26 Outubro 2022
O Papa Francisco anunciou em 16 de outubro que o Sínodo sobre a Sinodalidade será celebrado em duas sessões: a primeira em 2023 e a segunda em 2024. Trata-se não apenas de uma assembleia, mas também de um estilo eclesial que constitui o legado de seu pontificado.
O comentário é de Maria Elisabetta Gandolfi, jornalista vaticanista, publicado por Il Regno, 25-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Nunca se distrai durante o Angelus dominical do papa Francisco. Naquele de 16 de outubro, de fato, aparecem inovações significativas para o caminho do Sínodo da Igreja universal.
O Papa disse depois da oração mariana (grifo meu): "No dia 10 de outubro do ano passado foi aberta a primeira fase da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos (...) Desde então está se realizando nas Igrejas particulares a primeira fase do Sínodo, com a escuta e o discernimento. Os frutos do processo sinodal iniciado são muitos, mas para atingir o pleno amadurecimento é necessário não ter pressa. Portanto, para dispor de um tempo de discernimento mais prolongado, estabeleci que esta Assembleia sinodal se realizará em duas sessões. A primeira de 4 a 29 de outubro de 2023 e a segunda em outubro de 2024. Confio que essa decisão possa favorecer a compreensão da sinodalidade como dimensão constitutiva da Igreja e ajudar todos a vivê-la em um caminho de irmãos e irmãs que dão testemunho da alegria do Evangelho".
É possível ler pelo menos duas mensagens naquele anúncio, além daquela literal da divisão em duas sessões.
A primeira é que Francisco reitera que não se trata de uma mera celebração de uma assembleia, cujo conteúdo, a sinodalidade na Igreja, quer ser também sua forma, a sinodalidade como estilo da Igreja, reiterando a passagem entre momento central celebrado em Roma e periférico celebrado nas Igrejas locais.
A segunda é que, caso exista alguém tentando boicotar todo o processo, talvez tentando ganhar tempo, ignorando os pedidos feitos por Roma ou levando-os de ânimo leve, Francisco quer que a sinodalidade seja o legado de seu pontificado. Até o risco de não ser ele a ver o fim do Sínodo em andamento. Afinal, isso não aconteceu também com o Concílio, do qual, aliás, nestes dias recordamos os 60 anos de abertura?
Vamos dar um passo atrás. Como escreve a teóloga estadunidense Phyllis Zagano, "o Sínodo é proposto como uma forma ao mesmo tempo velha e nova de ser ‘Igreja’, uma recuperação permanente de como a Igreja nasceu e cresceu. Francisco projeta isso como uma mudança que durará mais do que seu pontificado. No entanto, muitos católicos ainda não têm ideia do que significa ‘sinodalidade’. Apesar do que dizem os críticos, não é um evento parlamentar que coloca em votação questões doutrinárias de fé e moral. Enraizada nos ensinamentos e no processo do Concílio Vaticano II, a sinodalidade é entendida como um ‘caminhar juntos’ , pelo consenso, rumo à renovação iniciada com o Vaticano II”.
Sabemos que há quem discorde. E que espera que, "ignorando todo o processo", possa retornar ao passado glorioso sobre o qual muitas vezes fantasia.
Além disso, apesar do extenso trabalho de escuta realizado até agora, também sabemos que há dioceses que não levantaram um dedo. E mesmo dentro das dioceses que trabalharam, nem todas as paróquias ou comunidades eclesiais contribuíram da mesma forma. Talvez não sejam realmente "contra",, mas nem mesmo "a favor".
Os expoentes mais combativos da ala antissinodal se assustaram, além disso, que da escuta da estrutura eclesial (leia-se laical) tenham surgido questões como o papel da mulher, a opção pelo sacerdócio casado, o status dos divorciados recasados e a questão da homossexualidade. Um filme já visto na época dos dois Sínodos sobre a família.
Eles tentaram se atravessar, acertando conscientemente o Caminho Sinodal alemão que, com todos os limites que lhe podem ser atribuídos, fornecia a melhor base para a reflexão teológica de todos os outros contextos. Por outro lado, como amplamente reiterado, são temas que surgiram em grande parte dos resumos nacionais (basta olhar os textos que estamos traduzindo e publicando em Regno-documenti, por exemplo).
Enquanto isso, com muito menos alarde, o mundo latino-americano deu dois passos à frente em relação à Europa e à América do Norte, que o superam em termos de poder dos meios de comunicação (e que, de fato, quase os ignoraram): em primeiro lugar, mesmo em meio à Covid, celebrou uma assembleia eclesial continental (novembro de 2021), ou seja, com a participação de bispos, clérigos, religiosos e religiosas, leigos e leigas. E depois viu o papa aprovar o estatuto da CEAMA, a Conferência Eclesial da Amazônia da qual estatutariamente fazem parte pela primeira vez, além de bispos, leigos e leigas, religiosos e religiosas.
Depois, há cardeais que continuam a conceder entrevistas contra o Caminho Sinodal alemão, contra aquele da Igreja universal, com sutis ataques pessoais àqueles que estão trabalhando na Cidade Eterna que nem sequer merecem um link, de tal forma superam a medida do "discernimento" ou da chamada parrésìa.
No entanto, foram tolerados, assim como foram tolerados na época do Sínodo sobre a Família, que também foi desdobrado, precisamente, para permitir um maior tempo para a discussão.
Naquela época o resultado não foi decisivo, porém, se o avaliarmos em termos das aquisições da exortação pós-sinodal Amoris laetitia. No entanto, evitou-se uma cisão, embora esse texto ainda seja uma pedra de tropeço para alguns setores da Igreja.
Hoje, com Francisco que completará 86 anos no dia 17 de dezembro (mas o tempo passa também para os detratores), criar duas sessões do Sínodo sobre a Sinodalidade significa entregar à Igreja que virá um processo que não está concluído e, no entanto, tão encaminhado que, exceto possíveis contratempos, não poderá ser cancelado.
É claro que é preciso que também os "cristãos comuns" se lembrem disso...
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À Igreja que virá - Instituto Humanitas Unisinos - IHU