coisa perdida. Jesus levou também a matéria consigo, e assim a matéria também tem a promessa da eternidade. Mas depois essa matéria assumiu uma nova condição de vida, e este é segundo ponto: Jesus não morre mais, isto é, está acima das leis da biologia, da física, porque, submetido a elas, qualquer pessoa morre. Portanto, é uma condição nova, diferente, que nós não conhecemos, mas que se mostra no fato de Jesus e é a grande promessa para nós todos de que há um mundo novo, uma vida nova, para a qual nós estamos a caminho. E, estando nessas condições, Jesus tem a possibilidade de se deixar apalpar, de dar a mão aos seus, de comer com os seus, mas, entretanto, está acima das condições da vida biológica como nós a vivemos.
E sabemos que, de um lado, é um verdadeiro homem, não um fantasma, que vive uma vida verdadeira, mas uma vida nova que não está mais submetida à morte e que é a nossa grande promessa. É importante entender isso, pelo menos no que se pode, para a Eucaristia: na Eucaristia, o Senhor nos doa o seu corpo glorioso, não nos doa carne para comer no sentido biológico. Dá-nos a si mesmo. Essa novidade que Ele é, entra no nosso ser homem, no nosso, no meu ser pessoa, como pessoa, e nos toca interiormente com o seu ser, para que possamos nos deixar penetrar pela sua presença, transformar na sua presença. É um ponto importante, porque assim já estamos em contato com essa nova vida, esse novo tipo de vida. Tendo sido Ele que entrou em mim, eu saí de mim e me estendo para uma nova dimensão de vida. Eu penso que esse aspecto da promessa, da realidade de que Ele se dá a mim e me tira para fora de mim, para o alto, é o ponto mais importante: não se trata de registrar coisas que não podemos entender, mas de estar a caminho para a novidade que começa sempre de novo na Eucaristia.
7. A última pergunta é sobre Maria. "Sob a cruz, assistimos a um diálogo tocante entre Jesus, sua mãe e João. Jesus diz a Maria: `Eis o teu Filho`, e a João: `Eis a tua mãe`. No seu último livro, Jesus de Nazaré, o senhor o define `uma última disposição de Jesus`. Como devemos entender essas palavras?"
Essas palavras de Jesus são principalmente um ato muito humano. Vemos Jesus como verdadeiro homem que faz um ato de homem, um ato de amor pela mãe e confia a mãe ao jovem João para que esteja segura. Uma mulher sozinha, no Oriente naquele tempo, estava em uma situação impossível. Ele confia a mãe a esse jovem, e ao jovem dá a mãe. Portanto, Jesus realmente age como homem com um sentimento profundamente humano. Isto me parece muito bonito, muito importante: que, antes de toda teologia, vejamos nisso a verdadeira humanidade, o verdadeiro humanismo de Jesus. Mas, naturalmente, esse ato tem diversas dimensões, não se refere só a esse momento, mas concerne a toda a história. Em João, Jesus confia a todos nós, toda a Igreja, todos os discípulos futuros, à mãe, e a mãe, a nós.
E isso se realizou ao longo da história: sempre mais a humanidade e os cristãos entenderam que a mãe de Jesus é a sua mãe. E sempre mais se confiaram à Mãe: pensemos nos grandes santuários, pensemos nessa devoção por Maria onde ela sempre mais é sentida: "Essa é a Mãe". Alguns que quase tem dificuldade de acesso a Jesus na sua grandeza de Filho de Deus se confiam sem dificuldade à Mãe. Alguém diz: "Mas isso não tem fundamento bíblico!". Aqui, responderia com São Gregório Magno: "Com o ler – ele diz – crescem as palavras da Escritura". Isto é, desenvolvem-se na realidade, crescem, e sempre mais na história essa Palavra se desenvolve.
Vemos como todos podem ser gratos porque a Mãe existe realmente, a nós todos foi dada uma mãe. E podemos, com grande confiança, ir ao encontro dessa Mãe, que também para cada um dos cristãos é a sua Mãe. E, por outro lado, a Mãe expressa também a Igreja. Não podemos ser cristãos sozinhos, com um cristianismo construído segundo a minha ideia. A Mãe é imagem da igreja, da Mãe Igreja, e, confiando-nos a Maria, devemos também confiar-nos à Igreja, viver a Igreja, ser a Igreja com Maria. E assim chego ao ponto da entrega: os Papas – seja Pio XII, seja Paulo VI, seja João Paulo II – fizeram um grande ato de entrega a Nossa Senhora. E me parece que, como gesto diante da humanidade, diante da própria Maria, é um gesto muito importante. Eu penso que, agora, é importante interiorizar esse ato, de deixar-nos penetrar, de realizá-lo em nós mesmos. Nesse sentido, fui a alguns grandes santuários marianos do mundo: Guadalupe, Lourdes, Fátima, Czestochowa, Altötting, sempre com esse sentido de concretizar, de interiorizar esse ato de entrega, para que ele se torne realmente o nosso ato.
Penso que o ato grande, público, foi feito – talvez, um dia será necessário repeti-lo –, mas neste momento me parece mais importante vivê-lo, realizá-lo, entrar nessa entrega, para que seja realmente nossa. Por exemplo, em Fátima, vi como as milhares de pessoas presentes realmente entraram nessa entrega, se confiaram, concretizaram em si mesmas, por si mesmas, essa entrega. Assim, isso se torna realidade na Igreja viva e assim cresce também a Igreja. A entrega comum a Maria, o deixarmo-nos todos penetrar por essa presença e formar, entrar em comunhão com Maria, nos torna Igreja, nos torna, junto com Maria, realmente essa esposa de Cristo. Assim, neste momento não tenho qualquer intenção de uma nova consagração pública, mas gostaria de convidar a entrar nessa entrega já realizada, para que seja realidade vivida por nós todos os dias e assim cresça uma Igreja realmente mariana, que é Mãe e Esposa e Filha de Jesus.
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"Nem sempre temos respostas!". Bento XVI responde, ao vivo, às perguntas do público - Instituto Humanitas Unisinos - IHU