03 Fevereiro 2025
"Chuvas e enchentes, não é novidade, sempre acontecem em São Paulo, cidade global, e há muito tempo. Todavia, nos últimos 20 anos, o volume das chuvas tem aumentado e o tempo que a chuva cai tem diminuído, segundo estudo do nosso maior e mais respeitado cientista, Carlos Nobre", escrevem Gilberto Natalini e Marcus Eduardo de Oliveira.
Gilberto Natalini é médico-cirurgião, vereador por cinco mandatos na Câmara Municipal de São Paulo. Foi secretário municipal do Verde e do Meio Ambiente (2017) e candidato a governador do Estado de São Paulo pelo Partido Verde (PV) em 2014.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e ativista ambiental, mestre em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo – USP. Autor de Civilização em desajuste com os limites planetários (CRV, 2018) e A civilização em risco (Jaguatirica, 2024), entre outros.
Em apenas duas horas, choveu na maior metrópole da América Latina, maior PIB do país, inacreditáveis 125,4mm, o equivalente à metade do volume previsto para todo o mês de janeiro. Foi, talvez, a chuva mais violenta já registrada num pequeno período de tempo.
Em tempos de discurso ecológico, a cidade se afogou em água, e em lágrimas. Ruas e praças, aqui e ali, se transformaram em rios e lagos. Casas, prédios e comércio foram rapidamente invadidos por enxurradas violentas. A mudança climática está presente, não há mais como negar!
Até o Metrô, excelência de nosso transporte coletivo, teve uma de suas estações invadida pela violência das águas. Lamentavelmente, dadas às circunstâncias, um idoso morreu afogado no quintal de sua casa.
Foi assustador!!!
Conquanto, apesar do enorme volume da chuva, as cheias se escoaram num tempo rápido.
Mas os estragos e prejuízos – graves, é certo - ficaram.
Chuvas e enchentes, não é novidade, sempre acontecem em São Paulo, cidade global, e há muito tempo. Todavia, nos últimos 20 anos, o volume das chuvas tem aumentado e o tempo que a chuva cai tem diminuído, segundo estudo do nosso maior e mais respeitado cientista, Carlos Nobre.
Como todos sabemos, Sampa tem vários apelidos: “cidade da garoa”, “cidade que não pode parar”, “terra das oportunidades”, “Paulicéia desvairada”, entre outros.
Mas, convenhamos, o codinome mais condizente com nosso assunto aqui tratado é, certamente, “Selva de Pedra”. Até porque isso indica o destino da cidade; da nossa, e de tantas outras que seguem buscando a modernidade.
Assim, parece evidente: a cidade de São Paulo, com seus 471 anos, foi crescendo e ocupando o Planalto de Piratininga de forma desplanejada, desordenada e agressiva. Foi derrubada a exuberante cobertura verde de Mata Atlântica e Cerrado. Foram ocupadas as encostas dos morros e as várzeas de seus três rios e cerca de 500 córregos, num urbanismo avesso, nervoso e profundamente desigual. Suas duas mil favelas e seus 3,4 milhões de imóveis, como se sabe, nasceram e cresceram em ruas tortuosas e íngremes, tanto em seu centro expandido, como nas imensas periferias.
Mas, que fique claro: a parte mais perigosa nesses tempos desconexos e conflitivos de aquecimento global e desajuste planetário, foi a gigantesca impermeabilização do solo urbano, com asfalto e cimento, que impede a água de drenar para o subsolo, provocando os verdadeiros rios que se formam nas ruas quando as grandes (e fortes) chuvas e tempestades chegam.
De todo modo, os três Planos Diretores aprovados nos últimos 20 anos só fizeram piorar essa situação, até porque, e isso não é segredo, foram permissivos no adensamento com edifícios, sem nenhum cálculo de suporte que proteja a sustentabilidade dos bairros.
Agora, frente a essa triste e preocupante realidade, a Prefeitura de São Paulo tem tomado várias medidas no sentido de enfrentar os efeitos extremos das mudanças climáticas sobre a Cidade.
Em 2009, por exemplo, foi aprovada a Lei Municipal das Mudanças Climáticas, pioneira no Brasil. O número de Parques Públicos Municipais que eram 36 em 2004, hoje são 118, e estão sendo inaugurados outros. Já as matas remanescentes que foram atacadas pelo crime organizado nas áreas de mananciais, com a derrubada de 1.500.000 árvores no período de 2014 a 2020, terão cerca de 150 milhões de m² desapropriados pela Prefeitura, e serão transformados em parques públicos municipais, ficando assim protegidos.
A manutenção das galerias pluviais e a limpeza de córregos vêm sendo feitas em bom número, o que tem garantido o escoamento rápido das águas das chuvas. Mas o problema da impermeabilização de ruas, calçadas e áreas construídas permanece e até piora. Portanto, quando o céu desaba em chuva sobre Sampa, vemos as águas ocupando o espaço urbano e destruindo as “coisas belas”, como canta Caetano.
Tal e qual, diante do nervosismo do clima, desimpermeabilizar é urgente e preciso! E por razões particulares, enfrentar as mudanças climáticas e as outras agressões à Natureza (mãe da Humanidade) é, sim, a nossa mais fundamental tarefa para se pensar no que todos desejam: um futuro ecológico sustentável, um planeta seguro e habitável.