19 Março 2011
Os mercados, paralisados pela catástrofe japonesa, anteciparam à sua maneira a possibilidade da suspensão do programa nuclear. Desde sábado (12), com a primeira explosão na usina de Fukushima, os valores associados à energia nuclear despencaram na Bolsa em todo o mundo.
A reportagem é de Claire Gatinois, publicada pelo jornal Le Monde e reproduzida pelo Portal Uol, 19-03-2011.
A Areva, cujas ações caíram 17% em duas sessões, antes de se recuperarem em um movimento de retomada generalizada, registrou uma perda de 13,7% de valor desde segunda-feira. O mesmo ocorreu com as operadoras alemãs de reatores E.ON e RWE, em queda respectiva de 6,32% e 7,35% no período.
Os mercados agiram de forma brutal, sacrificando as empresas de obras públicas que, assim como a Bouygues (-2,98%) ou a Vinci (-4,03%), têm envolvimento na construção de usinas, e até a companhia mineradora australiana especializada em extração de urânio Extract Resource (-34,15%).
Os investidores guardaram algumas mensagens-chave: a China anunciou “uma pausa” na implantação de novos projetos de usinas; na Índia, o governo se encontra sob pressão, ao passo que na Alemanha a chanceler Angela Merkel decidiu sem hesitar pela paralisação imediata de sete antigos reatores, por no mínimo três meses.
Na visão das operadoras, nervosas, são argumentos suficientes para imaginar a falência dessa indústria. Ainda mais que as agências de classificação de risco Fitch e Standard & Poor’s acentuaram, como é de hábito, a pressão sobre um setor que já é mal administrado. Em uma nota emitida na quinta-feira (17), a S&P relata que o acidente na usina de Fukushima “poderia ter consequências de dimensão considerável para as operadoras nucleares na Europa”. Ao passo que a Fitch acredita que “as atividades internacionais da EDF, da GDF Suez e da Areva podem ainda ser afetadas negativamente pelas consequências dos acontecimentos no Japão”.
Mas como substituir a energia nuclear, que representa 15% do consumo de eletricidade do planeta, segundo a consultoria Xerfi? Para essa difícil questão, os investidores parecem já ter encontrado as respostas: a energia eólica e a solar. Há alguns dias, eles vêm se lançando sobre as ações das energias renováveis.
Assim, o valor da especialista francesa em energia eólica Theolia disparou 5,93% desde segunda-feira. Mais impressionante ainda: a fornecedora de tecnologia solar Solarworld teve seu valor elevado em 39%, e a fabricante de painéis solares policristalinos Q-Cells, em 28%. Uma bênção para esses valores que, carregados por uma bolha especulativa em 2007, haviam despencado com a crise de 2008.
Para especialistas, embora tenha se iniciado uma reflexão sobre o futuro do setor nuclear, o mercado está indo um pouco rápido demais. As operadoras reagiram pela emoção e de forma muito brusca. Se refletirem a longo prazo, “a indústria nuclear não será descartada”, acredita Marc Touati, economista da Assya. “As energias renováveis são uma indústria do futuro, mas levando em conta as necessidades dos países emergentes, não é com as energias eólica e solar que substituiremos a energia nuclear”, acrescenta Waldemar Brun-Theremin, administrador da Turgot AM.
De fato, as energias verdes ainda estão engatinhando. As empresas do setor são pouco rentáveis do ponto de vista financeiro. E os especialistas lembram que, além das dificuldades de armazenamento, a eficácia energética do eólico e do solar continua sendo pequena. “O sistema fotovoltaico clássico só consegue transformar 15% da energia solar em energia elétrica”, lembra Franklin Pichard, diretor da Barclays Bourse. Nesse contexto, o entusiasmo dos investidores pelo setor parece um tanto excessivo, e provavelmente especulativo. Quando o mercado se acalmar, “o tiro sairá pela culatra”, prevê Pichard.
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Os mercados sacrificam o setor nuclear e elegem as energias verdes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU