06 Outubro 2023
Combinado com altos índices de mortalidade e migração, declínio na taxa de natalidade ucraniana poderia reduzir a população do país em até 11 milhões, em dez anos.
A reportagem é de Anastasia Shepeleva, publicada por Deutsche Welle (DW) Brasil, 05-10-2023.
No primeiro semestre de 2023, nasceram na Ucrânia cerca de 93,5 mil crianças – 28% a menos do que no mesmo período antes da guerra, em 2021. A tendência de queda na taxa de natalidade, porém, não é de agora, e já vem sendo observada há uma década. O impacto da migração da população feminina para o exterior e os riscos de segurança associados à guerra de agressão russa, portanto, são imensos.
Segundo a diretora do Instituto Ucraniano de Demografia e Pesquisa Social, Ella Libanova, combinado com a mortalidade excessiva e a migração, o declínio da taxa de natalidade, poderia, no pior dos casos, reduzir a população da Ucrânia, do nível atual de cerca de 37 milhões, para 26 milhões em dez anos.
Mesmo antes da guerra, a taxa de natalidade na Ucrânia não era capaz de assegurar um desenvolvimento populacional estável – que supõe o nascimento de pelo menos 210 crianças para cada 100 mulheres. Em 2021, esse número foi de 116, caindo 25% no ano seguinte.
Tal queda, no entanto, não se deve à guerra, e sim às consequências da pandemia de covid-19, avalia a pesquisadora associada do Instituto de Demografia e Pesquisa Social, Svitlana Aksyonova. Em entrevista à DW, ela apontou para as 86 mil mortes entre os casos confirmados de coronavírus na Ucrânia, somente em 2021: "Naquela época, muitas famílias decidiram adiar seus planos de filhos até que surgisse uma situação epidemiológica mais segura."
Ao comentar o declínio acentuado dos nascimentos, Aksyonova chama a atenção para o fato de que as estatísticas de 2022 não incluem os filhos de refugiadas ucranianas no exterior. "Até onde sabemos, elas não estão incluídas nessas estatísticas, assim como nem todos os nascimentos nos territórios ocupados pela Rússia", explica. A DW inquiriu o Ministério da Justiça da Ucrânia sobre quantas crianças ucranianas nasceram no exterior em 2022, após o início da guerra, mas até o momento não obteve resposta.
De acordo com Aksyonova, o impacto da guerra sobre a taxa de natalidade na Ucrânia se tornou muito mais pronunciado em 2023. No primeiro semestre, por exemplo, os demógrafos registraram um declínio de 9% em comparação com o mesmo período de 2022. Para a especialista, nenhuma surpresa, tendo em vista a situação de guerra e os perigos constantes associados a ela.
A demógrafa evita traçar previsões sobre a taxa de natalidade de uma Ucrânia pós-guerra. Segundo ela, trabalha-se com cerca de 50 cenários diferentes para o futuro, a depender dos próximos desdobramentos e do comportamento migratório da população. Mas ela adianta que as chances de um aumento significativo de nascimentos após o fim da guerra são poucas: "Teremos um aumento compensatório graças ao atual adiamento dos nascimentos, mas ele será pequeno."
Para fundamentar tal prognóstico, Aksyonova cita as consequências da guerra, como a destruição da infraestrutura e das moradias, bem como problemas no mercado de trabalho. Além disso, uma redução da taxa de natalidade é algo esperado diante do trauma da guerra: "As pessoas cada vez mais consideram errado dar à luz uma criança neste mundo cruel, e expô-la a tais perigos."
Ao mesmo tempo, a migração desempenha um papel fundamental na previsão de tendências futuras da taxa de natalidade. Desde o início da agressão russa, mais de 6,2 milhões deixaram a Ucrânia, a maioria mulheres em idade ativa e crianças
"Quanto mais a guerra durar, maior será a proporção dos que preferem ficar no exterior. Um dos cenários pressupõe que, no futuro, haverá mais homens do que mulheres em determinadas faixas etárias, pois uma proporção significativa de mulheres ucranianas não retornará à Ucrânia", relata Aksyonova.
Mas ainda há outros fatores que influenciam a taxa de natalidade futura. "Pesquisas sociológicas apontam que, antes da guerra, a maioria dos habitantes queria mais de um filho", e a concretização disso vai depender da situação econômica e de segurança, das condições de vida, a crença no futuro e a confiança no governo.
Para Dmitro Boyarchuk, do Centro de Investigação Socioeconômica CASE Ucrânia, o governo deve tomar uma atitude diante do declínio populacional atual e implementar reformas econômicas adequadas.
Ele alerta sobretudo para os problemas que o declínio da população em idade ativa pode trazer para o sistema de aposentadorias, pois "os refugiados ucranianos descobriram que seu trabalho [no exterior] pode ser muito mais bem remunerado do que na Ucrânia".
Ainda há chances de persuadi-los a regressarem, "mas se não oferecermos um trabalho interessante e competitivo, não conseguiremos manter os habitantes no país", prevê Boyarchuk.
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Guerra agrava declínio populacional na Ucrânia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU