08 Março 2011
Andreas Schöggl, diretor internacional de comunicação da Legião de Cristo, nasceu na Áustria em 1974, ingressou na Legião em 1993 e foi ordenado em 2003. Desde 1996, vive em Roma. Licenciado em filosofia e em teologia dogmática, de 2005 a 2010 trabalhou na seção alemã da Secretaria de Estado do Vaticano. Participa da comissão que revisa as Constituições da Legião e também na que negocia com as vítimas de Marcial Maciel, o fundador da Legião e do Movimento Regnum Christi.
A reportagem é de Pablo Ginés, publicada no jornal La Razón, 07-03-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto e revisada pela IHU On-Line.
Eis a entrevista.
Como o senhor recebeu pessoalmente as notícias sobre a dupla vida de Marcial Maciel?
Quando ouvi os primeiros rumores simplesmente pensei: "Não pode ser". Via testemunhos contraditórios e descartei as acusações. Pensava que o criticavam só por ser empreendedor. Depois, quando o nosso superior nos contou tudo, isso me entristeceu, porque eu o admirava. Mas sou uma pessoa mais impassível e não tinha uma relação emocional estreita com ele.
Como essa desilusão afetou a sua espiritualidade?
Não afetou quase nada, acredito. Minha fé vem de uma família da Renovação Carismática. Meu pai é o secretário da Renovação na diocese de Linz, na Áustria. Minha espiritualidade, portanto, era algo muito universal: evangelho, eucaristia, Igreja. Daí veio minha vocação. A vida religiosa e a amizade com Cristo me atraíam. A Legião de Cristo é pouco conhecida na Áustria. Minha família e eu nos perguntávamos se seriam lefebvrianos ou algo raro. Mas me atraíam a juventude, o entusiasmo, sua internacionalidade. Vi que os legionários não eram fundamentalistas, não tinham manias com a liturgia, sobre comungar na boca ou na mão. Para mim, não eram complicados nem rígidos.
E, descoberta a falsa vida do fundador, o que resta do carisma, da vocação própria da Legião?
O Delegado do Papa para a Legião, o cardeal Velasio de Paolis, que entende muito bem da vida religiosa, nos disse: "Vejo muito claro o carisma de vocês. Li suas Constituições e não tenho dúvidas. A Legião está centrada em Cristo, na Eucaristia, no Sagrado Coração, na fidelidade ao Papa e em um apostolado ativo centrado em formar as pessoas, acompanhá-las e evangelizar mediante a influência na liderança". Nada disso é muito original. Outras entidades eclesiais fazem isso, mas não buscamos o que nos distingue, mas sim o que é a nossa essência.
Como a crise do movimento afetou os diversos países?
Em nossas comunidades, mesclamos pessoas de diversas procedências. Nos EUA, as pessoas do movimento pediam no começo reações mais rápidas, ser "brutalmente francos". Os latino-americanos eram de uma disposição mais suave, menos direta. Depois da primeira reação, já se alcançou um nível comum.
O Papa escolheu De Paolis por ser especialista em economia para reconduzir a Legião?
De Paolis tem fama de especialista em economia só há seis anos. A sua área é Direito Canônico. Ele foi procurador-geral da sua congregação, os missionários scalabrinianos, e, na realidade, é um especialista em vida consagrada. É um grande pregador de exercícios, não é um tecnocrata. O Papa não o escolheu por temas de finanças, mas sim como especialista em direito e em constituições. Ele tem empatia: desde o primeiro dia, ele nos entendeu. Não é extrovertido, mas qualquer um pode falar com ele. Toca os temas difíceis sem ferir. Os mais críticos até dizem que De Paolis entende como a Legião funciona.
A Legião tem problemas econômicos por causa da crise mundial ou por causa do escândalo do fundador?
Nos Estados Unidos, as doações diminuíram por causa do escândalo. Na Espanha, a crise econômica geral nos afeta. Lançamo-nos com hipotecas para conduzir os colégios, mas o ritmo da economia mudou. Ao invés de expandir, agora cabe reforçar e consolidar. Mas a crise não põe em dúvida o que somos: seguiremos com os colégios. Transferiremos alguns escritórios, vendemos alguns imóveis. Por exemplo, vamos vender o colégio Everest El Bosque, em Villaviciosa de Odón, em Madri, embora a Legião irá manter a atenção espiritual do centro.
A Legião é um apostolado para ricos?
Eu não venho da elite econômica. Entrei na Legião para evangelizar... também os ricos. Não vamos excluí-los. Os ricos precisam ser evangelizados e precisam ser lembrados de sua responsabilidade social. Talvez, requerem mais atenção, porque, por exemplo, no México, são as classes altas as que mais se secularizam. Podem ajudar muitos, financiar seminários, catequeses para empregados, tocar milhares de pessoas. Pessoalmente, acredito que tratar com ricos pode ser até desagradável: as pessoas simples nas missões te acolhe com alegria, enquanto que o rico acredita ser uma grande coisa só por tratar contigo. A Legião, além disso, encomendou um território de missão em uma zona pobre no México, um milhão de pessoas em Quintana Roo.
O que mudará nos centros educativos e apostolados da Legião?
O trabalho do cardeal de Paolis incide sobre tudo em nossa vida religiosa, em nossa regra de vida, mas não haverá muitas mudanças externas. Essa crise fez com que muitos legionários e consagrados do Regnum Christi amadurecessem e sejam mais capazes de acompanhar as famílias em momentos difíceis, que sejam mais compreensivos. Muitos sacerdotes me dizem que agora são menos duros, menos rígidos, ao confessar, ao acompanhar. Espero que seja assim. Os colégios terão uma identidade católica mais forte, e se poderá notar isso inclusive no currículo. No México, por exemplo, preparamos um novo currículo que reforça a nossa identidade católica.
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Legionários: "É preciso reforçar e consolidar. A crise não põe em dúvida quem somos" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU