11 Abril 2022
“Um chefe de Estado racional não usaria hoje armas nucleares. Mas…". Existe um grande "mas" na explicação que Tatsujiro Suzuki propõe sobre a situação atual. O vice-diretor da Atomic Heritage Foundation de Nagasaki, por um lado, está empenhado em preservar a memória das bombas de 1945, e pelo outro, como professor do Centro de Pesquisa para Abolição de Armas Nucleares, trabalha para se aproximar do desarmamento hoje. Em Roma, acaba de trazer seu depoimento à XXII Conferência Amaldi sobre o risco nuclear e o controle dos armamentos, organizada na Accademia dei Lincei.
A entrevista é de Elena Dusi, publicada por La Repubblica, 09-04-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Quais são os riscos hoje?
Não há negociações sobre o desarmamento hoje. As partes não conhecem exatamente os arsenais alheios e não têm meios para interpretar as intenções dos adversários. Cometer um erro na avaliação das jogadas do rival nesse cenário é fácil.
Que tipo de erro poderia nos levar a um ataque nuclear?
Vamos começar com uma premissa. Usar bombas nucleares hoje não é fácil para ninguém, nem mesmo para o presidente russo Putin. A Ucrânia também não pode ser considerada uma boa razão para fazê-lo. É mais fácil que sejam usadas armas químicas ou biológicas.
Estamos sempre falando de um interlocutor racional?
A estratégia russa, enunciada em 2020, prevê o uso de uma arma atômica em caso de ameaça existencial. Em que consiste essa ameaça, na verdade, cabe a Putin definir. E o chefe do Kremlin afirmou que a Ucrânia está desenvolvendo um programa de armas químicas e nucleares. Isso é falso, mas o fato de ele acreditar, poderia lhe dar uma razão para lançar uma escalada.
O que a OTAN faria se a bomba atômica fosse usada? Talvez uma arma tática, de pequenas dimensões?
A OTAN não tem obrigação de responder a um ataque nuclear contra a Ucrânia e provavelmente desistirá de contra-atacar. Meu medo é bem outro. Em um clima tão tenso, cada erro e mal-entendido pode levar a uma guerra nuclear. No ano passado, projetamos 25 casos de guerra atômica no nordeste da Ásia. Cerca de metade deles previa um ataque que não era intencional, mas resultava de uma interpretação equivocada dos sinais do adversário.
O que pode acontecer por exemplo?
Existem mísseis que podem ser usados tanto com bombas convencionais quanto com ogivas nucleares. Alguns, como os de médio alcance, foram banidos da Europa graças às negociações dos EUA e da URSS na década de 1980, mas agora o tratado não está mais em vigor. Além disso, temos mísseis hipersônicos, que da Rússia podem chegar aos Estados Unidos em cerca de dez minutos sem serem interceptados e podem igualmente carregar os dois tipos de ogivas. Preparar um, ou simplesmente movimentá-lo, poderia fazer o adversário acreditar que se quer realizar um ataque nuclear.
Você trabalha em Nagasaki. Parece que a memória das duas bombas de 1945 deixou de gerar medo?
Os Hibakusha, os sobreviventes das bombas atômicas, hoje têm uma idade média de 82 anos. Suas vozes estão se enfraquecendo e é nosso dever garantir que as novas gerações não esqueçam o que aconteceu. A crise atual está nos lembrando que o risco nuclear não desapareceu.
Onde estão as ogivas nucleares na Europa?
Na Itália, Alemanha, Holanda e Turquia. Mas não são mísseis, são dispositivos que precisam de transporte aéreo, que é mais lento e não passa despercebido. Por isso são considerados menos arriscados.
Quão completo é o conhecimento dos Estados Unidos e da Rússia sobre as armas nucleares um do outro?
No passado era muito bom. Quando havia negociações em andamento, era fácil para um país saber que armas seus rivais tinham e quais eram seus programas. Não temos nenhuma negociação hoje. Contamos com satélites e inteligência, mas quando ninguém mais se fala é mais fácil cometer erros. Cada simples movimento de material pode ser interpretado como um sinal perigoso.
Sempre falamos de Estados Unidos e Rússia. Mas o que está acontecendo na China?
A China está ampliando seu arsenal atômico. Atualmente, estima-se que tenha 350 ogivas. Fontes do Pentágono dizem que atingirá mil nos próximos 10 a 20 anos. A Rússia e os Estados Unidos têm atualmente 6-7 mil cada. O risco de uma guerra atômica na Ásia é atualmente baixo, mas a península coreana e o Estreito de Taiwan são áreas sensíveis onde a situação pode se inflamar rapidamente. No entanto, a China é o único país que declarou expressamente que não usará uma bomba atômica primeiro.
Pequim não está envolvida em nenhuma negociação?
Não, nenhuma. O Japão pede com insistência que sejam iniciadas negociações nas quais nosso país e a Coreia do Sul também possam participar. Gostaríamos que pelo menos um telefone vermelho fosse instalado para evitar acidentes.
Você poderia nos contar um dos cenários que projetaram em seu trabalho no ano passado?
A Coreia do Norte se torna cada mais pobre e antes de se ver à beira do abismo, lança um ataque nuclear para ganhar atenção internacional. Seus alvos podem incluir a Coreia do Sul, as bases militares do Japão ou até a ilha de Guam.
O Japão acabará abandonando sua política de três "nãos" à energia nuclear: não produzir, não possuir e não hospedar armas nucleares?
Acho que não, mesmo que haja uma ala conservadora que gostaria de ter essas armas em nosso território. Afirma que se a Ucrânia estivesse equipada com armas nucleares, não teria sofrido nenhum ataque. Acredita que ter uma bomba em casa significa dissuasão, mas na verdade se traduz em maior risco. Mas é uma posição que visa apenas quebrar um tabu, porque de qualquer forma o Japão está sob o guarda-chuva estadunidense, nem os EUA concordariam em trazer suas ogivas para o Japão.
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Da Ucrânia para a China. Porque hoje existe o risco de uma guerra nuclear - Instituto Humanitas Unisinos - IHU