01 Dezembro 2022
"Muitas pessoas e grupos escutaram com esperança, às vezes não sem desconfiança devido às experiências vividas, o convite ao Sínodo e, superando a desconfiança, dirigiram sua palavra à Secretaria Geral do Sínodo. Entre esses grupos estão nossos irmãos e irmãs que vivem de maneira diferente a dimensão afetivo-sexual, que são cristãos e desejam viver sua fé dentro da Igreja. Sabemos que muitas vezes sofreram rejeição e marginalização dentro dos grupos que chamamos de cristãos ou, em outras instâncias, eclesiais. Por causa dessa atitude e de outras semelhantes, não teremos uma Igreja sinodal se não estiver unida ao perdão e à reconciliação", escreve Maria Luisa Berzosa, religiosa das Irmãs Filhas de Jesus, é membro da Comissão do Sínodo dos Bispos para a espiritualidade e consultora do dicastério para a educação católica, em artigo publicado por Settimana News, 30-11-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Os cristãos LGBTQIA+, suas famílias e os agentes pastorais que os acompanham, estão acostumados a habitar a "fronteira" e talvez por isso se sintam fortemente desafiados por um processo sinodal em que se fala de "uma Igreja 'em saída', uma Igreja missionária 'de portas abertas'" (DP 15). Testemunham isso os documentos reunidos em Dalle frontiere al Sinodo. Alcuni percorsi fatti con i cristiani LGBTQIA+ all’interno del cammino sinodale in Italia (Das Fronteiras ao Sínodo. Alguns caminhos percorridos com os cristãos LGBTQIA+ dentro do caminho sinodal na Itália, em tradução livre) volume organizado pelo jesuíta pe. Pino Piva e por Gianni Geraci e editado pela associação La Tenda di Gionata, que reúne uma parte dos tantos escritos que, nos últimos doze meses, foram oferecidos à reflexão sinodal pela galáxia dos cristãos LGBTQIA+. Vamos apresentar o seu prefácio.
Estamos vivendo na Igreja um momento histórico muito significativo do presente e sobretudo projetado para o futuro. Estamos celebrando o Sínodo da sinodalidade, ou seja, um novo modo de viver o nosso ser Igreja, sob três dimensões indicadas no próprio título: "Comunhão, Participação, Missão".
É um Sínodo diferente dos outros. Fica sempre o rico significado dessa palavra: caminhar juntos. Mas o chamamento mudou: é um convite universal, ninguém está excluído de expressar a sua palavra, o seu desejo, o seu pedido, para melhorar a nossa forma de ser e de viver a Igreja.
Não se trata de um evento pontual, mas de um processo, que iniciou em outubro de 2021 e se estenderá até outubro de 2023. Um itinerário com suas etapas e em atitude orante. Processo espiritual, num discernimento que implica necessariamente a escuta recíproca e, junto, do Espírito Santo.
Parte-se da base para dar origem, com essas contribuições em nível diocesano, ao documento preparatório para a próxima etapa, que é a continental, ou seja, das conferências episcopais de toda a Igreja. Há um aspecto muito importante nesse convite universal. Pessoas que estão à margem da Igreja porque não as acolhemos ou tivemos uma atitude excludente e as obrigamos a sair.
E o Documento preparatório nos lembra que "a sinodalidade é viver um processo eclesial participativo e inclusivo, que ofereça a todos - especialmente àqueles que por diversos motivos se encontram em situações marginais - a oportunidade de se expressar e de serem ouvidos para contribuir na construção do Povo de Deus (DP2).
Neste momento, muitas pessoas e grupos escutaram com esperança, às vezes não sem desconfiança devido às experiências vividas, esse convite e, superando a desconfiança, dirigiram sua palavra à Secretaria Geral do Sínodo, que é destinatária de tudo o que queremos fazer chegar ao Sínodo.
Entre esses grupos estão nossos irmãos e irmãs que vivem de maneira diferente a dimensão afetivo-sexual, que são cristãos e desejam viver sua fé dentro da Igreja. Sabemos que muitas vezes sofreram rejeição e marginalização dentro dos grupos que chamamos de cristãos ou, em outras instâncias, eclesiais.
Por causa dessa atitude e de outras semelhantes, não teremos uma Igreja sinodal se não estiver unida ao perdão e à reconciliação. Precisamos reconhecer nosso pecado, pedir perdão e nos empenhar a mudar nossa atitude. Assim criaremos uma Igreja mais credível, mais parecida com o sonho de Jesus, mais reconciliada entre todos os que dela fazem parte.
Permitam-me retomar o título que orienta o trabalho que os grupos italianos realizaram e que está contido no livro que tenho a honra de apresentar: posso dizer com pleno conhecimento de causa que foi um trabalho muito profundo que nasce do desejo de permanecer na Igreja, seguindo os passos de Jesus, encarnando na própria vida os valores do Evangelho. Uma obra participada por muitas pessoas, sinodal em sua substância e em sua forma.
Deve ser apreciado e reconhecido em honra da verdade que a própria Igreja, com esse Sínodo, está demonstrando um vivo interesse em colocar-se em caminho ao lado de todas as pessoas que se encontram à margem, compreendendo-as e acolhendo-as, e isso é um grande passo que é muito estimulante e dá grande esperança de encontrar portas e corações abertos e acolhedores no estilo de Jesus
Isso nos permite também dar visibilidade a cada pessoa e grupo com seu nome e sobrenome, com seu rosto e sua realidade concreta. O Papa Francisco não para de receber e acolher essas pessoas e grupos. Somos também muitas pessoas envolvidas na pastoral da diversidade sexual em muitos países.
Pessoalmente, vivo tudo isso com grande esperança, mas não posso ignorar que ainda temos um longo caminho a percorrer. Sou mulher, educadora, consagrada em uma congregação religiosa – as Irmãs Filhas de Jesus -, dedico-me ao acompanhamento espiritual pessoal e por isso tenho a meu favor muitas horas de escuta de pessoas e de experiências muito diversas; às vezes as experiências relatam experiências de muita dor, e toca profundamente meu coração feminino saber que em muitos ambientes de nossos países, em outras partes do mundo, há penas severas, até mesmo de morte, para uma orientação sexual diferente.
Há sacerdotes, religiosos e principalmente religiosas que não podem falar abertamente sobre sua orientação sexual.
Como ajudar uns aos outros, como abrir o coração e a mente para a acolhida de cada pessoa, esse é o cerne, o resto são detalhes. Jesus sempre se empenhou em favor da pessoa que está para além da lei. Escuta, acolhimento, integração, perdão, reconciliação… não são palavras, são atitudes humanas e cristãs.
Do meu lugar na Igreja, colaborando nas comissões que preparam o atual Sínodo, vivo com esperança confiante um novo tempo em que a exclusão das pessoas seja “transformada” em inclusão e acolhida incondicional. Sonho com outra forma de viver a Igreja, de fazer parte dela, com empenho ativo.
Não quero ser uma espectadora e apenas sentar e observar o que acontece e como deveria ser melhorado. Meu espírito se comove ao ver o sofrimento de tantos irmãos e irmãs. Desejo continuar a acompanhar cada um na sua realidade.
Obrigado por esta oportunidade de apresentar as páginas a seguir. Refletir mais uma vez sobre a nossa Igreja – a Igreja que amo e na qual quero permanecer – me dá a oportunidade de ser grata por fazer parte dela e, portanto, de sofrer e alegrar-me com suas dores e alegrias.
Confiante de que o Espírito Santo é quem guia este Povo de Deus que caminha entre luzes e sombras, agradeço a quantos assinaram esses textos pela raiz da sua fé e pelo desejo de uma Igreja mais coerente com o Evangelho. Continuamos a ir em frente sinodalmente. Sustentamo-nos uns aos outros apoiados no Senhor Jesus que continua a convidar-nos e a chamar-nos pelo nome, com a promessa de caminhar ao nosso lado.
Muito obrigado por essas páginas tão estimulantes!
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Sínodo: os caminhos percorridos pelos cristãos LGBTQIA+ - Instituto Humanitas Unisinos - IHU