31 Janeiro 2011
A União Geral dos Trabalhadores de Tunísia (UGTT) levou a voz cantante na remodelação do Governo interino, mesmo sem tirar o olho por um instante sequer dos protestos populares. Porque foi a reação das ruas que fez com que três ministros do sindicato abandonassem o Executivo formado no dia 17 de janeiro. Não chegaram a exercer os seus cargos, e ontem [sexta-feira passada] anunciaram que também não farão parte do novo Gabinete, totalmente expurgado dos ministros que militaram no Reagrupamento Constitucional Democrático (RCD), o partido do fugido ditador Zine El Abidine Ben Ali.
A reportagem é de Juan Miguel Muñoz e está publicada no jornal espanhol El País, 28-01-2011. A tradução é do Cepat.
Apesar da sua renúncia em participar do Governo, a UGTT apoiou o primeiro-ministro, Mohamed Ghanuchi, único ex-membro do RCD que permanece no seu cargo. A central, que aposta na estabilidade política, arrisca-se nesta aposta porque as palavras de ordem gritadas nas ruas contra Ghanuchi não amainam.
Convém saber o que aconteceu durante a década em que serviu a Ben Ali. São muitos os anos que a UGTT obedeceu submissamente ao regime, por mais que convocasse alguma greve num ou noutro lugar, e muito pouco o que conseguiu em benefício dos trabalhadores ou camponeses, desprezados por altos funcionários e ministros, e humilhados até hoje inclusive por dirigentes da oposição que se dizem progressistas. Na Tunísia, os aposentados não têm pensão, os salários beiram a esmola e um milhão de pessoas academicamente bem formadas partiram para o exílio por falta de perspectivas de trabalho.
A UGTT tentou tirar proveito da revolta contra Ben Ali. Na pequena praça de Mohamed Ali Hammi – fundador da central –, que acolhe a sua sede, começou na manhã de 14 de janeiro a manifestação que acabou por derrubar o presidente. A central conta com meio milhão de sindicalizados, mas nessa praça se reuniram não menos empresários e executivos que assalariados para apoiar a revolução surgida na miserável região agrícola do centro da Tunísia.
Parece pouco provável que grande parte dos tunisianos obedecerão às consignas políticas da UGTT porque sua aposta no contestado Ghanuchi é sumamente arriscada. E também seus chamamentos à calma institucional. “Não é o momento de expulsar os diretores de organismos públicos porque é preciso preservar a estabilidade”, explicava na terça-feira passada a este jornal o secretário-geral adjunto, Abed Briki. Foram palavra que vieram tarde. Porque são muitos os altos funcionários que não apareceram em seus locais de trabalho, com temor da ira de seus subordinados. Na quinta-feira passada, dia de greve geral – não seguida pelo comércio, nem pelo transporte público ou privado –, pessoal do Ministério da Saúde, assessores fiscais, surdos-mudos, professores e entidades de toda espécie exigiam a formação de seus próprios sindicatos. A maioria daqueles que protestam não o faz animada pela UGTT.
Muitos cidadãos acorrem ao estrangeiro para explicar suas lamentáveis condições de trabalho. Safe Mougou é professora de inglês. Mas, seu lugar está ocupado porque ela não pôde pagar ao funcionário corrupto os 4.000 euros exigidos. “O sindicato sempre esteve muito vinculado ao poder. Seu secretário-geral, Abdelsalam Jerad, nunca pôde adotar decisões durante o regime de Ben Ali. Jerad também deveria passar pela comissão que investigará a corrupção”, sentenciou Mougou.
Diante do panorama de anarquia institucional, cada qual se arranja como pode. Durante os caóticos dias que se seguiram à fuga de Ben Ali, os vizinhos organizaram a defesa de seus bairros dos ataques de gente leal ao regime e da polícia – a Anistia Internacional denunciou que os agentes dispararam para matar manifestantes que fugiam – e agora em vários povoados e cidades das regiões de Susa e Siliana, uma vez fugidas as autoridades, a população se organiza para escolher novos órgãos administrativos. Declaram sua peremptória recusa ao primeiro-ministro, sem prestar atenção a um desacreditado sindicato.
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O sindicato único tunisiano se converte em eixo da mudança política - Instituto Humanitas Unisinos - IHU